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OGMA: Empresa com lucros não pode despedir!


No próximo dia 23 de Maio, o Ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral vai visitar as OGMA, em Alverca, para comemorar a entrega da 1500º fuselagem do avião Pilatus PC-12 aí construída.

O avião da marca suíça é montado nas oficinas, desde cerca de 1994. Na secção das montagens está tudo a postos para uma grande festa. Nesta que é a empresa das aparências, já estão encomendadas as fardas limpas, especialmente para a ocasião, e o chão encerado. Mas esta festa é anunciada na mesma semana em que os trabalhadores foram informados de que irá haver despedimentos nesta secção, pois na verdade, a Pilatus irá reduzir a encomenda de aviões às OGMA, para o ano de 2018. Consequentemente, irá haver “ajustamentos”, “mudanças” e outros eufemismos empregues pelas chefias da secção. Segundo estas, quem ficou efetivo, nos últimos meses, teve muita sorte, pois não vai entrar mais ninguém nos próximos tempos nas Montagens de Aeroestruturas, onde trabalham cerca de 700 trabalhadores. Ou seja, quem está a contrato vai ser despedido. Apesar disso, convocam todos os trabalhadores para estarem presentes nesta grande festa, entrando mais cedo se preciso. É preciso ter lata!

Ao que parece, a produção em Portugal vai diminuir de cerca de 60 para cerca de 50 aviões, este ano, aproximadamente, e vai aumentar proporcionalmente numa unidade de produção do mesmo avião na Índia. Será o resultado da negociação entre a Pilatus e o governo indiano, em que o aumento de produção na Índia será a contrapartida pela compra de vários aviões militares PC-21 à marca Suíça. Mas isso não é suficiente para explicar esta mudança.

Há algum tempo que a maior parte da produção do PC-12 é assegurada pelas OGMA, e apenas uma minoria na Índia e durante um período na Polónia. A razão era, claro, a longevidade da parceria com as OGMA, a sua capacidade de resposta a aumentos súbitos de produção e, acima de tudo, a qualidade do produto feito em Alverca, incomparável aos demais produtores. Qual destes factores mudou? Infelizmente, a qualidade.

As OGMA de 1994 não é a mesma de 2018. Se nos anos 1990 um Mecânico de Estruturas Aeronáuticas frequentava um curso de formação de quase 1 ano, esse tempo foi sendo gradualmente reduzido até hoje ser ZERO. Muitas pessoas entraram e meteram-lhes de imediato a ferramenta na mão. Aprende-se a nadar, dento de água. “On The Job Training”, chamam-lhe. É um modelo de gestão assente na precariedade e rotatividade constantes.

Muitas equipas na secção têm mais de metade dos operadores contratados a prazo, e mesmo os que são efectivos, estão há pouco mais de 3 anos. Muita da formação administrada pelo IEFP (ou seja, paga por todos nós através da Segurança Social) é manifestamente insuficiente e não se substitui a um período de aprendizagem que antes era feito na própria empresa. As OGMA não investe praticamente nada na formação. O foco tem sido nos resultados mensais, dos quais dependem os prémios de produção, e não a qualidade, com muitos sistemas de controlo de tempos e metas de hora a hora, mas muito pouco incentivo à produção com qualidade, e no tempo adequado a uma indústria com estas particularidades. Houve uma fuga de trabalhadores qualificados. Não há qualquer plano de progressão na carreira. A tabela salarial está estagnada desde 2012. E, ao longo dos anos, a gestão das OGMA fez questão de deixar claro que “ninguém é insubstituível”, e encorajou inúmeros operadores experientes a sair, porque ganhavam muito. Chegou a mandar muitos para casa com vencimento, até aceitarem a demissão. Que objectivo tinham se não substituir a mão-de-obra qualificada por trabalhadores precários, quase todas, a ganhar 600€/mês? Em 2018, a diferença de qualidade entre a fábrica na Índia que produz há muito menos tempo, e as OGMA, pelos vistos já não compensa assim tanto. A responsabilidade é inteiramente da gestão da empresa e dos sucessivos governos que têm privatizado mais este sector estratégico.

Mas a produção vai reduzir quanto exatamente? E quantas pessoas vão demitir? As OGMA tem o hábito de despedir mais do que na verdade a diminuição de trabalho. Por acaso hoje, trabalha-se folgadamente nas áreas de fabricação nas OGMA? Ou trabalha-se a um ritmo incompatível com a natureza do produto? Nos 24 anos da sua produção já houve anos em que se produziram 120 aviões, e no ano seguinte se produziram 40. Qual a expectativa para o ano seguinte? Mas se a produção do PC-12 diminui, outros programas como o Helicóptero EH-101 aumentam. E mesmo na produção do PC-12 continuam a fazer-se muitas horas extraordinárias. As OGMA não é só aeroestruturas. Existem mais de 1.700 trabalhadores efectivos e centenas de contratados a prazo e sub-contratados. Há constantemente gente a entrar para outras secções. Estes despedimentos não são uma inevitabilidade e é preciso lutar contra eles. Foi o próprio CEO das OGMA, Marco Pelegrini, que em entrevistas recentes disse que as OGMA recusam contratos por terem falta de pessoal qualificado. Parece é que as OGMA querem esse pessoal qualificado e certificado em Manutenção Aeronática, apenas se a formação for paga pelos próprios trabalhadores, ou pelos nossos impostos através do Estado. Não se pode gerir uma empresa assente na precariedade, rotatividade e mão-de-obra barata, e ao mesmo falar em falta de qualificação.

Antes de despedirem quem, há quase 3 anos, gerou a riqueza nesta empresa, é preciso responder a uma série de perguntas. Perguntas que devem ser dirigidas à administração da empresa mas também ao Ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral, pois o Estado português mantém uma participação nas OGMA:

– Qual é o plano para as OGMA?

– Em 2016 houve um lucro de 10 Milhões de euros. Em 2015, 11 Milhões. A empresa é viável. Porque planeiam despedir trabalhadores?

– Afinal, quanto lucrou as OGMA com o programa Pilatus, no último ano?

– Que parte dos lucros foi distribuída aos accionistas? E quanto recebem, de factoos trabalhadores das OGMA?

Sabemos que houve dinheiro para renovar a frota de BMW’s, topo de gama, da administração e altas patentes, que circulam todos os dias alguns metros entre as secções e o refeitório – compreende-se já tinham 2 ou 3 anos! Houve dinheiro para propaganda em outdoors, a comemorar os 100 anos da empresa. Houve dinheiro para pagar jantares às lideranças das secções entre outros. Houve dinheiro para muita coisa, mas agora não há para manter postios de trabalho tão necessários?

A Geringonça, que se diz de esquerda, tem de clarificar estas questões pois são centenas de postos de trabalho que estão em causa. Neste momento, os trabalhadores das OGMA devem unir-se e lutar, e não esperar que sejam dos poucos que conseguem ficar. Com a venda da Embraer (empresa brasileira accionista detentora de 65% do capital das OGMA) à Norte-Americana Boeing, muita coisa vai mudar. O que temos visto no último ano é um decréscimo de trabalho também em outras secções. Os contratos de manutenção com a Força Aérea Portuguesa, com a TAP são cada vez menores, sendo substituídos por trabalho em aeronaves da Embraer. Nunca ouve tanto turismo em Portugal como hoje. O sector da aviação cresce cada vez mais.

O Governo PS, com o apoio do BE e PCP, têm a obrigação de desenvolver um plano no sentido de potenciar as possibilidades que as OGMA oferece, tanto na produção como na manutenção. Isso pode e deve levar à criação de trabalho qualificado e bem remunerado na fabricação e manutenção aeronáutica em Portugal. Se as OGMA e a TAP fossem 100% públicas, Portugal também poderia, mais facilmente, negociar contrapartidas de garantia de fabricação de aviões nas OGMA com outras construtoras, para serem utilizados pela companhia aérea que cresce cada vez mais, tal como fez o Governo Indiano com a Pilatus. Boa parte da solução para fixar produção, manutenção e defender empregos, passa exatamente pela renacionalização da TAP, ANA e as OGMA, sem a qual assistiremos ao definhar de mais um sector estratégico.

Se o país cresceu, queremos a recuperação de todos os setores estratégicos, nomeadamente, o sector da aviação onde se inserem as OGMA, TAP e ANA. Não aos despedimentos numa empresa com lucros. Abertura imediata dos livros de contas das OGMA. É necessária a transparência das contas.

 

Operário das OGMA

22-05-2018

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