A luta dos profissionais da Educação abala a estabilidade do PS

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A luta unitária de todos os profissionais de educação, promovida pelo S.TO.P, abanou a sociedade portuguesa, adormecida por 7 anos de Governo PS, com e sem o apoio da esquerda tradicional – BE e PCP. 

A actual mobilização de profissionais da Educação é o resultado das políticas dos sucessivos governos PS e PSD/CDS-PP, mas é, sem dúvida, a resposta aos últimos 7 anos de governação PS que tanto prometeu o “virar de página da austeridade”, mas que pouco ou nada foi capaz de concretizar. 

Para António Costa vale tudo menos cumprir com as exigências dos profissionais da Educação

Primeiro, o ilusionismo. António Costa, na sua entrevista à RTP de 30 de Janeiro, de volta ao tom de cordeiro, serve-se das habituais manobras para ludibriar a opinião pública. Afirma que foi o seu governo que descongelou as carreiras dos professores, como se não fosse essa a sua obrigação, e estende o seu mais recente slogan “fixar, aproximar e vincular” que em pouco ou nada cumpre as necessidades dos profissionais da Educação, já para não falar das sucessivas promessas vãs ao longo dos últimos anos.

Ao mesmo tempo, a calúnia. Costa volta a repisar que a actual greve convocada pelo S.TO.P. foi motivada “[…] por mentiras. Começou com a mentira de que passariam a ser os presidentes de câmara a contratar professores. Depois passou a uma segunda mentira que foi dizer-se que os concursos nacionais deixariam de respeitar a lista nacional de graduação e passaria a haver uma lista municipal de graduação”.

Aquilo que António Costa quer dar agora por não-dito estava presente na proposta do Ministério da Educação (ME), na reunião de 8 de Novembro com os sindicatos dos professores: “agrupamento de professores em listas intermunicipais e à sua selecção por conselhos locais de directores”. O ministro da Educação, João Costa, por sua vez, chegou mesmo a garantir que “não há um processo de municipalização em curso”, contrariando aquilo que foi publicado na Resolução 123/2022 do Conselho de Ministros, de 14 de Dezembro de 2022. Afinal, quem mente?

De seguida, a criminalização. Não tendo funcionado a calunia, o Governo Costa, no início de Janeiro de 2023, avançou com um pedido de parecer à PGR sobre a legalidade da greve convocada pelo S.TO.P., sem ser capaz de explicar publicamente as questões que queria ver esclarecidas. Certo é que vieram a público questões sobre o cumprimento dos pré-avisos de greve ou as regras relacionadas com fundos de greve, mas sem que se encontre aqui qualquer ilegalidade.

Por fim, a mordaça. A pedido do Governo Costa, um Colégio Arbitral, no qual 1 dos 3 representantes pertence às centrais sindicais, respondeu, por unanimidade (incluindo, portanto, o representante das centrais sindicais), com a fixação de serviços mínimos exclusivamente para a greve decretada pelo S.TO.P. O Governo Costa exige, assim, aos profissionais que tudo têm sacrificado, o que nunca exigiu a si mesmo: o mínimo. 

Este é um evidente atropelo do direito fundamental à greve, já para não falar na discricionariedade da decisão que abrange apenas o sindicato que não concilia com o PS. Esta decisão só pode ser ilegal. A democracia vai muito mal e toda a esquerda tradicional e centrais sindicais, com evidentes responsabilidades no cartório, assobiam para o lado.

A luta do S.TO.P. abana todos os quadrantes da nossa sociedade

É quando a luta social alcança os seus momentos mais agudos que se vê, com toda a clareza, quem é quem. 

Transformar a luta sindical, através da combatividade, democracia e solidariedade em luta política por uma sociedade justa, é essa a melhor prática do sindicalismo. É normal que muitos não o entendam. Sobretudo, aqueles que procuram manter tudo como até aqui em função dos seus próprios benefícios. Manuel Carvalho, director do PÚBLICO e comentador da RTP, incorpora o espírito das classes dominantes de manter tudo como até então e, se possível, tornar ainda mais difíceis as vidas de quem vive do seu salário. António Costa agradece. Manuel Carvalho não dedica uma linha ao oportunismo da direita e extrema-direita, corresponsáveis pela destruição da Escola Pública, que, agora, procuram capitalizar o descontentamento para se fortalecerem como oposição, mas não vê problema algum em tentar desmoralizar os profissionais que, mais uma vez, se sacrificam em defesa da nossa Educação. Montenegro, Ventura e Rocha agradecem. É sempre fácil cuspir em cima daqueles que, pouco tendo e/ou muito perdendo, se vêm forçados a lutar para não ficar pior.

Sem poder atacar as causas do combate dos profissionais da Educação, por serem evidentemente justas, Manuel Carvalho, qual António Costa, prescreve que os profissionais da Educação deveriam manter a sua luta dentro dos estritos limites de não poderem conquistar nada: tratados como profissionais self-service, não devem decidir as formas de luta que melhor lhes convier; sujeitos a tudo perder como até aqui, devem adoptar greves de “um dia, dois dias ou uma semana”; tratados como meros meios para reduzir custos, o que não podem é fazer-se ouvir. 

É preciso má-fé para ignorar a consciência social e o sacrifício pessoal do nosso corpo de profissionais da Educação e afirmar que “os professores estão numa guerra de poucos custos para os próprios e com danos máximos para a escola pública”. Aquilo que os profissionais de Educação têm sacrificado, ao longo das últimas décadas, não é suficiente para Manuel Carvalho. Para António Costa e para a direita e extrema-direita também não. 

A esquerda tradicional aposta na estabilidade do Governo PS

Conivente com o PS nos últimos anos, a esquerda tradicional – BE e PCP – mantém-se à defensiva. No plano político, as intervenções do PCP têm sido, no mínimo, inesperadas. 

Face à sequência de casos de corrupção, favorecimento e incompatibilidades que têm envolvido um conjunto interminável de membros do governo, várias figuras do PS têm vindo a público – por mais ridículo que pareça – sugerir que o escrutínio público é o equivalente a populismo. António Costa afirma que nem todos os “casos” são “casos”. Augusto Santos Silva exige que os políticos sejam julgados “pelas políticas que realizam” e não pelos casos em que estão envolvidos. Não sabemos o que seria melhor barómetro de avaliação, se as políticas que realizam, se os casos em que estão envolvidos, mas reconhecemos que tal argumentação é o cúmulo do absurdo. Os responsáveis por tamanha decadência do regime em que vivemos, responsáveis pelo crescimento da extrema-direita, vitimizam-se do escrutínio de que são alvo.

E o PCP, por sua vez, parece apostado em reforçar tal argumentação. Paulo Raimundo, secretário-geral do PCP, em entrevista ao PÚBLICO/Renascença , ao mesmo tempo em que admite voltar a integrar um Governo PS no futuro, afirma ser evidente que existe uma gestão política dos casos judiciais. Já João Oliveira, membro da comissão política do PCP, afirma que está em curso uma “operação metódica de tiro ao alvo a determinados membros do Governo de maneira a criar uma situação de degradação da imagem do executivo”. Pobre PS!

A gestão política de casos judiciais sempre existiu, mas essa não é a questão que nos interessa prender atenções. A questão é que a corrupção, o favorecimento e as incompatibilidades existem. E o que é que o PCP tem a dizer sobre o assunto? Em vez de alertar para a relação entre o actual regime e a corrupção sistémica, contribui para o lamaçal, reforçando a narrativa de vitimização do PS. Tudo para manter a maior estabilidade possível de um regime em decomposição, não vá outras eleições delapidar ainda mais a base eleitoral do PCP. É também por isso que Mário Nogueira perdeu a vergonha de afirmar a Fenprof – e correctamente – como “sindicato do sistema”. PCP e CGTP falam a uma só voz, deploravelmente, em defesa do sistema em que vivemos e dos parasitas que nos governam.

E assim, a reboque dos acontecimentos, o PCP e os sindicatos a si afectos dedicam-se a minar as lutas promovidas por aqueles que não se submetem ao seu controlo e que não se dedicam a contemporizar com o PS. 

O conservadorismo do PCP e do seu sindicalismo é avesso ao combate levado a cabo pelo S.TO.P. Ao serem surpreendidos por uma luta democrática, solidária entre classes profissionais e de mobilização combativa, os burocratas sindicais ficam desconcertados. São forçados a mexer-se. Sim, a Fenprof teve de se mexer para não perder o comboio que partiria com ou sem ela. Evidentemente que, para manterem os seus lugares com a maior estabilidade possível, os burocratas sindicais preferem sempre a “moderação e espírito de compromisso” com o Governo. E enquanto se adequam à situação, adoptam a calunia mais mesquinha como arma de arremesso. Não é de hoje que dirigentes sindicais da Fenprof se dedicam a caluniar o S.TO.P. e as suas acções de luta como sendo ilegais ou convocadas pela extrema-direita. Vale tudo!

Aliás, Mário Nogueira, na recente entrevista à TSF, ao ver-se responsabilizado pela decadência a que a Fenprof condenou o sindicalismo da Educação, não tem qualquer problema em sugerir que o S.TO.P. é pouco sério, fazendo eco da falsa ideia de que os assistentes operacionais estão a ser instrumentalizados por professores a fechar as escolas, numa evidente depreciação de todos os profissionais da Educação. 

Estas foram, aliás, precisamente as mesmas ideias veiculadas pelo comentador de serviço Daniel Oliveira, por mais que uma vez, nas últimas semanas. Também este exige que tudo se mantenha como até aqui, aconselhando o PS a manter os “interlocutores previsíveis” que nos trouxeram a uma Escola Pública em ruptura, chegando mesmo a equivaler a direcção e programa do S.TO.P. à direcção e intenções obscuras da bastonária dos enfermeiros, assumida adepta da extrema-direita. 

Daniel Oliveira afirma que “o sindicalismo tem uma tradição e, com ela, uma ética”, no entanto, revela muito pouco conhecimento da melhor tradição e ética sindicais. Bem sabemos que a solidariedade entre diferentes classes profissionais e até entre diferentes nacionalidades não faz parte da tradição e ética do sindicalismo da CGTP. Sob o controlo do sindicalismo tradicional, também não é usual que sejam os trabalhadores a decidir democraticamente os seus meios de luta. Daí que Daniel Oliveira estranhe quando se depara com algum destes fenómenos. 

A acrescer, é incompreensível que Daniel Oliveira que, tantas vezes, afirma que aqueles que combatem o fascismo não devem ser igualados ao fascismo, acabe mesmo a irmaná-los. Como o Daniel Oliveira bem sabe, a direcção do S.TO.P. não tem o mínimo de identificação – nem política, nem programática – com a direcção da Ordem dos Enfermeiros. Afirmá-lo não é teórica, nem politicamente honesto. Utilizar tal argumento para justificar a notória discordância que Daniel Oliveira alimenta para com a luta do S.TO.P., apenas é revelador da sua própria moral.

Os tais “interlocutores previsíveis”, os sindicalistas tradicionais que preferem os compromissos governativos que nos trouxeram à completa destruição das condições de trabalho nas escolas e à decadência do sindicalismo em Portugal, não entendem que o S.TO.P. é precisamente fruto da sua decadência.

É preciso um novo sindicalismo combativo e democrático. O S.TO.P. pode ser a esperança não só dos profissionais da Educação, mas tantos e tantos outros lutadores comprometidos com a defesa dos interesses dos trabalhadores e da juventude. Tomara que assim seja.

O MAS está solidário com a luta de todos os profissionais da Educação. Exigimos:

  • Reconhecimento de todos os anos de congelamento para todos os professores;
  • Contratação de mais profissionais de educação, com salários e carreiras dignas;
  • Aumento dos salários que compense a inflação.
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