GOVERNO FAZ DE TUDO PARA ESCONDER GESTÃO RUINOSA DA TAP

O atual processo de escrutínio à gestão ruinosa da TAP, apesar de ainda estar no início, tem sido um verdadeiro pesadelo para o governo. A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), criada em fevereiro por causa da indignação em torno da indemnização milionária a Alexandra Reis, decidiu alargar a investigação ao pagamento de salários e à atribuição de prémios feitos a toda a administração da empresa, recuando até 2015, data da sua primeira privatização, para apurar responsabilidades das tutelas políticas e da gestão da empresa, que se encontra intervencionada pelo Estado e sob um plano draconiano sobre os seus trabalhadores.

O alvoroço começou quando, em dezembro de 2022, foi noticiado que Alexandra Reis, Secretária de Estado do Tesouro desde o início do mês, tinha recebido uma indemnização de €500 mil da TAP. O ano acabou com a demissão de Alexandra Reis, de Pedro Nuno Santos, e de mais dois secretários de Estado do seu ministério. Alexandra Reis saiu da administração da TAP por “incompatibilidades” com a CEO Christine Ourmières-Widener e, por isso, obteve uma indemnização de meio milhão de euros, isto com o OK do Governo PS pela mão de Pedro Nuno Santos, que, inicialmente, tinha negado qualquer conhecimento sobre o valor da indemnização. Numa tentativa de limpar a cara, o Governo pediu a devolução da indemnização de Alexandra Reis e afastou, de forma legalmente dúbia, a CEO da TAP, mas não deixa de ser evidente a forma como o Estado tem desperdiçado dinheiros públicos.

Mais recentemente, em finais de abril, foi o novo Ministro das Infraestruturas, João Galamba, a protagonizar nova polémica, ao descobrir-se que este convidou a CEO da TAP para uma reunião secreta entre o Governo, o PS e a TAP, onde foram previamente combinadas as perguntas do representante do PS na CPI, Carlos Daniel, e as respostas da CEO, Christine Ourmières-Widener. As mentiras, omissões e contradições multiplicam-se à medida que o PS vai fazendo de tudo um pouco para esconder as suas responsabilidades na gestão ruinosa da TAP, mas a sucessão de escândalos e polémicas envolvendo a interferência de figuras importantes do governo continua a não dar tréguas à estabilidade de António Costa. O inquérito decorre ao mesmo tempo que a Assembleia da República discute o dossier da privatização da empresa, com o PS empenhado em acelerar a sua reprivatização.

PRIVATIZAÇÃO DA TAP NÃO É SOLUÇÃO

A este ponto, já muitos perceberam que a indemnização a Alexandra Reis é apenas a ponta do iceberg. O descalabro na TAP é uma ilustração perfeita sobre como funciona o nosso modelo económico e quais os interesses a que o Estado serve. Começando mesmo na privatização, quando o Governo PSD/CDS permitiu David Neeleman comprar a TAP com dinheiros da própria TAP. 

Quatro dias depois de ter ganho a privatização da TAP, Neelman conseguiu um acordo com a Airbus, garantindo que a TAP iria comprar 52 aviões – e não os 12 previamente contratualizados – à Airbus a preços superiores aos do mercado. Neelman conseguiu assim um adiantamento de mais de 200 milhões de euros, para canalizar para a TAP. É estimado que este negócio tenha prejudicado a TAP em 400 milhões de euros. Segundo Neelman, o Governo de PSD/CDS sabia deste esquema. Este acordo prejudicou a TAP ao fixar um preço para compra dos aviões superior aos valores do mercado.

Já em 2016, com o Governo PS – na altura com apoio parlamentar de BE e PCP – o Estado passa a principal acionista da TAP. O Governo manteve a gestão privada e estabelecia que, na hora da distribuição dos lucros, o Estado não podia ficar com mais de 18,75% do total dos dividendos. Ou seja, mesmo sendo o principal acionista, o Estado mantinha-se sem controlo sobre o rumo estratégico da TAP e com direito a apenas uma pequena fatia dos lucros. Este acordo ruinoso – que muito bem serviu os privados que continuavam a mandar nos destinos da TAP – custou ao Estado €31,9 milhões.

Em 2020, à gestão ruinosa dos privados juntou-se a crise da pandemia, e o Governo não teve outra opção senão ligar a TAP às máquinas, ou seja, a compra do capital total da TAP, que custou ao Estado mais €55 milhões. Na altura, PSD e IL opuseram-se esta compra; o seu projeto era a falência total da TAP e a entrega de mais um setor estratégico do país às multinacionais que contavam com o apoio do Estado e da União Europeia. 

Essa proposta de deixar a TAP asfixiar só iria fragilizar o nosso tecido produtivo, destruir repentinamente milhares de postos de trabalho e minar ainda mais a nossa soberania económica. O plano do Governo PS também não era propriamente recuperar o controlo público desta empresa estratégica, tratava-se sim, tal como referimos na altura, de uma operação de urgência de recapitalização da TAP para mais tarde privatizar, assim que fosse novamente lucrativa, precisamente como foi exigido pela UE em defesa dos interesses das grandes companhias aéreas europeias.

A verdade é que, aquando da compra total do capital da TAP, o Governo considerou que Neeleman, antigo dono da TAP, descapitalizou a empresa em benefício da sua outra companhia aérea, a Azul. Ainda assim, não impôs nenhuma litigância pela gestão danosa e garantiu que a dívida da TAP à Azul seria paga. Foi mais um bom negócio para Neeleman que assim se livrou de todos os problemas que só agora iam começar.

O Plano de Reestruturação da TAP, que consistiu na injeção de  €3,2 mil milhões de dinheiros públicos, foi aprovado pela União Europeia em finais de 2021. Claro que este aval não foi gratuito, e impôs a redução da frota da TAP, a cedência de 18 slots (faixas horárias de aterragem e descolagem) no Aeroporto de Lisboa e a venda das participações da TAP na Groundforce e na empresa de catering. Para os trabalhadores, este novo plano representou cortes salariais – que chegaram aos 50% – e a destruição de milhares de postos de trabalho. 

Mesmo com as polémicas acesas em torno da gestão da TAP, o Governo avança já para o próximo passo: “o Governo pretende iniciar imediatamente o processo de abertura do capital da TAP”, como explicou o Ministro das Infraestruturas, João Galamba. O próprio Ministro das Finanças, Fernando Medina, não escondeu o entusiasmo com a venda da TAP que garantiu estar “para breve”. Mesmo depois de despedir a CEO, Galamba continuou a defender o bónus de desempenho de Ourmières-Widener, pela aplicação do Plano de Reestruturação que prepara a empresa para a privatização. 

A TAP fica assim como mais um exemplo na história em que empresas estratégicas para o país acabaram quase destruídas pela gestão privada danosa, e que, depois de salvas pelo Estado com transferências brutais de dinheiros públicos, são imediatamente entregues aos privados. De acordo com Costa, a mando da UE, o Estado serviu a sua função: socializou os prejuízos para agora os privados açambarcarem os lucros.

É preciso apurar responsabilidades pela gestão danosa, seja privada, seja pública, e imputar-lhes os custos devidos. Basta de continuarmos a pagar os buracos económicos e financeiros de todos os privados falidos e dos sucessivos Governos PS, PSD/CDS-PP. Só na TAP, desde 2016, foram enterrados perto de €3,3 mil milhões públicos. Vamos agora vendê-la por menos de mil milhões de euros? A TAP precisa de ser efetivamente nacionalizada, mas não deve ser controlada pelo partido do Governo, deve sim haver mecanismos de controlo dos trabalhadores da própria TAP. 

É incomportável que os milhares de trabalhadores da TAP se dediquem a construir a empresa e os seus sucessivos administradores e gestores se dediquem a satisfazer os seus interesses pessoais, favorecendo negociatas que prejudicam o interesse público. Não aceitamos a ingerência draconiana de Bruxelas! Não aceitamos a destruição da TAP.

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