Fadiga

Semana de 4 dias: o que foi afinal aprovado?

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O Orçamento do Estado para 2022 incluiu uma proposta do Livre, negociada com o PS, que encheu manchetes acerca da semana de 4 dias de trabalho. Nas últimas eleições legislativas, o MAS apresentou no seu programa a proposta intitulada “Semana de trabalho de 4 dias para atingir o pleno emprego“, pelo que nos cumpre verificar em que consiste exactamente a proposta aprovada.

A proposta levada a votação pelo Livre diz que o Governo promove o estudo e a construção de um programa piloto que vise analisar e testar novos modelos de organização do trabalho, incluindo a semana de quatro dias”,sendo esta já uma generalidade relativamente à sua proposta inicial que implicava “o estudo e a construção de um programa que visa testar a semana de 30 horas de trabalho por semana, em 4 dias de trabalho, a implementar a partir de 2023 e ao longo de três anos, num conjunto de até 100 empresas nacionais que nele se inscrevam”1.

Saltam à vista duas importantes diferenças entre as duas versões. A primeira, é o desaparecimento do requisito de que a semana de quatro dias tem de implicar uma redução do horário de trabalho semanal, indo, precisamente, ao encontro da proposta do PS, conforme formulou António Costa, na campanha eleitoral para as últimas legislativas, em Janeiro deste ano:

eu não estou a falar de tempo de trabalho, aquilo que está em cima da mesa e que queremos discutir (…) tem a ver com a organização do trabalho. Não estou a falar em 30 horas. Nós podemos trabalhar 4 dias por semana, mais horas em cada dia”2.

A segunda diferença é que o Livre facilmente recua de uma importante proposta de redução de uma jornada de trabalho condizente com os padrões de trabalho do séc. XIX para uma proposta vazia de conteúdo, deixando nas mãos da maioria absoluta do PS o como, quando, e em que moldes será feito o tal estudo. Tudo isto, sabendo nós dos problemas inerentes aos estudos solicitados pelo Governo PS sobre, por exemplo, o aeroporto do Montijo.

O frenesi mediático pode servir os interesses do PS que, assim, espalha ares de estar aberto ao diálogo e de aprovar propostas das forças políticas à sua esquerda, assim como dá cobertura ao projecto do Livre de que o diálogo com o Governo é profícuo. No entanto, verificamos que, sobre a semana de 4 dias, a proposta aprovada, para além de não ir além de um simples estudo, é completamente vazia para quem trabalha e que assim se vê privado de uma proposta que sirva os seus interesses no que à semana de 4 dias diz respeito. Depois de BE e PCP, nos últimos 6 anos, o Livre assume, agora, o papel de suposta “cobertura de esquerda” à nefasta política do PS, não só sobre o impedimento à semana de 4 dias, mas sobre a manutenção dos elevados impostos sobre o trabalho ou sobre a contenção nos salários e pensões.

A proposta do MAS é clara: a semana de trabalho de 4 dias tem que estar ao serviço da redução da jornada de trabalho, do aumento do tempo de lazer, do aumento da qualidade de vida, do pleno emprego. Nem o PS, nem o Livre parecem estar interessados em tais objectivos.

Há décadas que o desenvolvimento tecnológico tem sido transformado num aumento continuado dos lucros dos grandes grupos económicos e financeiros, num movimento desenfreado de acumulação de riqueza e desigualdade social. Os CEO portugueses auferem hoje, em média, 32 vezes mais que os trabalhadores das empresas que gerem3.

O MAS está empenhado, no movimento sindical e em todas as lutas dos trabalhadores na conquista da redução do horário de trabalho. Deste modo defendemos que o desenvolvimento tecnológico das últimas décadas, a maior influência da digitalização do trabalho, bem como os avanços a nível industrial e, particularmente, da robótica se traduzam numa diminuição do tempo de trabalho de todos, sem redução salarial. Exigimos uma semana de 4 dias, com 30 horas de trabalho, sem redução salarial.

1 https://eco.sapo.pt/2022/05/25/aprovada-proposta-do-livre-de-estudo-sobre-semana-de-trabalho-de-quatro-dias/

2 https://cnnportugal.iol.pt/videos/semana-de-quatro-dias-de-trabalho-antonio-costa-argumenta-que-mudou-a-percepcao-que-as-pessoas-tem-do-tempo-mas-remata-que-nesta-materia-e-liberal/61e205d90cf21847f0a53622

3 https://www.jn.pt/economia/ceo-portugueses-ganharam-32-vezes-mais-do-que-trabalhadores-em-2021-14890861.html

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