É esta a pergunta que estão a fazer milhões de trabalhadores franceses, que já foram às ruas em gigantescas manifestações e paralisaram sectores essenciais da economia, como as refinarias, os portos e os comboios, tudo para derrotar o projecto do governo de aumento da idade da reforma. Mas, até agora, apesar do apoio dado aos manifestantes por 70% da população, o enfraquecido e impopular governo de Nicolas Sarkozy não retirou o seu projecto de reforma e, inclusive, pretende aprová-lo no Senado nesta quarta-feira, dia 20 de Outubro. O que faz falta para dar o xeque-mate ao governo?
Para muitos sindicalistas e trabalhadores, faz falta convocar uma greve geral “reconductible” (renovável, isto é, por tempo indeterminado, sendo a sua continuidade decidida constantemente). É este o conteúdo do abaixo-assinado, já endossado por 1000 sindicalistas (http://appel.des.450.syndicalistes.over-blog.org) franceses: “Nós, sindicalistas da CGT, Solidaires, FSU, FO, CFDT, CNT, CDMT, CTU, LAB, STC, trabalhamos para que, agora, se desenvolva um movimento interprofissional de amplitude nacional: a greve geral, reconductible, o bloqueio da economia por parte daqueles que a fazem funcionar, mas não se beneficiam dela, estão na ordem do dia”.Nas sondagens, mais de 60% dos trabalhadores pronunciam-se a favor de uma greve que dure até a retirada do projecto de reforma do sistema de pensões, ao mesmo tempo em que muitas assembleias exigem um chamado claro a favor da greve geral por parte das confederações sindicais.
Alguns activistas analisam que há o perigo, como já aconteceu em outros episódios de luta, de haver um desgaste da mobilização se esta não alcançar um patamar superior. Eles criticam as direcções das maiores centrais sindicais, CFDT (Confédération française démocratique du travail), ligada ao PS, e Confederação Geral do Trabalho (CGT), ao PCF, de promoverem jornadas de acção sucessivas para esgotar o potencial de resistência dos trabalhadores, em vez de radicalizar a luta convocando uma greve geral.
Pelo contrário, CFDT e CGT não exigem a retirada do projecto de Sarkozy, mas a sua negociação para melhorá-lo, e rejeitam a ideia de uma greve geral. Bernard Thibault, secretário-geral da CGT, declarou à imprensa que não pretende parar o país, mas “forçar a discussão sobre o futuro das nossas pensões”. Muito menos pedem a derrubada do governo Sarkozy, uma exigência que está na ordem do dia para cada vez mais franceses. Os activistas que participam das manifestações de rua falam do sucesso que fazem as “notas” de 500 euros distribuídas pelos militantes do Novo Partido Anticapitalista (NPA) com as cabeças de Sarkozy e do ministro do Trabalho, Eric Woerth, com a palavra de ordem “Fora”.
Apesar da traição das direcções sindicais, o movimento continua a crescer, numa demonstração da coragem e tradição de luta da classe trabalhadora francesa. A entrada em cena da juventude – com mais de 300 liceus em greve – deu uma nova força à contestação ao governo. A greve nas refinarias está a provocar a falta de combustíveis e ameaça afectar a circulação aérea. Os comboios continuam a funcionar a meio gás, e os camionistas também se estão a mobilizar. Os ferroviários podem endurecer a luta nos próximos dias, que poderá incluir os trabalhadores das empresas de transporte. Mas a verdade é que ainda estão ausentes da luta alguns pesos-pesados, como os metalúrgicos e os trabalhadores dos transportes.
Assim como em 2005 o “Não” dos franceses fez fracassar a primeira tentativa da União Europeia de impor o Tratado Europeu, a luta actual da classe trabalhadora e da juventude em França joga um papel fundamental para derrotar o projecto da UE de retirar os direitos e as conquistas dos trabalhadores europeus. Os trabalhadores portugueses devem acompanhar com atenção o que se passa com os nossos irmãos de classe em França, não só para manifestar a nossa solidariedade, mas para aprender com a sua luta, que, afinal, é também a nossa.
Cristina Portella