Colômbia: votar em Petro e seguir lutando pelas reivindicações da rebelião de 2021

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No próximo domingo, 19 de junho, ocorrerá a votação do segundo turno das eleições presidenciais da Colômbia. As sondagens apontam para um empate técnico entre Gustavo Petro e Rodolfo Hernández.

Na primeira volta, ocorrida no dia 29 de maio, Gustavo Petro, candidato da aliança centroesquerdista “Pacto Histórico”, obteve 40,32% dos votos (8.527.768) e Rodolfo Hernández, empresário e ex-prefeito de Bucaramanga, 28,15% (5.953.209). A votação de Petro é a mais alta já obtida na história da Colômbia por um candidato que se reivindica de esquerda. Num país dominado historicamente pela direita pró-imperialista, antes pelo Partido Conservador e pelo Liberal, e mais recentemente pelo uribismo, isso tem um significado especial.

Outro dado importante é que os grandes derrotados do processo eleitoral colombiano foram Alvaro Uribe, o atual presidente Iván Duque, e seu partido Centro Democrático, que, depois de ganhar 4 das últimas 5 eleições presidenciais, nem sequer apresentou candidato próprio nestas eleições.

O pré-candidato do uribismo, Oscar Iván Zuluaga, retirou-se da consulta para a seleção dos candidatos das distintas alianças eleitorais, ocorrida no dia 13 de março, que foi realizada simultaneamente com as eleições parlamentares, nas quais o uribismo passou de principal força no Congresso para quarto lugar. De 19 senadores e 32 representantes que tinha, acabaram com 14 e 16, respectivamente.

A segunda volta presidencial será realizada a dois meses de completar um ano da heróica rebelião popular do povo colombiano contra o governo de Iván Duque, que começou no dia 28 de abril de 2021. Foi o maior protesto social na Colômbia desde o “paro cívico” de 1977.

A vitória de Petro e a derrota do uribismo no primeiro turno são a expressão distorcida da rebelião do ano passado e refletem os anseios de mudança evidenciados nas mobilizações, marcadas pela participação massiva do povo, dos trabalhadores e dos jovens do país contra a reforma tributária e o “pacotaço” económico antipopular; mas, também, contra a sistemática violação dos direitos humanos, orquestrada tanto pelas forças de segurança do Estado como por grupos paramilitares apoiados pelo governo.

As eleições na Colômbia ocorrerão com o pano de fundo da rebelião popular do ano passado, enquanto seguem latentes as causas que originaram aquela explosão social que percorreu as cidades e povoados colombianos.

Acreditamos que, neste segundo turno, é necessário terminar de derrotar o uribismo, assim como a direita representada por Rodolfo Hernández. Federico Gutiérrez “Fico”, respaldado pelo uribismo, e algumas figuras políticas ligadas ao Centro Democrático e a Uribe começaram a manifestar seu apoio a Hernández. Por isso, é importante derrotar os setores mais à direita, e acreditamos que isso só é possível votando massivamente em Gustavo Petro.

Fazemos esse chamado a partir de uma posição crítica, sem dar nenhum cheque em branco ao candidato do Pacto Histórico. Não podemos esquecer que Petro, no momento mais importante da rebelião popular do ano passado, questionou publicamente os bloqueios de estradas. Disse que não estava por trás das mobilizações que estavam ocorrendo e em nenhum momento apoiou a palavra de ordem de “Abaixo Duque”, que importantes setores do povo mobilizado estavam defendendo. Petro apresenta um programa de governo bastante limitado, que não ataca os principais problemas que afetam o povo trabalhador colombiano.

Vamos acompanhar o voto de milhões de trabalhadoras, trabalhadores e jovens colombianos. Respeitamos que vejam em Petro uma possibilidade de mudança, mas afirmamos que Petro e o Pacto Histórico formarão um governo de conciliação de classes, de duplo discurso. Como Boric no Chile, Castillo no Peru ou como um possível governo Lula no Brasil. Governos que, ao mesmo tempo que possuem um discurso aparentemente “popular” e “progressista”, pactuam com a burguesia e as multinacionais e continuam aplicando os planos de ajuste contra os povos.

Petro foi nítido ao afirmar que não tocará na propriedade privada dos meios de produção, ou seja, os grandes grupos económicos, financeiros e latifundiários, reproduzindo a exploração capitalista. Num país onde há uma grande concentração da riqueza e com o nível de pobreza mais alto da América Latina. “Jamais pronunciei a palavra expropriação”, disse Petro num dos debates com os outros candidatos. Inclusive, junto à candidata a vice-presidente Francia Márquez, assinou numa nota um compromisso de não expropriar. Além disso, defende manter os tratados de livre comércio assinados pela Colômbia, renegociando-os, perpetuando, assim, a dominação imperialista.

Mantendo a economia nas mãos dos grandes grupos econômicos, como propõe Petro, não haverá solução para o povo, os trabalhadores, trabalhadoras, camponeses e jovens colombianos. Por isso, é preciso seguir lutando, tal como se fez no ano passado, desde abril. Seguir lutando contra a exploração capitalista e pelas principais reivindicações operárias e populares.

A Colômbia é um país que foi governado durante décadas pelos partidos burgueses da direita conservadora e liberal (Uribe, Duque, entre outros), totalmente entregues ao imperialismo norte-americano. Foram anos de aplicação de pacotes de ajuste que submeteram o povo à pobreza e à exploração, amparada na violação sistemática dos direitos humanos, na violência paramilitar e estatal.

Como dissemos, esse chamado a votar em Petro não significa que tenhamos expectativas num eventual governo do candidato do Pacto Histórico, mas a sua vitória, sem dúvidas, abriria um período de esperança e altas expectativas no novo governo. Às milhões de pessoas que votarão em Petro, afirmamos que é preciso seguirem mobilizadas, confiando nas suas próprias forças, sem esperar que as soluções venham do governo. É preciso seguir exigindo as reivindicações que inspiraram a rebelião do ano passado, cuja solução segue pendente. O povo colombiano deve se manter mobilizado por suas demandas urgentes; construindo uma alternativa revolucionária, na perspectiva de lutar por um Governo da Classe Trabalhadora e do Povo.

Artigo de Miguel Ángel Hernández Arvelo, dirigente do Partido Socialismo e Liberdade (PSL) – secção da Unidade Internacional de Trabalhadores e Trabalhadoras – Quarta Internacional na Venezuela

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