Lula e Alckmin celebram vitória eleitoral

Lula vence, mas a margem mínima estimula o bolsonarismo. É tempo de construir uma alternativa à esquerda

Lula venceu as Presidenciais brasileiras de 2022 por uma margem menor que 2% – 2 milhões de eleitores – face a Bolsonaro, numa importante vitória eleitoral para o povo brasileiro. A curta distância entre Lula e Bolsonaro, já registada na 1ª volta, galvanizou o bolsonarismo que acabou por conquistar mais 7 milhões de votos, na 2ª volta, enquanto Lula apenas conseguiu conquistar mais 3 milhões.

Apesar da vitória, Lula não conquista uma maioria confortável para governar. Lula alcança apenas 28% da Câmara dos Deputados e 20% do Senado, enquanto Bolsonaro conquista 38% e 31%, respectivamente1. Será uma presidência que se prevê instável, sobretudo pela dependência de um conjunto de partidos de direita e centro-direita que representam o restante terço da Câmara dos Deputados e do Senado, aos quais Lula terá de distribuir pastas ministeriais e benefícios para conseguir o seu apoio. Isto sem falar de um movimento bolsonarista que não acusa o desgaste da presidência de Bolsonaro. Este é o resultado de um país completamente polarizado, fraturado, económica, social e politicamente.

Lula vence, mas a margem mínima face a Bolsonaro tem um significado. As reformas, implementadas pelos Governos PT e que tiraram milhões da fome, não fizeram esquecer a sua corrupção generalizada. A maioria dos pequenos empresários e uma boa fatia das classes trabalhadoras não perdoam Lula e o PT pelo roubo generalizado, assim como pelos benefícios distribuídos por políticos, grandes empresas e alta finança. E é desta podridão política que a extrema-direita se alimenta.

Para muitos milhões que votaram em Lula, este acabou por ser o mal necessário para derrotar eleitoralmente Bolsonaro, não a alternativa que a juventude e as classes trabalhadoras depositam confiança para resolver os seus problemas de pobreza, inflação, desemprego, violência e corrupção. Lula não consegue conquistar uma ampla maioria mesmo concorrendo contra a figura de uma presidência desconcertantemente incapaz, corrupta, genocida, ultrarreacionária, autoritária, disposta a demolir a democracia brasileira. Lula vence a disputa pelo lugar de menos odiado, pela margem mínima. E isso gera confiança no seio do bolsonarismo.

Bolsonaro resguardou-se no silêncio, durante 2 dias, após as eleições, para avaliar a disponibilidade dos seus aliados políticos para contestar os resultados, assim como possivelmente negociar a imunidade da sua família para escapar às possíveis condenações judiciais.

O silêncio foi suficiente para o bolsonarismo, sedento de um golpe para se manter no poder, entender que o seu líder não iria assumir a derrota e tomar a iniciativa de sair às ruas a contestar os resultados eleitorais através de centenas de cortes de estrada, muitos deles com o apoio da própria polícia, num país dependente das redes rodoviárias para funcionar. Este foi o resultado que Bolsonaro cultivou, nos últimos meses, ao repetir insistentemente a narrativa de fraude eleitoral.

Sem margem, nem aliados políticos, Bolsonaro foi forçado a assumir que não tem condições para subverter o regime democrático parlamentar, pelo que terá de se acomodar ao lugar de oposição. Foi o Chefe da Casa Civil que assumiu, de acordo com a devida “autorização” de Bolsonaro, que irão iniciar o processo de transição. Contudo, Bolsonaro não assume a derrota. Não reconhece a vitória de Lula. E dá justificação política às acções de boicote do bolsonarismo, apelando, ainda que sem grande convicção, a que se dêem de forma pacífica. Em suma, o espaço nas ruas está aberto ao bolsonarismo para a criação da maior instabilidade possível. A juventude e a classe trabalhadora terão de lutar nas ruas pelo “Fora Bolsonaro!” até à sua saída efectiva.

Bolsonaro pode ter sido derrotado nas urnas, mas o bolsonarismo veio para ficar. Embora tenha na prática mandado os seus apoiantes para casa, a sua derrota só será possível através da mobilização da juventude e trabalhadores em torno da resolução dos seus problemas económicos, sociais e políticos, retirando base popular a Bolsonaro.

O governo de conciliação com os grandes grupos económicos e banqueiros que Lula cozinhou está vocacionado para dar continuidade à acumulação de capital e não para tratar dos graves problemas sociais que atravessam o Brasil. Se assim se confirmar, este será o caminho mais rápido para o regresso de Bolsonaro ao poder. Foi precisamente esta a experiência com os últimos governos do PT.

Assim que Bolsonaro abandonar o poder, o PSOL tem a decisiva tarefa de se opor ao projeto de Lula-Alckmin e construir uma alternativa independente do Governo Lula que mobilize a classe trabalhadora em torno da resolução da fome, da pobreza, da inflação, do desemprego, da insegurança e da corrupção. Aquilo que BE e PCP fizeram, aqui em Portugal, ao apoiar o Governo PS, enfraqueceu-os em benefício do próprio PS e abriu espaço, na oposição, à extrema-direita. Que o caso português sirva de lição para aquilo que o PSOL não deve fazer agora perante a questão do Governo. Durante as eleições, o PSOL cometeu o erro de não lançar uma candidatura própria e fazer parte da frente ampla que apoiou Lula logo na 1ª volta. Seguir esse rumo colocará o PSOL no Governo e em risco de destruir aquela que, neste momento, ainda pode ser, no Brasil, a melhor alternativa pela esquerda ao PT.

Como Lula, o PT e a CUT tiveram desde sempre a política de derrotar Bolsonaro nas eleições mas não combater o Bolsonarismo nas ruas. Os setores mais reacionários mantêm-se mobilizados, como se vê pelas ações de corte de estrada e pela ação dos camionistas. Ao mesmo tempo, a classe trabalhadora brasileira permanece desmobilizada, quer pelo freio do PT e da CUT, quer pela própria dúvida e mesmo desconfiança existente sobre o futuro Governo. É obrigação, principalmente do PT e da CUT, mas também do movimento social e restante esquerda, mobilizarem-se de forma a combater o Bolsonarismo, que, ao contrário do seu líder, não só não sai derrotado das eleições, como sai fortalecido dentro das instituições. É obrigação de toda a esquerda garantir que a derrota de Bolsonaro seja efetiva e isso tem de ser feito nas ruas, mobilizando a classe.

É preciso travar o autoritarismo e o fascismo. Fora Bolsonaro! É preciso construir uma alternativa política independente de e para os trabalhadores e oprimidos.

1 https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2022/noticia/2022/10/07/bancadas-eleitas-no-congresso-hoje-nao-dao-maioria-a-lula-ou-bolsonaro-e-eleito-tera-de-negociar-entenda.ghtml

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