A 15 de Maio, passam 72 anos desde a declaração de independência que consagrou a criação do Estado de Israel. Em 1947, a Palestina histórica, sob ocupação inglesa, contava com uma população que era em mais de dois terços árabe palestiniana e a restante, predominantemente, judia.
Sete décadas volvidas, os palestinianos são um quinto de quem habita o Estado de Israel, legalmente privados de direitos civis elementares, encontrando-se os restantes e seus descendentes cercados, guetizados e bombardeados na Cisjordânia e Faixa de Gaza, ou dispersos pelo resto do mundo.
Como e porquê?
No século XIX, uma corrente minoritária, entre a comunidade judia internacional, politicamente organizada, criou e fez crescer o sionismo moderno. Uma ideia segundo a qual, os judeus deveriam reclamar um direito histórico à terra da Palestina, colonizando-a e afastando a população lá residente.
Este movimento foi considerado bastante útil, pelas principais potências mundiais, umas décadas mais tarde, já em pleno século XX. Estas veriam aqui uma oportunidade para estabelecer um regime aliado que pudesse cumprir um papel de posto avançado numa região que, com o fim do império otomano, se fragmentava em diferentes unidades que reclamavam a sua auto-determinação e eram, por isso, hostis aos interesses dos imperialismos inglês (Palestina, Jordânia e Iraque) e francês (Líbano e Síria).
Assim, projectou-se retalhar aquela zona entre uma pátria nacional judia e um estado árabe, com Jerusalém tendo um estatuto especial misto a ser administrado pelas Nações Unidas.
Para que esta nova “pátria judia” fosse, demograficamente, sustentável, ou seja, para que se garantisse que a maioria da população fosse efectivamente judia, nos meses anteriores à da independência, em 1948, as milícias e forças militares sionistas iniciaram uma limpeza étnica de grande parte das cidades e vilas palestinianas, conduzindo à expulsão de mais de 80% desta população.
Foram então implementadas leis que, por um lado, negaram aos palestinianos o direito a reentrarem no seu território e, por outro, expropriaram as terras e casas daqueles mesmos palestinianos.
Este sistema legal, de base racista, vigora até aos dias de hoje, podendo ser ilustrado com o seguinte exemplo de dois cidadãos portugueses, nascidos em Portugal. O cidadão português A, filho de palestinianos, expulsos da Palestina, em 1948, não pode, mesmo detendo nacionalidade e passaporte portugueses, visitar a terra dos pais. O cidadão português B, judeu, certificado por um rabi (autoridade religiosa), pode não só visitar, como obter cidadania israelita e viver no local de onde foi expulsa a família do cidadão A. Por outro lado, para os cerca de 20% de cidadãos israelitas, de ascendência palestiniana (com origem nas famílias que não foram expulsas), contam com várias dezenas de leis que os discriminam negativamente. Este mesmo ano de 2018, no contexto da deriva autoritária e de extrema-direita do actual Governo israelita, foi aprovada uma emenda à constituição que reitera Israel como Estado-nação judeu e consagra a minoria palestiniana como cidadãos de segunda.
Como a natureza do Estado israelita não se satisfaz com as fronteiras que lhe foram inicialmente atribuídas, a sua expansão, com a expulsão e expropriação de palestinianos, também se mantém até aos dias de hoje. Várias décadas após a descolonização oficial de África pelos Estados europeus, em pleno século XXI, Israel promove a colonização de terras retiradas aos palestinianos por indivíduos de cidadania israelita. Este mesmo ano de 2018, foram demolidas 167 estruturas, propriedade de palestinianos, segundo dados das Nações Unidas.
Nada desta dinâmica seria possível sem os 6 mil milhões de dólares de ajuda militar que, todos os anos, os Estados Unidos destinam a Israel. O mesmo se aplica à cobertura política e diplomática que é dada a Israel pelos Estados com mais peso no cenário internacional, nomeadamente os europeus.
Não existe solução justa e democrática para este “conflito”, sem ter em conta o direito ao regresso dos palestinianos expulsos, assim como os seus descendentes, ou o fim do apartheid legal que vigora e vai sendo reforçado, actualmente, no Estado de Israel e territórios por ele ocupados. Não existe solução justa e democrática que inclua um estado racista e colonialista que serve de posto avançado do imperialismo no Médio Oriente.
Entre outras acções há que responder ao apelo da sociedade civil palestiniana, boicotando o Estado de Israel nas suas vertentes económica, académica, cultural e desportiva, não deixando que este use iniciativas deste âmbito para branquear os seus crimes e reduzir o seu crescente isolamento.
Destaca-se a este nível, o apoio expresso do director do Teatro Nacional D. Maria II à campanha BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções), ou os recentes cancelamentos de concertos, em Israel, por artistas como Lorde ou Shakira. É partindo deste boicote, que os trabalhadores solidários de todos os países, devem lutar pelo fim deste apoio e por sanções que façam desmoronar o estado racista, para que se erga, no seu lugar, uma Palestina multiétnica, laica, democrática e inclusiva.
Esta sexta-feira, 15 de Maio de 2020 centenas de artistas a nível mundial, tais como: Tiago Rodrigues, Sérgio Godinho, Vic Mensa e Viggo Mortensen Jr. apelam ao fim do cerco de Israel à faixa de Gaza em plena crise do coronavírus, veja aqui.
André T.
Créditos do cartoon da imagem para: Mohammad Sabaaneh