A derrota da Syriza (esquerda grega no poder central desde 2015), nas eleições europeias em 26 de Maio, e nos escrutínios regionais e municipais que decorreram em simultâneo, forçou o primeiro-ministro Alexis Tsipras a anunciar legislativas antecipadas, que apenas deveriam decorrer no Outono.
A Syriza (23,8%)[1] perdeu as eleições europeias para o partido de direita, a Nova Democracia (ND), por uma diferença de 10%. Nas eleições municipais perdeu para o candidato Kostas Bakoyannis da ND (65%), a capital da Grécia, onde se concentra quase metade da população do país balcânico, tendo o candidato da Syriza obtido apenas 35% dos votos. Ao mesmo tempo, a coligação “Movimento Para a Mudança”, essencialmente constituída pelo ex-PASOK e outros pequenos partidos do centro, ficou em 3º lugar nas eleições europeias, obtendo 7,72% dos votos e confirmando o colapso do antigo partido socialista grego.
As perspectivas para as eleições legislativas do dia 7 de Julho não são as mais animadoras. As sondagens dão a vitória à ND, com um avanço de 10 pontos sobre a Syriza[2]. Os motivos da derrota que se perspectiva para a Syriza serão diversos, mas um dos fatores em destaque é o pesadíssimo pacote de austeridade implementado pelo Governo de Alex Tsipras, em coligação com o partido nacionalista e de direita, ANEL. Na Grécia fala-se abertamente que este Governo, que durou 4 anos, se resumiu à aplicação do 3º memorando da Troika, que veio na sequência dos memorandos aplicados pelo PASOK (Partido Socialista Grego) e ND, respectivamente.
Nas eleições europeias, o insuspeito Nikos Filis, uma das principais figuras da Syriza, disse sobre o colapso desta coligação: “A primeira razão [para a derrota da Syriza] foi a aplicação dos memorandos. Talvez estes fossem menos dolorosos do que os anteriores, e a Syriza tentou encontrar caminhos que ajudassem os nossos cidadãos mais vulneráveis, mas, no final, aplicou memorandos de um impulso neoliberal. O doloroso compromisso [de engolir o memorando imposto pela UE] também envolveu outros compromissos. Nenhum partido foi capaz de escapar do destino de [implementar] os memorandos que os condenam. [O conservador] Nova Democracia perdeu em fazer isso, e então se reconstruiu, enquanto o Pasok [de centro-esquerda] entrou em colapso.”[3]
A vitória da Syriza nas eleições legislativas de Janeiro de 2015, num contexto europeu de aplicação de planos de austeridade muitos violentos para Grécia e para outros países europeus, como Espanha ou Portugal, gerou uma onda de esperança não só na Grécia como em toda a Europa.
Passados 6 meses de negociações entre Alex Tsipras e a Comissão Europeia, o Governo Grego capitulou em toda a linha e tornou-se mais um dos “bons alunos” que seguem ao milímetro as directrizes da União Europeia. A esperança da classe trabalhadora grega e europeia transformou-se em poucos meses em desilusão e desmoralização.
Passados 4 anos, a possível volta ao poder da ND traz ao de cima os erros estratégicos seguidos pela Syriza. Um dos principais erros foi tentar conciliar no Governo interesses antagónicos. A aliança para governar com um partido da direita xenófoba como o ANEL, a esperança em convencer a União Europeia de que era possível conciliar os interesses dos ricos e poderosos dos seus principais países com os interesses do povo grego e a posterior capitulação à EU, com a aplicação de um novo memorando pejado de ideologia neoliberal, demonstram o erro estratégico de não manter a independência da classe trabalhadora. A perspectiva nunca foi apoiar-se no lado de cá da barricada, ou seja, na força e luta dos trabalhadores gregos e europeus. A perspectiva sempre foi a de que as instituições da classe dominante (UE, BCE e FMI), cedessem em algum ponto e que se continuasse a pagar uma dividia impagável aos credores. Pelo contrário, a estratégia da burguesia foi clara desde o início, esmagar o povo grego.[4]
Este erro custou caro ao povo da Grácia, mas também aos restantes trabalhadores europeus. A consequência foi a legitimação do discurso de que a “esquerda e a direita são a mesma coisa” ou que “são todos iguais”, colocando assim a classe trabalhadora na defensiva, sem confiança em si própria e educando-a de que o caminho possível é conciliar os interesses da classe trabalhadora com os interesses dos patrões e banqueiros.
Extrema-direita
Relativamente à extrema-direita grega, esta atravessa uma reorganização. A Aurora Dourada (AD), partido abertamente fascista, teve uma derrota – apesar de ter sido a 5ª força politica mais votada, com 4,8% dos votos, desceu bastante o seu número de votos se comparamos com as eleições legislativas de 2015 (7%), ou as europeias de 2014 (9,39%).
Além da prisão de muitos dos membros da sua direcção, sofreram sobretudo com o surgimento de um novo partido de extrema – direita, a Solução Grega (SG), que obteve 4,18% dos votos. A SG apoiou-se nas mobilizações nacionalistas em torno da questão da Macedônia e, à semelhança do que acontece em outros países europeus, surgiu como uma tentativa de sectores da extrema-direita se tornarem mais acessíveis e aceitáveis aos olhos das grandes massas.
Derrota da Esquerda Grega e a sua fragmentação
A derrota da esquerda grega foi grande, pois a queda da Syriza não se reverteu no crescimento dos diversos partidos de esquerda. O único partido que captou algum do eleitorado da Syriza foi o novo partido (MeRA25), de Iannis Varoufakis, ex-ministro das finanças do Governo Syriza/Anel, que obteve 2,9% dos votos, embora não sendo suficiente para eleger um eurodeputado, ficando a 500 votos desse objetivo. O partido da ex-parlamentar da Syriza, Zoe Kostantopoulou que, à semelhança de Varoufakis, saiu da Syriza e formou um partido muito centrado na sua pessoa, teve apenas 1,6% dos votos.
Estes dois partidos são sobretudo partidos unipessoais numa versão moderada, ou seja, não se pode dizer taxativamente que existem diferenças substanciais com a Syriza.
A Unidade Popular (UP), foi também uma ruptura da Syriza, liderado pelo ex-ministro da energia e líder da plataforma de esquerda que actuava dentro da Syriza, Panagiotis Lafazanis obteve nas eleições europeias somente 0,58%, e a Antarsya que é uma coligação de vários partidos e correntes de esquerda obteve 0,66%.
Perante a derrota da Syriza é preocupante que, à sua esquerda, não se capitalize nada do seu desgaste. Stathis Kouvelakis, professor de teoria política e ex-membro da Syriza, afirma que «A UP e a Antarsya subestimaram seriamente a necessidade de apresentar propostas alternativas credíveis e desenvolvidas, em vez de pensar que bastava denunciar o governo da Syriza e exigir a saída da zona do euro e da União Europeia. Numa situação de desmoralização, em que a ideia do “Não há alternativa” reina de forma suprema, este discurso aparece como um exercício meramente retórico, que não convence ninguém. A falta de um projeto real permitiu que Varoufakis aparecesse como portador de uma mensagem “inovadora” e “sexy”, jogando habilmente o papel de uma oposição moderada e “compatível com o euro” a Tsipras e ao Syriza.”[5] E Stathis Kouvelakis acrescenta ainda “Quanto ao resto da esquerda, o Partido Comunista (KKE) permaneceu igual em relação ao seu resultado nas eleições gerais de 2015 (5,5%), embora tenha caído se compramos com o resultado das eleições europeias de 2014 (onde obteve 6,1%). Os resultados nas eleições regionais também indicam uma perda notável em relação às eleições de 2014, na ordem de um quinto do seu voto. Em Atenas, a sua votação caiu de 10,6 para 8,3%, na Macedônia Central de 8 para 5,7%, e na área da Tessália (na Grécia Central) caiu de 10,4% para 7%.»[6]
As eleições legislativas do dia 7 de Julho de 2019 estão já aí e perspectiva-se a eleição da ND. Torna-se ainda mais urgente a necessidade de uma alternativa anticapitalista na Grécia, independente dos ricos e poderosos e que tente de facto disputar a classe trabalhadora, sem perder o ponto de vista estratégico da tomada do poder. Para isso a unidade de todos os sectores da esquerda, baseada num programa anticapitalista, é fulcral.