A tragédia do povo grego continua. Desde Dezembro que se tem assistido a um impasse na “novela” das negociações entre o Governo da Syriza /Anel e os seus credores (BCE, UE e FMI).
Em Fevereiro, as negociações ocorreram sob o pretexto de libertar uma nova tranche comprometida com o memorando assinado no verão de 2015, no montante de 6 mil milhões de euros. Este dinheiro serviria para, em Julho, a Grécia pagar uma parte da dívida ao seu principal credor, BCE.
No entanto, o desbloqueamento da tranche não se verificou até dia 20 de Fevereiro, sobretudo porque tanto UE/BCE como FMI exigiram mais medidas de austeridade, mas também por algumas divergências entre estas instituições.
A UE/BCE querem que o FMI participe também do financiamento do 3º resgate, uma vez que o FMI tem apenas tido uma participação “técnica”. Contudo, há divergências entre os próprios membros do FMI. A sua maioria defende que para entrar com o financiamento é necessária uma reestruturação da divida (feita pelos credores com um alongamento de prazos), e de mais “reformas” (medidas de austeridade). Pelo lado das instituições europeias, sobretudo no caso da potência que controla a UE, a Alemanha, esta defende que não tem que existir nenhuma reestruturação da divida. Porém, há acordo com o FMI no que toca a aplicar mais medidas de austeridade além de 2018 (fim do 3º resgate). Shauble é o rosto mais radical desta visão e, em várias declarações à imprensa, chantageia a Grécia afirmando que ou aplica mais medidas de austeridade, ou saí do Euro.
Assim, o grande acordo entre os credores é a continuidade da austeridade, mantendo a submissão/dependência do povo grego. Depois, entre os credores há táticas/linhas diferentes de como o fazer, que variam consoante os interesses das grandes potencias, sobretudo da Alemanha/UE e EUA/FMI. No caso dos EUA, interessa-lhes que a UE, como um todo, se debilite. E, como o principal credor da Grécia é o BCE, os EUA defendem a já falada renegociação da dívida. Pelo exposto, as instituições UE/BCE nem querem ouvir falar em alterações de prazos e em resposta exigem a entrada financeira do FMI no 3º resgate.
Desde o final do ano de 2016, o governo da Syriza, acossado pelas sondagens desastrosas para a sua coligação (16%, com a Nova Democracia a atingir os 32%), ensaia uma tentativa de apagar a imagem de governo da austeridade violenta, sendo que em Dezembro passado aplicou o pagamento de um bónus entre os 300 e os 800 euros aos pensionistas com rendimentos até 850 euros e a suspensão do aumento de IVA nas ilhas gregas. Mas, tal como indicam as sondagens, parece que o povo grego não apaga da memória os dois últimos anos de aplicação da mais feroz austeridade. Neste contexto, o governo constrói a narrativa de que combate os ditames da UE. Mas, a mentira tem pena curta e na última reunião do Eurogrupo (20 de Fevereiro) o governo da Syriza/Anel cedeu novamente e chegou a acordo com os credores.
Mais uma vez, Tsipras aceitou preparar as “reformas” solicitadas pelos credores num montante de 3,6 mil milhões de euros, ou seja, 2% do PIB, sem ter sequer uma promessa relativamente à renegociação da dívida. E, tendo ainda como troca a volta a Atenas dos “técnicos” da UE e FMI.
No meio de todo este cenário, o governo Syriza/Anel tem um discurso tenebroso para consumo interno de que o acordo é um sucesso, pois garante que não vai haver nem mais um cêntimo de austeridade. É um jogo de palavras e mentiras.
O governo Syriza/Anel, ao concordar em ter, a partir de 2018, um superavit de 3,5% por um tempo indeterminado (fim do 3º resgate), está a condenar o povo grego a uma austeridade perpétua.
Atingir o superavit primário de 3,5% só será possível com mais uma nova leva de austeridade, o que implicará mais cortes nas pensões e nos salários, flexibilização do mercado de trabalho (ataque à contratação colectiva e ao direito à greve), aumento de impostos para os trabalhadores, mais privatizações e isenção de impostos para as multinacionais. Estas são as “reformas profundas” que UE e FMI têm falado nos últimos dias nos meios de comunicação social.
Perante tal cenário catastrófico, o povo grego continua a lutar, embora com uma intensidade muito diferente do que em anos como 2010, 2011 e 2012. A capitulação em toda a linha da Syriza, depois da esperança que gerou, teve como consequência uma forte desmoralização do povo. No entanto, tem havido algumas lutas sectoriais como a luta dos auxiliares de limpeza dos hospitais e dos agricultores que, inclusive, têm feito cortes de estradas. Desde o anúncio do acordo verificou-se também a greve do metro de Atenas. E, está a preparar-se um dia de luta para 2 de Março, onde se prevêem greves e manifestações.