O povo britânico votou pela saída do Reino Unido da União Europeia (“UE”). Cerca de 73% do povo britânico foi votar e desses, 52% decidiu-se pela saída – o famoso “Brexit”. Foram 17 milhões de britânicos a votar pela saída da EU contra 16 milhões que votaram pela permanência na UE.
É evidente que o Reino Unido se dividiu sobre esta questão. Note-se que o País de Gales votou pela saída, como a Inglaterra (excepto Londres) e a Irlanda do Norte e a Escócia preferiram ficar na UE. Em ambos estes territórios já houve reacções separatistas ao resultado do referendo. É caso para dizer que nem o Reino está Unido e que se abre um novo momento na crise da UE.
Entretanto, o Primeiro-Ministro, David Cameron já se demitiu.
Que resultado é este?
Empurram-nos constantemente pela boca abaixo que a UE surgiu e é, ainda hoje, um projecto de paz e de cooperação entre os povos. No entanto, parece não existir povo que viva em paz com tal projecto.
Os gregos estão afogados numa dívida monstruosa fruto da especulação e corrupção. Os povos do Estado espanhol vivem sob uma taxa de desemprego que ronda os 24%. Os italianos estão a braços com um buraco financeiro gigantesco. Os franceses levantam-se contra uma reforma da Lei Laboral que pretende fazer regredir as suas condições de vida e de trabalho por décadas. Os portugueses não suportam mais trabalhar tantas horas, com salários tão baixos.
Estes não são os problemas específicos de cada um dos destes países. É pior ainda! Todos os Estados-membros da UE padecem, em maior ou menor grau, da conjugação deste conjunto de problemas. Não há Portugal sem uma dívida monstruosa, nem Grécia sem um desemprego de 25%, nem Reino Unido sem buracos financeiros.
Mais: não existe hoje povo vítima da guerra ou de perseguição política e étnica que encontre refúgio na Europa.
Que “integração europeia” é esta? Não foi um projecto de paz. Foi sim um conjunto de acordos económicos e financeiros entre as elites do centro da Europa. Precisava-se de aço e ferro para se voltar a reconstruir infra-estruturas destruídas pela II Grande Guerra, fizeram-se pactos comerciais nesse sentido. Precisou-se facilitar a acção especuladora da banca, abriram-se as fronteiras à livre circulação de capitais. Precisou-se limitar a produção, as condições de trabalho e as políticas económicas e sociais dos vários Estados-membros, legislou-se no sentido de delimitar a acção política soberana de cada Estado. Precisou-se extrair riqueza dos Estados mais periféricos em benefício dos Estados mais centrais e criou-se o Euro.
A “integração europeia” foi e é um projecto dirigido pelas várias burguesias europeias que têm como objectivo o enriquecimento em benefício próprio, à custa dos povos europeus. Obviamente que após a maior guerra mundial, esse projecto só poderia dar os primeiros passos se assumisse as vestes da “Paz”. No entanto, fica hoje mais claro que este é um projecto que, desde a sua raiz, não passa do aprofundamento dos benefícios dos banqueiros e grandes empresários europeus em detrimento dos seus povos.
O que temos, hoje em dia, é, por um lado, o salvamento da banca, com injecções de capitais públicos de proporções bíblicas, por contrapartida do esmagamento geral das condições de trabalho; uma precarização generalizada; desempregos altíssimos; salários cada vez mais baixos; destruição de serviços públicos; privatização de sectores estratégicos; défices astronómicos e dívidas impagáveis. O que temos é a especulação e corrupção do banqueiro a ser paga com a destruição das condições de vida de quem trabalha. O que existe é a separação entre quem tem governado e o povo.
Sejamos sérios, a desintegração foi efectivamente consumada pelas políticas seguidas pela UE. O resultado do referendo britânico é apenas uma consequência desta efectiva desintegração, não a sua causa. Os povos europeus estão cansados desta política. A UE, dirigida por PS’s, PSD’s, liberais e conservadores, não nos serve!
Pelo menos quatro Estados-membros da UE e a Turquia já estão a dar sinais de que pretendem consultas populares.
A UE e o Euro afundam os povos europeus. O MAS já nas últimas eleições europeias defendeu que se devia avançar para um referendo à permanência no Euro. Se os britânicos sentem falta de soberania, o que dizer dos portugueses, gregos ou espanhóis (?!)… Este é um bom momento para avançar, pelo menos, com este debate. BE e PCP têm a obrigação de trazer este debate para a ordem do dia.
Extrema-direita parece dar a maior cobertura ao “Brexit”…. Onde está a esquerda?
Começaram a erguer-se novos muros na Europa, desta vez contra os refugiados. Propostas políticas nacionalistas, racistas e xenófobas ganham peso. Esta é mais uma consequência das políticas europeias.
As políticas da UE têm empurrado uma parte importante dos povos, nomeadamente, nos países mais centrais, para os braços da extrema-direita. Esta aproveita a boleia do descontentamento popular contra a austeridade, põe-lhe à cabeça um discurso nacionalista, racista e xenófobo e é quem mais capitaliza a situação política.
Países como o Reino Unido, França ou países baixos vêm-se hoje ou com partidos de extrema-direita nacionalista e racista com grande influência ou em forte ascensão.
E onde está a esquerda? É simplesmente vergonhoso. Embora vá esgrimindo algumas críticas à actuação da UE, não consegue vislumbrar um plano que passe por fora da própria UE. A esquerda foi totalmente cooptada e comprada pelos actuais regimes políticos e pela UE. Olhemos para o Syriza na Grécia que, apesar da brutal destruição social não tem um plano que passe por fora da UE. Olhemos para o Podemos em Espanha que em nada questiona o Euro ou a UE. Olhemos para o BE e PCP, em Portugal, que nada avançam no sentido de colocar o debate político e a compreensão popular sobre a UE no seu devido lugar, antes pelo contrário, encontram-se a apoiar um governo PS que continua a encher os bancos com dinheiro público, defendo o Euro e não convoca um referendo.
A UE é protecção da banca especuladora, é protecção dos grandes empresários corruptos. A UE é desagregação, é menos emprego, é menos salário, é destruição das condições de vida dos povos europeus, é menos soberania.
Para reverter tudo isto, é necessário que avancemos imediatamente para um referendo ao Euro! Contra a xenofobia e o racismo! Pelo acolhimento dos refugiados! Contra a austeridade que divide os povos europeus!
Por uma Europa dos trabalhadores e dos povos sem xenofobia nem austeridade!