O ataque das forças armadas israelitas à frota internacional que levava ajuda humanitária à Faixa de Gaza desnudou uma vez mais o verdadeiro carácter do Estado de Israel. Pois o assassinato de pelo menos 9 activistas foi, em última instância, a continuidade da política genocida aplicada por Israel quotidianamente contra o povo palestiniano, em especial contra os habitantes da Faixa de Gaza.
Não nos referimos somente aos contínuos ataques militares israelitas sofridos por Gaza, mas também aos terríveis efeitos do bloqueio que Israel leva adiante, há vários anos, para quebrar pela fome a resistência de seus habitantes.Segundo relatórios da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização Mundial de Saúde (OMS), “as crianças de Gaza sofrem um aumento da obesidade mórbida que as afectará dramaticamente no futuro e encurtará a vida de muitas delas”. Com um cinismo total, alguns líderes israelitas caçoam e dizem que se trata de “colocar os palestinianos em dieta” (citado no artigo de Henry Siegman, diretor do US/Middle East Project para o diário Haaretz, publicada no Rebelião, 16/06/2010).
Contra esse massacre sistemático e permanente da população palestiniana em Gaza, uma série de activistas e organizações de direitos humanos se uniu em torno do Free Gaza Movement (Movimento Gaza Livre), lançando uma campanha internacional de luta pelo fim do bloqueio à Faixa de Gaza que, em Agosto de 2008, enviou a primeira frota internacional a esta região. A frota agredida por Israel integra essa campanha e, por isso, porque estava destinava a romper o bloqueio, foi atacada de forma brutal para dar uma lição: todo aquele que queira ajudar Gaza é um inimigo e será liquidado por Israel.
Aumento do isolamento internacional de Israel
Mas esta política israelita não está livre de consequências. À medida que cai aceleradamente a farsa de “país democrático” no meio de “países árabes ditatoriais”, com que Israel encobriu o seu verdadeiro carácter em décadas passadas, começa a crescer o repúdio e o isolamento internacional.
Após o ataque à frota, houve grandes mobilizações na Turquia, em países muçulmanos e em toda a Europa. Em todo o mundo, intensificaram-se as acções de massa em repúdio a Israel e, também, aumentou a consciência dos povos sobre o que é o Estado de Israel.
Uma consequência do ataque à frota no panorama da região do Oriente Médio tem sido o afastamento entre Israel e o governo turco, o seu principal aliado no mundo muçulmano. Um resultado quase inevitável, dado que vários barcos da frota tinham bandeira turca e dela participavam muitos activistas desse país (a maioria dos mortos eram turcos).
Uma outra consequência do episódio atingiu o governo egípcio do ditador Mubarak, mais um tradicional aliado de Israel, que se viu obrigado a liberar, por enquanto, o bloqueio de produtos que praticava sobre a Faixa de Gaza em colaboração com o governo israelita. E mesmo Israel tem sido obrigado a reduzir a lista de produtos proibidos pelo seu bloqueio.
Até na comunidade judaica norte-americana, a mais numerosa fora de Israel e um dos apoios mais fortes do Estado sionista, começam a surgir sectores que questionam a atitude israelita. No artigo já citado, Henry Siegman (ele mesmo um judeu norte-americano) afirma que: “a efusão da condenação mundial a Israel é uma reminiscência da época mais escura da era Hitler”. Siegman declara que, neste caso, é o Estado sionista que joga o papel dos nazistas e as suas vítimas são os palestinianos de Gaza: “um milhão e meio de civis viram-se obrigados a viver em uma prisão ao ar livre em condições sub-humanas durante mais de três anos”.
Cumplicidade imperialista
No entanto, nem a política genocida israelita contra os palestinianos nem o massacre dos activistas internacionais conseguiram alterar a cumplicidade dos governos dos países imperialistas (EUA e Europa) e da ONU com Israel. Tanto esses governos como o organismo internacional negam-se a condenar Israel e a sua política genocida.
As razões são muito profundas: em 1948, Israel foi criado, por votação da ONU, como um enclave imperialista para cumprir o papel de “gendarme” contra o povo palestiniano e a luta dos povos árabes. Neste sentido, é o único aliado seguro e incondicional dos EUA na região (conceito que foi claramente reafirmado por Obama). Por isso, a sua existência será defendida até o fim pelo imperialismo.
A população israelita apoia o genocídio
Os últimos factos também não modificaram o apoio amplamente maioritário da população israelita a esta política genocida. Segundo uma pesquisa realizada pelo jornal Israel Hayom, 92% dos israelitas apoiaram o ataque à Frota da Liberdade e 78% o fazem em relação ao assédio à Faixa de Gaza.
É absolutamente lógico: como habitantes de um enclave colonial-militar, a maioria dos habitantes judeus de Israel sabe que, para defender os seus privilégios e o seu nível de vida (sustentado numa economia baseada no orçamento militar e na fabricação de armas), deve defender até o final a existência desse Estado, porque dele depende a sobrevivência desses privilégios. E por isso apoiam todas as políticas e medidas (inclusive as mais cruéis e desumanas) destinadas a alcançar esse objectivo.
Alguns sectores bem minoritários de israelitas, como alguns dos sobreviventes da perseguição nazista ou os poucos pacifistas que são hostilizados abertamente pelos fascistas em seus actos, podem ter contradições com estas medidas. Mas, como cita Siegman, o sentimento amplamente maioritário é o que lhe disse um amigo israelita: “Para todos os efeitos práticos, eles são árabes”.
O que fica cada vez mais claro é que não haverá uma solução verdadeira enquanto não for destruído o Estado de Israel (cuja existência e natureza são a causa profunda do conflito) e não for criado um Estado palestiniano único, laico, democrático e não racista, onde os palestinianos que foram expulsos possam retornar às suas terras e no qual possam conviver em paz, se assim o quiserem, os judeus residentes que aceitem os direitos dos palestinianos.
Cresce a campanha de boicote a Israel
Está a crescer o isolamento e o repúdio a Israel nos meios sindicais, intelectuais e populares de todo mundo, aos quais começam a somar-se artistas de vários países. Por exemplo, o músico mexicano Carlos Santana, o cantor inglês Elvis Costello e a banda de rock Pixies cancelaram os seus shows em Israel.
Mais importante ainda, a campanha internacional pelo boicote vem dando um salto. A campanha foi lançada em 2005, pelo PACBI (Palestinian Campaign for the Academic and Cultural Boycott of Israel – Campanha Palestina para o Boicote Cultural e Académico a Israel), da qual um dos membros fundadores é Haidar Eid, professor da Universidade da Al-Aqsa, em Gaza (ver entrevista em http://www.litci.org/declarações/94-médio-oriente/808-artigo808).
Esta campanha foi lançada por uma ampla coalizão de entidades palestinianas que agrupou praticamente todas as correntes de opinião que actuam por lá. A partir de sua proposta, foi criada a Plataforma BDS (Boicote, Não-Investimento e Sanções), que impulsiona um boicote internacional, sindical, académico, desportivo, comercial e de consumidores a Israel. Essa campanha tem uma coordenação internacional dos comités nacionais, que acaba de realizar na Suécia uma reunião com 120 pessoas da França, Inglaterra. Irlanda, Escócia, Itália, Espanha (principalmente da Catalunha e do País Basco), Portugal, Suécia, Noruega e África do Sul. Também se propôs criar uma “plataforma sindical pró-palestiniana”, o que é muito importante para permitir o apoio do movimento operário mundial a essa campanha contra Israel e a sua política genocida.
A solidariedade operária
Ainda que a campanha de conjunto seja fundamental para isolar e preparar a derrota de Israel, queremos enfatizar a importância da solidariedade operária, porque permite golpear Israel no intercâmbio comercial internacional e sai muito mais caro a seus aliados imperialistas e às empresas que investem no país manter o apoio ao genocídio praticado pelos sionistas. E também porque tem um sentido de solidariedade da classe operária de grande importância para reconstruir o internacionalismo operário, como fizeram em sua época os movimentos de solidariedade ao povo espanhol contra o franquismo na Guerra Civil Espanhola e contra o apartheid sul-africano.
Por isso, consideramos de extrema importância alguns sucessos recentes da campanha dirigida aos sindicatos tais como:
• A decisão dos sindicatos portuários da Suécia e Noruega de aderir à campanha. Na Suécia, os estivadores não descarregaram por uma semana (o máximo legal) nenhum contentor com produtos israelitas, muitos deles produzidos em condições ilegais (ou seja, nas colónias situadas nos territórios ocupados desde 67). Björn Borg, dirigente do sindicato, prevê repetir o protesto que seu sindicato fez no passado contra o fascismo chileno e o apartheid sul-africano.
• A University and College Union, sindicato que representa cerca de 120 mil professores e empregados de escolas e universidades da Grã-Bretanha, aprovaram sua adesão ao BDS contra Israel, em seu congresso no dia 30 de Maio, em Manchester.
• O Comité Executivo Central do SAMWU (sindicato dos trabalhadores municipais de África do Sul) decidiu, como parte da campanha BDS, impedir qualquer vínculo académico, cultural, desportivo ou de outra índole com Israel e declarou publicamente a sua solidariedade ao povo palestiniano. Neste mesmo país, em Fevereiro passado, os estivadores de Durban recusaram descarregar os contentores de um barco israelita.
• O CFMEU (sindicato australiano dos trabalhadores da construção, mineração e energia) aprovou, em 11 de Maio passado, a sua adesão ao BDS.
• Nos EUA, 800 activistas da comunidade e de sindicatos, convocados pela organização ANSWER, bloquearam as entradas do Porto de Oakland (próximo à cidade de São Francisco, Califórnia) para impulsionar os estivadores a não carregar nem descarregar barcos provenientes ou com destino a Israel. Os membros do International Longshore and Warehouse Union (ILWU, sindicato dos portuários) apoiaram o chamado e participaram do piquete.
Apoiamos e impulsionamos a campanha
A LIT-QI (Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional) expressa a sua adesão a esta campanha. Chamamos as organizações sindicais, sociais, estudantis e populares a organizarem e desenvolverem actividades de boicote a Israel em todo o mundo. Estamos num momento em que é possível desenvolver acções que aumentem o isolamento internacional de Israel e debilitem efectivamente o Estado sionista. Desta forma, também estaremos apoiando e dando força à luta do povo palestiniano.
Isso significa impulsionar a mais ampla unidade de acção de todos os que comunguem com os objectivos da campanha.
É fundamental para isso a unidade com as comunidades árabes e palestinianas de outros países e com todas as correntes que aceitem impulsionar esta iniciativa. Sabemos que é muito importante fazer uma forte campanha para romper o bloqueio de Gaza e que o chamado ao boicote pode atingir Israel. Mas, no marco dessa campanha unitária, alertamos para a necessidade de uma luta bem mais dura, até a derrota definitiva de Israel.
Isso exige a acção de massas em todo o Oriente Médio e no mundo inteiro para destruir esse Estado racista e genocida e recuperar todo o território palestiniano para uma Palestina laica, democrática e não racista. Nesse caminho, o boicote permite mobilizar e gerar uma consciência sobre essa necessidade estratégica e abrir caminho a acções mais de acordo com essa perspectiva.
É necessário mobilizar as massas árabes e muçulmanas para que exijam de seus governos a ruptura com Israel, que o Egipto levante de uma vez e incondicionalmente o bloqueio e todos os países árabes rompam relações com Israel.
Na Europa, é necessário quebrar o apoio que a própria UE e os governos imperialistas dão a Israel. Aqueles governos que enchem a boca falando de “direitos humanos”, mas apoiam sistematicamente o Estado sionista e olham para outro lado frente as suas práticas genocidas. Ou pedem “investigações” que nunca se realizam ou, quando são feitas, Israel não aceita e as ignora, como o parecer do juiz sul-africano Richard Goldstone sobre a invasão de Gaza.
Na América do Sul, os meios de comunicação apresentam o Brasil como supostamente “independente”, mais ainda depois que Lula viajou a Israel impulsionando uma política dita “de paz”. Mas a verdade é que Israel é a única nação fora da área com que os países do Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) têm assinado um Tratado de Livre Comércio (TLC). Desta forma, estes governos (alguns dos quais se dizem de “esquerda”), ainda que façam discursos pela paz, dão sustentação comercial e política a Israel e ajudam a debilitar o seu isolamento internacional, fortalecendo as suas agressões contra o povo palestiniano.
Chamamos a desenvolver uma campanha nestes países para exigir aos governos de Lula, Kirchner, Lugo e Mújica a ruptura imediata das relações diplomáticas e comerciais e do acordo do Mercosul com Israel.
Tal como temos dito, é um momento em que a acção internacional pode ter resultados efectivos no enfraquecimento de Israel. Mãos à obra!
Todo nosso apoio e solidariedade à luta do povo palestiniano!
Pelo fim imediato do criminoso bloqueio a Gaza!
Exijamos aos governos a imediata ruptura de relações diplomáticas e comerciais com Israel!
Impulsionemos uma grande campanha de boicote a Israel em todo o mundo!
Pelo fim do Estado de Israel! Por uma Palestina, laica, democrática e não racista!
LIT-QI