No dia 19 de Abril, uma comissão do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) foi recebida por representantes do governo brasileiro para expor as suas preocupações e reivindicações provocadas pela prisão de 13 activistas durante uma manifestação contra a visita ao Brasil do presidente dos EUA, Barack Obama. Os 13 activistas, sendo nove do PSTU, foram detidos por 72 horas e agora responderão pelos crimes de lesão corporal, dano ao património e tentativa de incêndio, correndo o risco de serem enquadrados na Lei de Segurança Nacional, uma lei da ditadura militar.
Durante o protesto, realizado em frente ao Consulado dos EUA no Rio de Janeiro, em 18 de Março, uma pessoa não identificada, possivelmente um provocador infiltrado, lançou um cocktail molotov em direcção ao consulado, acto que serviu de pretexto para a posterior repressão policial. Como relata o “Manifesto em defesa da democracia, contra a criminalização do direito de manifestação”: “Todos os presos foram encarcerados sem qualquer evidência que permita imputar a cada um deles a autoria do nefasto lançamento de um artefacto durante o mencionado Ato Público. O único elo entre eles e o lançamento do “cocktail molotov” é o fato de eles terem participado da manifestação!Por isso, foi uma prisão arbitrária e ilegal”.
O Manifesto prossegue a afirmar que: “A continuidade do processo criminal é uma ameaça ao direito à livre manifestação política consignado na Constituição Federal. Outros processos envolvendo violência policial em actos políticos no Estado do Rio de Janeiro corroboram que está em curso uma perigosa escalada de criminalização das lutas sociais. Nossa melhor expectativa é que prevaleça os procedimentos democráticos e que os injustamente presos possam gozar plenamente de seus direitos cidadãos, livres dos constrangimentos legais impostos pelo processo penal”.
Assinam o Manifesto, entre outras entidades e personalidades brasileiras: Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Faculdade Nacional de Direito/UFRJ, Associação Brasileira de Imprensa, CSP – Central Sindical e Popular CONLUTAS, Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior, Comissão de Direitos Humanos (Ordem dos Advogados do Brasil/OAB), Grupo Tortura Nunca Mais, Associação dos Juízes pela Democracia, Nilo Batista (advogado e ex-governador do Rio de Janeiro), Fábio Konder Comparato (OAB/SP), Wadih Damous (presidente da OAB/RJ), José Maria de Almeida (presidente Nacional PSTU), Chico Alencar (deputado PSOL-RJ), Janira Rocha (deputada PSOL-RJ), Paulo Ramos (deputado PDT-RJ), Cyro Garcia (presidente PSTU/RJ), Júlia R.S. Farias (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra /MST).
Audiência com o governo
Na audiência, a comissão do PSTU foi recebida pelo ministro da Secretaria Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, que negou haver uma orientação do governo para a prisão dos activistas. Os representantes do PSTU no encontro, José Maria de Almeida, presidente nacional do partido, Cyro Garcia, presidente do partido no Rio de Janeiro, e o advogado José Eduardo Braunschweiger, que, além de fazer parte da direcção regional do PSTU, foi um dos manifestantes presos, e o deputado federal pelo PSOL, Chico Alencar, denunciaram a situação dos detidos, assim como a disposição da Justiça e do governo do Rio de Janeiro manter o processo contra os activistas.
O ministro se comprometeu a analisar medidas em relação ao caso e encaminhar novas audiências, desta vez com o ministro da Justiça e a Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, para analisar encaminhamentos a partir de Brasília.
Está na Internet um abaixo-assinado “Pelo arquivamento do processo criminal contra os 13 do Consulado”, dirigido ao Governo Federal e ao Governo do Estado do Rio de Janeiro. ” Os abaixo-assinados exigem do Governo Federal e do Governo do Estado do Rio de Janeiro o imediato arquivamento do processo criminal preparado contra os 13 manifestantes que foram injustamente presos na noite do dia 18 de Março, durante o protesto pacífico realizado no Consulado dos EUA na cidade, por ocasião da visita de Barack Obama ao Brasil. (http://www.peticaopublica.com.br/?pi=P2011N8248)
Acto reúne 350 pessoas
No dia 31 de Março, quando o golpe militar brasileiro completou 47 anos, foi organizado um acto público para denunciar as prisões dos 13 manifestantes no protesto contra Obama e exigir o fim da criminalização dos movimentos sociais. O acto reuniu 350 pessoas entre activistas, parlamentares e personalidades jurídicas.
As intervenções denunciaram que o que está em jogo não é apenas os 15 processos movidos contra os 13 manifestantes, mas um processo avançado de criminalização dos movimentos sociais e da pobreza. O ex-governador Nilo Batista advertiu que as prisões não são um facto isolado, mas um sintoma do que já vem ocorrendo no país. “O projecto neoliberal não pressupõe apenas a flexibilização das leis trabalhistas, mas a flexibilização das próprias liberdades democráticas, do código penal”, denunciou.
O deputado do PSOL, Chico Alencar, denunciou as arbitrariedades ocorridas nas prisões brasileiras e relatou o seu espanto quando ouviu o relato de um dos 13 presos na manifestação, um jovem menor de idade. O jovem contou-lhe o que se passou no centro de Triagem na Ilha do Governador, onde esteve detido, afirmando que, mais do que o susto da prisão, temeu os gritos de tortura que ouvia.
O histórico advogado Marcelo Cerqueira falou sobre a sua contrariedade de, em plena democracia, ainda ter que ver presos políticos. “Os últimos presos políticos que tivemos foram 13 estudantes em Santa Catarina que xingaram o Figueiredo [último presidente da ditadura militar brasileira]; acreditava que esses seriam os últimos”, disse. Afirmou, ainda, que se deveria processar o director do presídio que mandou raspar a cabeça dos presos que foram para o presídio de Água Santa.
Uma das intervenções mais emocionantes do acto foi feita por Gualberto Tinoco, o Pitéu, um dos presos que permaneceram por 72 horas detidos. Falando pelos demais presos, ele explicou a importância do acto contra a vinda de Obama para denunciar o papel do imperialismo e da subserviência do governo brasileiro e relacionou a repressão à criminalização da pobreza. “Agora, a nossa obrigação, carecas ou não, é de juntar o conjunto da classe para lutar contra isso”, afirmou sendo bastante aplaudido.