Artigo de Victor Amal, Florianópolis, publicado no Esquerda Online
Neste domingo, 9 de setembro, ocorreram as eleições parlamentares da Suécia. As pesquisas apontavam a possibilidade do partido de extrema direita, o Democratas Suecos, ficar em primeiro lugar. Mas ao final, a socialdemocracia conseguiu garantir a liderança, ainda que com sua menor votação em mais de um século. Por conta disso, e do fracionamento entre os partidos de centro-esquerda e centro-direita, o país permanecerá por semanas, ou meses, em estado de indefinição quanto à composição do novo governo.
O contexto: uma breve história
A Suécia tem um regime político de monarquia-parlamentarista, em que o principal posto de poder é o do primeiro-ministro, eleito pelo parlamento.
A Suécia é um dos países, e talvez o principal, em que a socialdemocracia europeia foi mais bem-sucedida. Fundado em 1889, o Partido Social Democrata entrou no governo pela primeira vez em 1917. Posteriormente, permaneceu de forma ininterrupta no poder entre 1932 e 1976. Neste período, a Suécia era um dos países mais avançados da Europa em termos da conquista de direitos democráticos e bem-estar social.
Contudo, após a queda do muro de Berlim, o partido iniciou um processo de declínio. Desde os anos 30, os socialdemocratas sempre conquistavam no mínimo 40% dos votos. Atualmente, a última vez que isso ocorreu foi em 1994, e a cada ano vêm diminuindo cada vez mais sua pontuação.
Nas eleições de 2006 e 2010, foi derrotada pela “Aliança para a Suécia”, uma frente de partidos de direita liberais e conservadores que incluí os Moderados, Centro, Liberais e Cristãos Democratas. Pela primeira vez em um século, o partido ficou fora do governo por 8 anos.
Isto se deveu, em parte, pela adaptação do partido ao neoliberalismo, fortalecido após a queda da União Soviética. Um dos resultados dessa virada foi a entrada da Suécia para a União Europeia (UE), em 1995, cujo efeito foi a redução das políticas de bem-estar social, uma das obrigações que o bloco impõe aos países membros.
Neste período, também, houve o surgimento e fortalecimento de um novo partido de extrema direita com origem em movimentos neonazistas. Fundado em 1988, os Democratas Suecos começaram como um movimento abertamente supremacista branco. Inclusive, o partido foi fundado por pessoas diretamente ligadas ao nazismo sueco, como Gustaf Ekström e Anders Klarström.
Porém, em 1995, os Democratas Suecos começaram um processo de ida ao centro, que acabou se consolidando em 2006 sob a liderança de Jimmie Åkesson, atual candidato a primeiro ministro, que expulsou membros mais diretamente vinculados ao nazismo.
Desde então, os Democratas Suecos passaram a ter uma identidade mais próxima à Frente Nacional, da França, ou ao Partido Popular Dinamarquês, que apesar de serem de extrema direita não defendem (pelo menos abertamente) o supremacismo branco ou o nacionalismo étnico. O resultado foi a entrada do partido no parlamento em 2010 e um crescimento exponencial nas últimas eleições.
Apesar do declínio nas últimas duas décadas, os socialdemocratas voltaram ao poder em 2014 sob a liderança de Stefan Löfven. Este retorno, todavia, não foi suficiente para recuperar a força histórica do partido, que atingiu apenas 31% dos votos.
Além disso, não conseguiram formar uma coalizão de maioria, tendo que recorrer à um governo de minoria – na Suécia, é possível que o partido mais votado faça um governo de minoria conquanto ele consiga que os outros partidos lhe concedam um voto de confiança para aprovar as questões fundamentais de governo, como orçamento ou projetos de defesa.
O resultado eleitoral
Nas eleições deste ano, em primeiro lugar, ficou novamente a Social Democracia com 28,4%. Apesar de manter a liderança, o partido perdeu 2,8% de votos em relação à 2014, confirmando a tendência ao declínio que se iniciou em 2006. Este foi o pior resultado eleitoral social-democrata desde 1914, quando fez 14,5%.
No espectro do “bloco de esquerda” está também o Verdes, que caiu 2,3% de votos e ficou com apenas 4,3%. Já a Esquerda subiu 2,2% em relação às eleições passadas e chegou à 7,9% dos votos. No total, os três partidos fizeram 40,6% dos votos.
A Esquerda surgiu do antigo Partido Comunista, que rompeu com a socialdemocracia em 1917, permanecendo como tal até 1990, às vésperas do fim da União Soviética. Naquele ano o PC mudou de nome para Esquerda, oscilando desde então entre 5% e 12% dos votos.
Já no espectro dos partidos de direita, que formam a “Aliança para a Suécia”, o Moderados, líder da aliança, perdeu 3,5% dos votos em relação à eleição passada e ficou com 19,8%. Apesar de ter sido o partido que mais perdeu votos de 2014 pra cá, permaneceu como segunda força política do país.
Já o Centro cresceu 2,5% e chegou à 8,6% este ano, enquanto os Cristãos Democratas cresceram 1,8% e chegaram a 6,4%. Os Liberais, por sua vez, cresceram apenas 0,1% e permaneceram estáveis com 5,5%. No total, os três partidos fizeram 40,3%.
Em terceiro lugar ficou a extrema direita dos Democratas Suecos, com 17,6%. Apesar de o partido ter sido derrotado, tendo em vista as pesquisas de boca de urna que apontavam um possível primeiro lugar, foram também os que mais cresceram de 2014 pra cá, aumentando em 4,7% de votos.
Isto confirma a tendência de crescimento deste partido que estreou no parlamento em 2010 com 5,7% e, depois, subiu para 12,9% em 2014. Além disso, a paridade entre os blocos de direita e esquerda acabou tornando central o papel de o Democratas Suecos irá cumprir na formação da nova coalizão de governo.
Dificuldades para uma coalizão de governo
Apesar da Social Democracia ter ficado em primeiro lugar nas eleições, é difícil que o partido conseguirá formar uma coalizão de governo. Mesmo os três partidos do bloco de esquerda juntos não têm representação parlamentar suficiente para formar uma coalizão de maioria, ainda que restasse a possibilidade de formar um governo de minoria caso obtivessem o voto de confiança de outros partidos.
Contudo, o ministro Stefan Löfven vem tendo cada vez mais atritos com a Esquerda. Ambos divergem sobre um dos principais temas das eleições, que é o orçamento sueco. Enquanto os social-democratas defendem uma política de austeridade fiscal, apoiada pelo empresariado, a Esquerda se posiciona pela preservação do estado de bem-estar social do país.
Dada a centralidade da política orçamentária para a execução do governo, o ministro Löfven vem demonstrando que não irá negociar com a Esquerda. Além disso, uma aliança com a Esquerda impossibilitaria a Social-Democracia conseguir um acordo com outros partidos de direita, que são a preferência do primeiro ministro.
Segundo, os Moderados e Cristãos Democratas estão tentando convencer o Centro e os Liberais a fazer um acordo com os Democratas Suecos, para que eles concedam um voto de confiança à “Aliança” e lhes habilite a formar um governo de minoria. Ainda não está claro quais seriam as concessões feitas aos Democratas Suecos por este voto.
Também permanece indefinido se os partidos de direita conseguiriam manter sua unidade, dado que o Centro e os Liberais se mostram firmes em seu posicionamento anterior de não fazer qualquer aliança com a extrema direita. Ainda assim, após uma reunião da “Aliança” na terça feira, 11, os partidos informaram que estão em processo de negociação e que um acordo com a Social-Democracia está descartado.
Isto frustrou as esperanças de Löfven em tentar um acordo com o Centro e os Liberais para formar uma coalizão, cenário que ainda não está completamente descartado.
Caso nenhuma destas possibilidades ocorra, é possível que haja de novo um frágil governo de minoria na Suécia, seja da Social Democracia ou do Moderados, apesar de este também ser um cenário improvável. Foi justamente durante os 8 anos em que isso ocorreu que a extrema direita teve sua grande ascensão, aumentando mais de 10% em duas eleições.