Como longamente esperado, Trump retirou o apoio dos EUA ao acordo nuclear assinado em 2015. Segundo este acordo, assinado também por membros da União Europeia, China e Rússia, o Irã limitaria o enriquecimento de urânio no país, e aceitaria a inspeção da ONU em seus estabelecimentos, o que diminuiria suas possibilidades de obter armas nucleares, em troca da suspensão parcial das sanções econômicas que o afetam há décadas.
Em sua campanha presidencial, Trump fez repetidas promessas de denunciar o acordo. No último período, sauditas e israelenses pressionaram para efetivar o rompimento. O primeiro-ministro israelense chegou a divulgar um fantasioso informe sobre o suposto rompimento do acordo nuclear pelo Irã, o que 10 inspeções da ONU, a última em fevereiro deste ano, haviam negado.
Essa ação se soma ao apoio cada vez mais unilateral dado ao regime sionista, com a concretização nos próximos dias da mudança da embaixada americana em Israel para Jerusalém, em um período em que Israel ataca com fogo mortal milhares de manifestantes na fronteira de Gaza, em contagem regressiva para a recordação de 70 anos da Nakba.
Ao mesmo tempo, Trump anunciou o estabelecimento dos “mais altos níveis” de sanções ao Irã e a todos os que seguirem colaborando com o programa nuclear iraniano. A principal dirigente diplomática da União Europeia, Federica Mogherini, anunciou que continuarão apoiando o acordo que “está sendo cumprido” pelo Irã, o que significa também a manutenção dos bilionários negócios e investimentos com o país persa (o comércio da UE com o Irã aumentou de 6 bilhões para quase 20 bilhões de euros de 2013 até o ano passado). O presidente da França, Macron, declarou-se “desapontado” com a decisão, mais ou menos o mesmo tom da primeira-ministra da Grã-Bretanha, Theresa May. Altos dirigentes alemães seguiram na mesma linha.
O presidente do Irã, Hassen Rouhani, declarou, minutos depois do anúncio americano, que tentaria salvar o acordo com os demais signatários, advertiu o país que poderia haver problemas econômicos para os iranianos nos próximos meses e que o Irã poderia voltar rapidamente a enriquecer urânio se o acordo fosse cancelado.
Segundo os informes do Departamento do Tesouro americano, as sanções seriam implementadas em duas fases para “permitir que as companhias se adaptem”: na primeira fase, em agosto deste ano, incluiriam comércio de notas de dólares americanos, ouro e outros metais preciosos, comércio de alumínio, aço, carvão e grafite e sanções ao setor automotor iraniano; a partir de novembro, haverá sanções ao setor de transportes marítimos, exportação de petróleo, sanções ao Banco central do Irã e ao setor de energia do país. Seria o prazo em que haveria negociações entre os EUA e a União Europeia sobre o tema também com o próprio governo iraniano para obter maiores concessões.
Mais além do terreno diplomático, a possibilidade de haver uma nova escalada da Arábia Saudita e Israel contra o Irã e seu aliados na região é bastante alta. Nos últimos meses, Israel tem atacado sistematicamente alvos controlados pelos iranianos na Síria, inclusive a base aérea T4 operada pela Guarda Revolucionária do Irã.
Incapaz de enfrentar em combate aberto as forças israelenses na Síria, o Irã não reagiu a esses ataques, além do nível retórico, provavelmente procurando não dar razões adicionais para a anulação do acordo.
Não coincidentemente, Israel colocou suas forças armadas em alerta e, após o anúncio de Trump, o jornal Haaretz noticiou que houve um ataque a “alvos iranianos” em Damasco.
Abre-se um período de ainda maiores incertezas em uma região com imenso grau de conflitividade, em particular na disputa por áreas de influência na Síria após a vitória de Assad na guerra civil.
Além disso, o fato tem repercussões em outras esferas, pois denunciar um acordo negociado durante anos coloca em risco o resultado das negociações diretas com o regime norte-coreano, que ocorrerão em pouco tempo.
Waldo Mermelstein, São Paulo/SP – Esquerda Online
Foto: Reuters