Texto de resposta a Marisa Matias, eurodeputada do Bloco de Esquerda
Marisa Matias (MM), Eurodeputada e dirigente do Bloco de Esquerda (BE), tem explicado no blog do gabinete do BE no Parlamento Europeu (pauzinho-na-engrenagem.net), “as razões pelas quais não corr[eu] a tirar o tapete ao Syriza”, após o acordo com as instituições europeias que terminou com um pacote de austeridade que ascende aos 13 mil milhões €, para os próximos 3 anos.
A Eurodeputada começa por banalizar o facto de Tsipras ter aceite um acordo repleto de austeridade, referindo que aqui não existe novidade, como se esse tivesse sido o programa do Syriza, aquando das últimas eleições legislativas gregas e como se não tivesse existido qualquer referendo.
Recordemos que, se houve alguma coisa que ficou clara nas últimas eleições legislativas gregas, foi que os gregos estão fartos de austeridade – acabar com a austeridade foi a proposta que conduziu o Syriza ao poder. Como refere MM, e bem, tanto a proposta da UE, como a proposta do governo grego contêm austeridade – em doses massivas.
A proposta em cima da mesa prevê um novo empréstimo de 82 a 86 mil milhões € em troca de um corte de 13 mil milhões €, para os próximos 3 anos; a entrega à Alemanha dos aeroportos, dos portos, daquilo que resta das telecomunicações gregas, nas mãos do Estado, e da empresa de distribuição energética; aumento de impostos na electricidade e restauração; transferência de activos patrimoniais gregos, no valor de 50 mil milhões €, para um novo fundo, gerido em parceria pela Grécia e os seus credores, que servirá, por um lado, de garantia ao cumprimento do novo programa e, por outro, para capitalizar a banca grega.
Tsipras acena ainda com uma reestruturação da dívida grega que está por esclarecer e definir. Segundo o Jornal Público: os credores “aceitam negociar um novo alargamento dos prazos de pagamento e um aumento do prazo de carência. Mas tal apenas acontecerá, depois de uma avaliação positiva da troika em relação à implementação do programa”.
Qual a diferença entre este pacote de austeridade e os demais aplicados na Grécia, nos últimos anos, pelos Governos PASOK e Nova Democracia? Nenhuma. Seriamente, Alexis Tsipras “tirou o tapete” ao povo grego que votou e voltou a votar no “NÃO” à austeridade. De acordo com as palavras de Manolis Glezos, o histórico resistente ao nazismo que se demitiu do Parlamento Europeu na semana passada, eleito como Eurodeputado pelo Syriza, “o fumo branco das negociações em Bruxelas vem das cinzas da Grécia”.
A continuação dos empréstimos à Grécia apenas tem uma consequência: mais austeridade como justificativa para pagar uma dívida insustentável e em crescimento; mais depressão económica; mais destruição de serviços públicos; mais desemprego; mais pobreza para o povo grego e menos soberania. A auditoria à dívida grega foi concluída e apresentada no parlamento, no passado mês de Maio. As conclusões apontam para uma “dívida ilegítima, odiosa, ilegal e insustentável”. Que se avance para a suspensão do seu pagamento e responsabilização dos seus culpados!
Por outro lado, MM limita-se, num outro texto de opinião, a repetir a lengalenga da UE: “deixar a zona euro [é] ter de aplicar uma austeridade muito mais dura”. Igualmente, o Syriza (e a esquerda parlamentar europeia), ao não introduzir um profundo debate sobre o Euro na sociedade grega (e europeia) e ao não preparar a economia grega para a emissão de moeda própria, acorrenta o povo grego (e a periferia europeia) à austeridade. A própria Comissão Europeia e BCE são taxativos: “o Euro é austeridade”.
MM está equivocada e o governo grego capitulou, em toda a linha, às imposições alemãs. É preciso dizê-lo com todas as palavras. Se o governo do Syriza não tinha quaisquer razões para capitular, face ao programa com que foi eleito, essa capitulação ascende a um patamar superior depois do referendo que revelou 61% de “NÃO” à austeridade. Existe alternativa à austeridade e os povos periféricos, mesmo depois de demonstrarem democraticamente as suas decisões, não podem estar à mercê do despotismo de Merkel para continuar a sobreviver.
Este acordo, se fosse apresentado por PSD/CDS-PP ou PS, seria, e bem, alvo das mais pesadas críticas por parte da eurodeputada MM. No entanto, MM acaba mesmo o seu texto aceitando a austeridade como forma de “ir conseguindo libertar espaço de manobra e, caso o consiga, ir matando lentamente a austeridade” (!?). Esta é precisamente a receita dos PS e PSD/CDS-PP, nacionais e europeus, que NÃO tem resultado…
Para finalizar, este é mais um momento da luta de classes em que prevalece o interesse da banca alemã em detrimento das condições de vida dos gregos e demais povos periféricos. Aquilo que a Alemanha não consegue, de momento, impor pela lei da bala, impõe-no pela lei da finança. É disto que gregos, portugueses, espanhóis (etc.) estão fartos!
Todo o apoio à mobilização do povo grego e à Greve da função pública grega para travar a austeridade. Dentro e fora do Syriza ouvem-se críticas ao acordo. Há esperança: caso se tirem lições justas destas semanas conturbadas PODEMOS VENCER! Na Grécia e em Portugal: NÃO, mais austeridade NÃO!
Gil Garcia