“Não admitimos ser mais humilhados!”, este parece ser o sentimento predominante no seio do povo grego. Foi, aliás, este o sentimento, ou seja, o repúdio a mais austeridade, que levou o Syriza ao governo.
O governo grego tem negociado, nos últimos meses, o novo pacote de austeridade com a Comissão Europeia, Banco Central Europeu (“BCE”) e Fundo Monetário Internacional (“FMI”) – a Troika. Este pacote de austeridade traz mais do mesmo: se o governo grego quer manter o financiamento externo da Troika e manter-se no Euro terá de continuar a aplicar os seus planos de empobrecimento e miséria.
Segundo Paul Krugman, Nobel da Economia, a queda de 25% do emprego público, o corte abrupto das pensões, serviços públicos, salários, etc. foram medidas mais que suficientes para eliminar o défice grego e gerar um amplo excedente. Por outras palavras, esta é uma receita de miséria humanitária que não poderá continuar a ser aplicada.
Neste sentido, o governo grego decidiu colocar a referendo o novo pacote de austeridade proposto pela Troika. Será o povo grego a decidir se quer ou não ver aplicado a continuação do saque à Grécia. O povo grego está submetido a uma ignóbil chantagem económica e política da EU e simultaneamente das indecisões do governo do Syriza que tem um claro mandato para recusar taxativamente qualquer medida de austeridade devendo por isso já ter encetado outras alternativas que não um acordo com os credores (que sempre trará mais medidas de austeridade) mesmo que isso implicasse a saída do Euro.
Nas últimas horas desta madrugada, dia 30 de Junho, foi tomada mais uma investida pela Troika: as taxas nos hotéis gregos ficariam pelos 13% e não nos 23% como haviam sido avançadas antes. Como contrapartida, o governo grego teria de fazer campanha pela aplicação do novo pacote de austeridade. Tsipras, primeiro-ministro grego, disse “não”, o referendo vai ser concretizado. Mas o governo grego já tem admitindo um terceiro resgate mesmo que o Não triunfe no próximo domingo o que é de todo inaceitável.
No entanto, não podemos deixar de fazer duas apreciações que consideramos importantes e que alertam para a possível perniciosidade do referendo.
Em primeiro lugar, o governo grego se quer efetivamente uma vitória do Não no referendo, não deve em simultâneo, manter a sua propagada de defesa do Euro. Todo o povo grego sabe (como todos os povos do sul da Europa) que qualquer acordo com os credores no marco do Euro será sempre submetido a ferozes medidas de austeridade. A moeda única foi criada em função da economia Alemã. Esta é a economia que mais beneficia com uma moeda forte e que, por sua vez, vai empobrecendo e destruindo produtivamente a periferia europeia. O Euro tem contribuído, como tem sido analisado por vários economistas a nível internacional, para a contínua destruição produtiva dos países economicamente mais frágeis.
Para além disso, a Alemanha é o mesmo Estado que domina politicamente a Comissão Europeia e o BCE, tanto que a chantagem utilizada tem sido: ou continuam a aplicar austeridade, que a Alemanha, sob a figura da Comissão Europeia e BCE, determina, ou saem da nossa moeda – o Euro. Sob estas condições, o governo grego deveria ter já dado inicio a um amplo debate e preparação para uma saída do Euro. Preparar a população e a sua economia, explicar a necessidade de uma saída do Euro, das vantagens que a autonomia monetária poderá trazer é uma tarefa que o governo grego tem deixado por fazer.
Ora, se a Troika utiliza a chantagem da “saída do Euro” como contrapartida da não aplicação de nova austeridade e se o governo grego não fez o seu trabalho de casa sobre esta questão, poderemos ver um povo forçado a votar “Sim” a uma nova vaga de empobrecimento por ter uma compreensão insuficiente do problema de se manter no Euro. O Euro é equivalente a austeridade permanente – é a própria Troika que o diz. A defesa do Euro por parte de Tsipras e Varoufakis vira-se contra o próprio Não no referendo.
Em segundo lugar, não nos esqueçamos que o governo grego tem plenos poderes para renunciar a mais austeridade. É um governo soberano, de um Estado europeu independente, eleito democraticamente, com um programa que se opunha, em certa medida, à austeridade. Tem mais que legitimidade para colocar um travão ao empobrecimento da sua economia e do seu povo e, portanto, é isso que deverá fazer. A convocação de um referendo quanto à aplicação de nova austeridade assume características de uma certa redundância. Aliás, se o povo grego manifestou e manifesta grandes dúvidas quanto à saída do Euro (uma vez mais devido à injustificada defesa do euro por parte do Syriza), é muito claro quanto ao repúdio à aplicação de mais austeridade – os resultados das últimas eleições são evidentes.
Assim sendo, este referendo pode assumir contornos de um artifício que transpõe para as costas de um povo, sob forte ameaça, a responsabilidade de aplicação de um novo programa de empobrecimento e trazer assim “legitimidade” à efectiva aplicação de mais austeridade.
Nestes termos e tendo sido convocado o referendo, é da máxima importância, para a Grécia e para toda a Europa, que o povo grego volte a vincar o seu repúdio à austeridade e vote “Não” ao novo pacote de humilhação que a Troika está a preparar.
Por fim, neste marco o apelo à abstenção por parte do Partido Comunista grego (KKE) é claramente já uma traição ao povo grego e entrega a Grécia nos braços da Alemanha.
O MAS é:
– Pelo Não no referendo de domingo;
-Pela exigência ao Syriza de que deve recusar qualquer novo acordo ou resgate porque trará novas e violentas medidas de austeridade;
-Pela exigência de que o governo grego tome a iniciativa de emissão de moeda própria, rompa com os credores, suspenda o pagamento da colossal dívida pública (que não é da responsabilidade do povo grego) e inicie um plano económico de crescimento que gere emprego e proteja as pensões.
O CE do MAS
Lisboa, 02/07/2015