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Direita capitaliza desgaste do Governo PS e ausência de oposição à esquerda

As eleições regionais têm sempre as suas particularidades, pelo que devemos manter o cuidado com as extrapolações dos seus resultados e leituras políticas para o âmbito nacional. No entanto, é evidente que as tendências políticas nacionais se expressaram no contexto regional.

Quanto aos resultados eleitorais açorianos, deixou de existir uma maioria absoluta de algum dos partidos que tradicionalmente se alternavam no poder: PS ou PSD. O PS (39,13%) ganha as eleições com folga, mas perde cerca de 2.500 votos e a maioria absoluta que mantinha há 24 anos. O PSD (33,74%), mesmo conquistando mais 6.300 votos, não consegue debelar a crise que atravessa e chegar a partido mais votado.

Esta é uma situação semelhante, mas inversa, às eleições nacionais que deram origem à “Geringonça”, em 2015: o partido a governar deixa de o conseguir fazer com maioria absoluta e o líder da oposição não o consegue substituir ou sequer arrecadar mais votos. Os sinais de desgaste do regime e o declínio dos grandes partidos que nos têm governado nos últimos 46 anos parecem ter chegado aos Açores. O PS parece sofrer com algum do descontentamento face à sua governação regional e face ao Governo Costa, mas a crise e a reordenação da direita tradicional não lhe permitem conquistar uma vitória cabal.

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Resultados das Eleições nos Açores, 2020

Ainda assim, existe um outro elemento, pois PS e PSD, em conjunto, acabam por arrecadar mais 3.700 votos que em 2016. Um centrão com mais votos mas em que nenhum dos partidos que o compõem consegue governar em maioria, pode ser um sinal de uma maior polarização social, elemento que também se tem feito sentir a nível nacional.

À esquerda, o BE (3,81%) conquista mais cerca de 550 votos e faz uma festa desproporcional, o que só denota nervosismo, sobretudo se considerarmos que o descontentamento com a governação do PS está a ser capitalizado, em grande medida, pelo Chega (5,06%), uma vez que a oposição à esquerda se tem demitido da sua tarefa. A CDU (1,68%) continua a pagar caro os acordos com o PS dos últimos 5 anos e perde a representação parlamentar que tinha. Em conjunto, BE e PCP mantêm a sua votação relativamente estável, mas o PCP é duramente castigado, como já tinha acontecido a nível nacional.

Tal como a nível nacional, à excepção do Livre, os novos partidos com representação parlamentar conseguiram conquistar lugares na Assembleia Regional dos Açores. O Chega conquista 5.260 votos e 2 deputados, o IL (1,93%) alcança 2.012 votos e 1 deputado e o PAN (1,93%) reforça a sua votação em 672 votos e consegue 1 deputado. O CDS-PP (5,51%) perde 940 votos e perde um deputado mas mantém-se como o terceiro partido mais votado.

Por fim, ainda que a abstenção tenha alcançado os 54,6%, a participação eleitoral aumentou em mais 10.820 eleitores, que terão contribuído, sobretudo, para o reforço dos votos na direita e extrema-direita.

Destes resultados, destacamos que, com a esquerda, a nível nacional, nos últimos 5 anos, atrelada ao PS, quem capitalizou o desgaste com a governação regional do PS foi a direita e extrema-direita.

É possível que, nos Açores, o PS tenha sofrido um desgaste acrescido nos últimos meses. Uma vez que os Açores são uma das regiões menos afectadas pela pandemia, boa parte dos açorianos pode ter visto as medidas de confinamento do início do ano como completamente despropositadas, o que aliado às tendências “negacionistas da pandemia” de parte da direita e extrema-direita pode ter ajudado a capitalizar os mais desavindos. No entanto, devemos ter em consideração que as eleições regionais têm muito em comum com as eleições autárquicas e que que o peso das figuras e dos clientelismos locais são determinantes. Só isso explica que, por exemplo, o Partido Monárquico eleja um deputado nos Açores, há anos, na ilha do Corvo.

Ainda está em aberto o que poderá vir a acontecer na governação do Açores. Colocam-se dois cenários possíveis: ou a conformação de um governo regional de direita e extrema-direita, composto pela aliança entre PSD/CDS-PP/IL/PPM/Chega/PAN, para somar uma maioria de 29 deputados, ou, eventualmente, eleições antecipadas, sendo o primeiro o cenário mais provável.

André Ventura, do Chega, como é costume, já voltou atrás com a sua palavra. A ameaça de impossibilidade de formar governo com os partidos do regime já deu lugar a um conjunto de condicionantes para viabilizar um Governo do PSD, nos Açores. E o PAN, sem critério político ou coerência programática, parece estar disponível para qualquer tipo de governo. O porta-voz do PAN na região autónoma, Pedro Neves, garante estar disponível para dialogar com toda a gente. Desta forma, tudo sevai alinhando para a conformação de uma “Geringonça” à direita na região dos Açores.

Ainda que os Açores não sejam determinantes para influenciar a situação política nacional, ou BE e PCP rompem com o PS e assumem um papel de oposição efectiva, ou os resultados açorianos podem vir a ser um pronúncio do futuro nacional.

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