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25 de Abril, Sempre!

Editorial – 20 de Abril de 2020

Há quem veja na crise de saúde pública que atravessamos, a oportunidade perfeita para nem assinalarmos – repetimos, nem assinalarmos – o 25 de Abril.

Dia em que o povo português, no ano de 1974, arrancou a sua liberdade política a uma ditadura que se perpetuou no poder por 48 anos, os últimos 13 dos quais marcados por uma sangrenta guerra contra a emancipação dos povos das ex-colónias. Pela mesma ordem de razão, o 1 de Maio, o Dia Internacional dos Trabalhadores, segundo aquelas mesmas personagens, deverá ser igualmente silenciado.

O 25 de Abril de 1974 foi a data em que o povo português colocou em marcha uma revolução, através da qual fundou os meios que lhe permitissem cumprir um sonho. O sonho de um povo para acabar com uma guerra colonial interminável; o sonho por acesso a um serviço de saúde que, por exemplo, combatesse a gigantesca mortalidade infantil; o sonho de ter acesso a uma educação universal, erradicando o analfabetismo generalizado; o sonho de ter acesso a uma habitação; o sonho de se poder deslocar em transportes de qualidade, dentro do país e para o estrangeiro; o sonho de expressar as suas opiniões políticas; o sonho de construir um regime e uma economia ao serviço das necessidades do povo e não dos benefícios e lucros de uma elite; o sonho de ter direito a um salário e condições de trabalho dignas; o sonho de conseguir fazer planos para a sua vida e para a vida dos seus filhos.

É evidente que, pelo risco de contágio da pandemia de COVID-19 que atravessamos, não se poderão juntar milhares de pessoas nas ruas. Noutras condições, essa seria a comemoração adequada. O parlamento aprovou, por maioria, a realização das suas cerimónias alusivas ao 25 de Abril, com as devidas regras de segurança, conforme, aliás, já tem sido o seu funcionamento nas últimas semanas de confinamento.

No entanto, à direita e extrema-direita, sem espanto, há quem calce as botas cardadas para, a cavalo da pandemia, tentar espezinhar o significado do 25 de Abril e do 1 de Maio, exigindo o maior esvaziamento possível destas datas.

O CDS-PP, partido que votou contra a criação do SNS público, em 1979, propôs que o 25 de Abril, este ano, fosse assinalado com uma mera mensagem do Presidente da República. O Iniciativa Liberal e o Chega, partidos que têm feito questão de publicamente enaltecer, não o 25 de Abril, mas, sim, o 25 de Novembro, que defendem a privatização completa do SNS ou da Escola pública, vão no mesmo sentido do CDS-PP. Limitar, reduzir, se possível impedir, tratando o 25 de Abril como uma ingénua “festividade”.

É simplesmente ridículo, pois esta direita bafienta é a mesma que exige que a “economia regresse à normalidade”, o mais breve possível, colocando milhares de trabalhadores em contacto físico. André Ventura, por exemplo, no início do confinamento, exigia que o parlamento não parasse os seus trabalhos, apelidando de “cobardes” aqueles que aderiam à quarentena voluntária. Hoje, exige que o parlamento coloque o 25 de Abril de quarentena. O mesmo André Ventura que, no início da pandemia, decidiu oportunisticamente distribuir produtos em lares de idosos, apelando ao rompimento da quarentena, hoje é favorável a que a quarentena se aplique, o mais rigorosamente possível, mas apenas sobre o 25 de Abril. Os mordomos do lucro, sempre servis às elites, aproveitam qualquer circunstância para dividir os trabalhadores sobre questões que apenas a eles interessam. Não podemos deixar de recordar que estes são parte dos filhos e netos do regime autoritário que o 25 de Abril derrubou.

Aquele sonho, personificado, em Portugal, pelo 25 de Abril de 1974, não morreu mas ficou por cumprir. E hoje, 46 anos após aquele dia, voltamos a atravessar um período em que a democracia está fragilizada. Não só em Portugal, com o Governo PS e a ajuda da direita, da extrema-direita e da esquerda parlamentar, mas um pouco por toda a Europa, um pouco por todo o mundo, com os mais diversos governos determinados a atropelá-la, musculando os seus regimes e aparelhos de estado, através de decretos de Estados de Emergência com o objectivo de emudecer a contestação, calar o descontentamento e até prevenir possíveis revoltas.

Não estamos todos do mesmo lado e esta “guerra” não é assim tão diferente daquela que vivíamos antes da pandemia. Se estamos todos no mesmo barco, há quem não consiga livrar-se dos grilhões que os mantêm acorrentados ao porão. Já se começa a perceber que os mais afectados pela COVID-19 são os mais pobres e oprimidas. Já se começa a perceber que os mais afectados pela crise económica que se segue serão os trabalhadores e trabalhadoras, sem emprego, sem rendimentos, sem escapatória.

Se existe momento em que o 25 de Abril e a democracia tem de ser defendida, vincando o seu papel, é este, pois é demasiado nítido que a elite parasita que nos tem governado se move para prescindir dela. Somos da opinião que as comemorações, mantendo todos os cuidados de segurança e higiene, deveriam não só ser feitas no parlamento, mas ser igualmente alvo de eventos organizados pelo povo e suas organizações, recorrendo inevitavelmente ao seu caracter simbólico para evitar ajuntamentos em tempos de pandemia.

Para finalizar, uma última palavra em homenagem a José Mário Branco, uma das vozes da revolução, pois este será o primeiro 25 de Abril sem a sua presença. Neste 25 de Abril, mantenhamo-nos, acima de tudo, inquietos.

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