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O estranho caso do Podemos, partido da esquerda espanhola, que elogia a direita portuguesa (?!)

O Podemos acaba de conformar, nos últimos meses, uma espécie de Geringonça espanhola com o PSOE, o partido irmão do PS português.

Daquilo que conhecemos, dos últimos 4 anos de Geringonça portuguesa, este é um tipo de governação que não tem qualquer pudor em injectar milhares de milhões públicos na banca, defendendo, acima de tudo, os interesses dos mercados e dos grandes grupos económicos e financeiros; que não reverte a destruição do serviços públicos a que os países periféricos foram sujeitos pela Troika e pela direita; que não recupera qualquer direito laboral que nos foi retirado e cujo combate à precariedade é uma mera ilusão; cujos direitos mais básicos à habitação, à saúde ou a transportes públicos de qualidade é uma miragem; uma governação para a qual os ditames da UE são para cumprir. Esta é uma governação que ilude quem trabalha, com muitas mas parcas medidas, em busca de apaziguar o descontentamento popular, para, acima de tudo, defende os interesses das elites e dos poderosos.

Daí que o Podemos espanhol, defensor acérrimo deste tipo de conciliação com os poderosos, não veja qualquer problema em elogiar a direita portuguesa, ao invés de denunciar a sua hipocrisia1. A mesma direita que, ainda ontem, no Parlamento português, se juntou ao PS e barrou as limitações aos juros e benefícios que a banca portuguesa está a praticar sobre os empréstimos às PME.

BE, PCP, PAN e, mais recentemente, JKM têm cumprido um papel semelhante ao Podemos. São, aliás, a inspiração do congénere espanhol. Ao ajudarem a aprovar os sucessivos Orçamentos do Estado do PS, ao ajudarem a implementar um desnecessário Estado de Emergência, em Portugal, limitando direitos, liberdades e garantias, permitido o recurso indiscriminado ao layoff que apenas traz despedimentos e rebaixamento de salários, demitem-se do papel de defender todos aqueles e aquelas que vivem do seu trabalho.

O mesmo podemos dizer da esquerda parlamentar grega, na figura do Syriza, cuja governação, mesmo contrariando o referendo interno contra a austeridade, se caracterizou pela conciliação com a UE e pela aplicação de mais e mais austeridade. Esta governação do Syriza apenas serviu para abrir portas para a actual governação da direita, com novos ataques sobre o povo grego.

Em Itália, este mesmo tipo de erros da esquerda tradicional, nas últimas décadas, reduziu-a à insignificância. A Itália tem sido governada, nos últimos anos, por direita mais moderada ou direita mais reacionária, sempre em função dos interesses dos poderosos. Hoje é governada por uma coligação entre um movimento populista (5 estrelas) e um partido de centro, semelhante ao PS português. De qualquer forma, tal é a crise da esquerda tradicional italiana que é a extrema-direita reaccionária, de Salvini, que domina as intenções de voto.

Bernie Sanders, nos EUA, que vinha a gerar um importante movimento pela esquerda, ainda que dentro do Partido Democrata, crítico às elites, acaba de desistir da sua candidatura, empurrando o apoio popular conquistado, não para uma alternativa dos trabalhadores, fora do Partido Democrata, mas para o apoio a mais um candidato do stablishment dos EUA, Joe Biden.

A esquerda parlamentar, a nível mundial, tem desempenhado um mau serviço aos interesses do povo, que diz defender. Tem servido para branquear aquilo que é o papel nefasto dos partidos socialistas e seus congéneres, pela Europa fora. É desta forma que partidos como o PS ou o PSOE conseguem recuperar alguma da influência política que a última década de austeridade, aplicada também por estes partidos, tinha destruído.

Mas mais perigoso e preocupante, é través desta conciliação e branqueamento que a esquerda parlamentar, vai sendo domesticada e integrada no sistema de vantagens e benefícios das elites, abrindo espaço à oposição da extrema-direita reaccionária. É preciso uma esquerda alternativa. Uma esquerda comprometida com os interesses da maioria em oposição aos benefícios e privilégios das elites. Uma esquerda comprometida com a defesa da vida, dos rendimentos e dos salários de todos os trabalhadores, micro-empresas e PME.

 

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