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“O movimento está num ponto crítico” – palavras de Hong Kong

Depois de quase dois meses de protestos, o movimento de massas de Hong Kong chegou a um momento crítico: o movimento prepara-se para iniciar grandes greves unificadas depois dos protestos de 2 de agosto.

Cerca de 96 sindicatos que integram a Confederação de Sindicatos de Hong Kong anunciaram o seu apoio à greve unificada. Trabalhadores da Hong Kong Airlines e da Cathay Pacific; assistentes sociais; professores universitários e funcionários da Radio Television, em Hong Kong, também já decidiram aderir a greve.

Esta tentativa de uma greve política é muito significativa – evento que se assemelha somente com as ondas de resistência contra o domínio colonial britânico em 1967. Ocorre num momento em que as crises da classe dominante começam a aparecer mais.

O Partido Liberal, um grande partido empresarial, que apoia o regime chinês, foi forçado a pedir a renúncia da diretora executiva de Hong Kong, Carrie Lam. A executiva-chefe nomeada pela China, define Hong Kong como uma “região administrativa especial”.

Os liberais também saíram a favor de uma investigação independente sobre a violência policial no final de junho. Isto é ecoado pelas organizações patronais, pela Câmara Geral de Comércio de Hong Kong e pela Câmara de Comércio Internacional. Este é o resultado das mobilizações.

Um comício, convocado por funcionários públicos de base, fez com que 40.000 pessoas fossem às ruas em 2 de agosto. Ainda assim, Carrie Lam continua a recusar abolir totalmente a lei de extradição, que por agora está suspensa. A lei draconiana, que desencadeou os protestos desde junho, tornaria mais fácil para o regime chinês extraditar pessoas.

No entanto, enquanto diferenças claras estão a surgir dentro do governo, elas não alcançaram ainda o seu ponto mais alto. Os protestos espalharam-se em todos os distritos de Hong Kong. Desde o início dos protestos de julho, ocorreram manifestações e barricadas em Tsim Sha Tsui, Sheung Shui, Tuen Mun, Sha Tin, Yuen Long, Tseung Kwan O e Sheung Wan.

O número de participantes foi de entre dezenas de milhares a 200.000 pessoas.

Os manifestantes apresentaram cinco grandes reivindicações . A primeira diz respeito ao governo retirar completamente o projeto de extradição. A segunda refere-se a que a polícia páre de dizer que os protestos de 12 de junho foram tumultos e distúrbios. A terceira é sobre a liberação incondicional de todos os manifestantes presos. A quarta uma investigação independente sobre o “comportamento” dos policiais e a quinta por maiores direitos democráticos, com uma demanda por sufrágio universal e a eleição democrática dos líderes do território.

O governo de Hong Kong espera desacreditar os manifestantes intitulando os protestos como apenas um grande movimento de arruaceiros. Ao fazer isso, espera recuperar alguma popularidade entre as massas, perdida nos últimos tempos.

Mas, apesar de seus melhores esforços, a opinião pública não foi significativamente revertida. Pelo contrário, o óbvio conluio da polícia com o crime organizado despertou mais raiva entre as pessoas comuns. Um desses incidentes ocorreu em Yuen Long, uma cidade no distrito de Novos Territórios (região de Hong Kong, não incluindo as ilhas de Hong Kong, Kowloon e Stonecutters Island, nota do tradutor – NdT) na noite de 21 de junho. Cerca de 300 pessoas, pertencentes as gangues criminosas da Tríade (uma das famosas organizações criminosas chinesas com sede em Hong Kong, NdT) – entraram na estação do metro e atacaram indiscriminadamente os manifestantes e o público em geral. A polícia deliberadamente não tomou nenhuma atitude, permitindo que um grande número de pessoas sofressem ferimentos.

Na mesma noite, o político Kwan-yiu Junius Ho foi filmado apoiando os gangsters. Ele disse a uma multidão deles: “Todos vocês são meus heróis” e deu um sinal de positivo. As gangues da Tríade são controladas diretamente pelos latifundiários dos Novos Territórios, que são uma camada privilegiada do tempo do domínio colonial britânico.

 

Regime

Desde que Hong Kong foi devolvido à China em 1997, o regime chinês usou os gangues para os seus próprios fins. Alega que é a espinha dorsal das forças “patrióticas e amantes de Hong Kong”.

Esse tipo de violência patrocinada pelo Estado não deteve os manifestantes. Seis dias após o ataque de Yuen Long, mais de 200 mil pessoas tomaram as ruas, desafiando a proibição da polícia. Os manifestantes montaram piquetes de autodefesa para se protegerem de novos ataques.

Alguns manifestantes da vanguarda perceberam que precisam de se unir com as massas no continente chinês. Eles distribuem panfletos para turistas da China continental para explicar o propósito e a importância do movimento de massas. No entanto, também existem fragilidades. Os manifestantes são facilmente tentados pela polícia a atacar edifícios sensíveis, incorrendo em maior repressão. Há também uma ameaça da extrema direita.

Manifestantes individuais picharam “Chink” (uma expressão pejorativa usada para os imigrantes chineses), do lado de fora do prédio do Gabinete do Governo. Desde meados de julho, o slogan “Libertar Hong Kong – revolução dos nossos tempos” tornou-se popular entre os manifestantes. O slogan foi derivado do grupo político de extrema direita Hong Kong Indigenous.

O uso do slogan pelo grupo implica fortemente uma forma de “discriminação étnica” contra residentes da China continental e novos imigrantes da China. Mas, no momento, não está claro como a maioria dos jovens que adotam esse slogan interpreta seu significado.

Enquanto isso, o regime do Partido Comunista Chinês (PCC) está apoiando Carrie Lam e a força policial ao máximo. Eles querem que o governo de Hong Kong comece a rejeitar alguns pedidos de protestos e a reforçar a repressão policial dos manifestantes mais radicais.

A menos que a polícia de Hong Kong não consiga mais controlar a situação por si só, é improvável que o regime envie o exército. Isso levanta questões sobre como levar o movimento adiante.

A esquerda socialista em Hong Kong, que não está alinhada com o regime do PCC, apoia totalmente as greves políticas e exige que as demandas sociais e económicas sejam incluídas como parte das reivindicações dos grevistas.

A greve do início de agosto foi apenas uma tentativa inicial. Uma greve geral e mais longa será lançada no futuro. Ao mesmo tempo, manifestantes, sindicatos, associações estudantis e movimentos sociais devem se unir em um comité de ação conjunta para liderar a luta. Através do comité de ação, o poder dos trabalhadores e dos movimentos poderão ser convergentes. Isso estabeleceria a auto-organização das massas que pode pôr em xeque o poder da classe dominante.

 

Lam Chi Leung, de Hong Kong

Artigo originalmente publicado em Socialist Worker

Tradução: Rogério Freitas, EsquerdaOnline.com.br

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