Todos sabemos nos dias de hoje que as maiores catástrofes ambientais e de destruição de natureza e fauna se deve, em grande medida, ao capitalismo selvagem que impera no mundo onde a procura desenfreada do lucro é o alfa e o ómega das grandes multinacionais em conluio com os governos que nos (des)governam.
O desaparecimento de inúmeras espécies tem muito que ver com grandes negócios e o desprezo puro e simples por tudo e todos que não seja a contabilidade de milhões dos 1% de poderosos e bilionários contra os 99% da população mundial. No caso de Portugal também temos inúmeros exemplos. O desprezo face a parques naturais e as espécies protegidas, por exemplo. Ora vejamos um caso bem aqui à nossa porta.
Recentemente foi anunciada a realização das denominadas “I Jornadas Internacionais Sustentabilidade Económica dos Espaços Ordenados e Protegidos” baseando-se na falsa premissa de uma “vocação cinegética do Parque Nacional da Peneda-Gerês”. Estas jornadas estão agendadas para os dias 13 e 14 de Abril nos Arcos de Valdevez.
O evento é apoiado organizado pelo Clube Nacional de Monteiros e pelo Safari Clube Internacional – Lusitanea Chapter, com o apoio do Ministério do Ambiente, da Câmara Municipal dos Arcos de Valdevez, da Região de Turismo Porto e Norte, do ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e da ARDAL – Associação Regional de Desenvolvimento do Alto Lima.
Como em todas as actividades que envolvem a utilização, maltrato e morte de animais, e num país onde as dificuldades económicas e financeiras estão sempre na ordem do dia, o tema da sustentabilidade económica surge para disfarçar o verdadeiro objectivo deste evento, isto é abrir os espaços do nosso único parque nacional aos disparos das armas cujas miras apontam àquele que nos nossos dias é quase o símbolo por excelência da Peneda-Gerês, a cabra selvagem.
Extinta em finais do Século XIX devida à caça, a cabra selvagem repovoa agora as serranias de muitas zonas na Peneda-Gerês em resultado de uma «reintrodução» ocorrida nos anos 90. Para quem caminha pelas montanhas da Serra do Gerês ou da Serra Amarela, o verdadeiro prémio do dia é o avistamento emblemático destes animais em liberdade.
O próprio ICNF define Parque Nacional como “…uma área que contenha maioritariamente amostras representativas de regiões naturais características, de paisagens naturais e humanizadas, de elementos de biodiversidade e de geossítios, com valor científico, ecológico ou educativo. A classificação de um Parque Nacional visa a proteção dos valores naturais existentes, conservando a integridade dos ecossistemas, tanto ao nível dos elementos constituintes como dos inerentes processos ecológicos, e a adoção de medidas compatíveis com os objetivos da sua classificação.”
Um parque nacional jamais pode ser uma coutada de caça grossa, tal como estas jornadas pretendem promover, principalmente numa altura em que o sistema ecológico ainda não se reequilibrou.
Há já muito tempo que correm rumores de que as cabras selvagens são caçadas na Serra do Gerês por gente que é transportada de helicóptero, gente esta ligada às esferas mais altas do Estado (juízes, secretários de estado, etc.) e que usam as serranias geresianas para os seus devaneios sanguinários onde a morte sádica e somente por puro divertimento ocupa um lugar central.
Os artigos publicados na revista “Caça & cães de caça” na sua edição de Outubro de 2016, mostram (“A cabra-montês no Gerês – Poderemos vir a caçá-la?” e “O potencial da cabra-montês do Gerês”) as intenções desta gente sem escrúpulos pertencente ao denominado SCI Lusitania Chapter (Safari Club International) que somente se interessa pela vida selvagem como uma forma de satisfazer o seu prazer da morte. Este clube tem vindo a promover caçadas ao leopardo no Zimbábue, e a leões e rinocerontes na África do Sul.
Devido às denúncias e protestos levados a cabo por inúmeras pessoas, o evento nos Arcos de Valdevez acabou por ser suspenso «por razões técnicas» mas não podemos deixar de estar atentos a estes movimentos que querem transformar o nosso único Parque Nacional numa coutada de caça à cabra selvagem para os mais ricos e cruéis.
Cabe aqui chamar à atenção do nosso governo tido como um governo de esquerda (que não é a nossa opinião), de geringonça, com o apoio continuado do BE e do PCP e até de um partido supostamente de apoio aos animais (o PAN), como é possível que permitam a organização de eventos de caça a uma espécie protegida em pleno Parque natural protegido? Cabe exigir ao governo acabar de vez com este tipo de caçadas disfarçadas.
Rui Barbosa e Gil Garcia