O navio Alan Kurdi está há vários dias ao largo do Mediterrâneo, sem ter autorização para atracar em qualquer porto europeu. Itália e Malta já negaram a autorização e os 80 tripulantes agonizam. Faltam víveres e só não estão já a passar necessidades básicas porque um outro navio transferiu comida para o Alan Kurdi.
O motivo desta situação é a “carga” do navio. Ele não transporta lixo tóxico, nem armas, nem droga. Ele transporta seres humanos. Seres humanos de pele negra, de países africanos. Seres humanos pobres, de países como a Líbia ou a Nigéria. Seres humanos que fogem da fome, da guerra, da escravatura e das violações que as potências imperialistas, nomeadamente, as europeias têm secularmente infligido àqueles países. Seres humanos a quem a Europa vira as costas. Fossem estes seres humanos bancos a fugir à falência – como constantemente tem acontecido pela Europa – e o resgate da UE seria imediato.
O navio Alan Kurdi chama-se assim em homenagem ao bébé sírio que se afogou, enquanto fugia com a família para a Europa, em 2017, e cujas imagens chocaram o mundo. Chocaram o mundo por pouco tempo, diga-se. Merkel rapidamente abandonou a política de acolhimento de refugiados e migrantes e os partidos nacionalistas de extrema-direita, autoritários e racistas, vão-se aproximando do poder, por toda a Europa. A comoção deu lugar ao cinismo e à morte. Ano após ano, centenas de refugiados morrem no fundo do mar, apenas por serem pobres, negros e terem de fugir de países arrasados pela guerra e as alterações climáticas, causadas não por eles mas pelas grandes potências europeias e os EUA.
O navio Alan Kurdi pertence à ONG Sea-Eye e dedica-se a resgatar refugiados que, de outra forma, acabariam vítimas de trágicos naufrágios. A bordo do navio estão 64 refugiados. “Há problemas em todo o lado, não há ajuda. Muitas pessoas morrem na Líbia, muita gente fica ferida na Líbia. Foi então que decidi seguir para a Europa (…) Não havia outra opção. Só precisamos de ajuda. Por favor, ajudem-nos”, diz Evans, uma das tripulantes. Ela foge da barbárie, da escravatura que reina nas costas líbias. “Na Líbia vendiam as raparigas e tomavam conta de uma casa [uma espécie de bordel]. Mandaram-nos fazer coisas que não vos passam pela cabeça. Mandaram-nos dormir com homens e, se recusássemos, batiam-nos ou espetavam-nos facas. Quando me levaram para essa casa recusei fazer o que me pediram, espetaram-me uma faca”, conta ao Expresso.
Exigimos que o Governo português autorize que o Alan Kurdi atraque em Portugal!
O nosso país tem responsabilidade. Portugal apoiou a coligação internacional que bombardeou a Líbia, em 2011. Tal como os governos da época foram apoiantes entusiastas das guerras no Iraque e no Afeganistão. As tropas portuguesas estão, hoje, na República Democrática do Congo. Após 500 anos de espoliação e escravatura, Portugal continua na linha da frente da exploração do continente africano.
Escondido e silencioso, atrás das bravatas racistas de Governos como o de Salvini, o Governo de António Costa assobia para o lado. Exigimos que o PS, cujo governo é apoiado por BE e PCP, não tenha a mesma política que a extrema-direita. A política de empurrar seres humanos, que procuram fugir à pobreza, guerra e espoliação, para a morte por afogamento ou em “campos de detenção”, não nos serve. Ninguém é ilegal!
Exigimos que seja dada autorização para atracar em Portugal. Exigimos que seja dado asilo aos seus 64 tripulantes refugiados. Portugal não pode ter a porta aberta ao turismo e aos vistos Gold e não aos seres humanos, vítimas da guerra e da fome. Não podemos continuar a gastar milhões a salvar bancos que afundam o país e não investir uns míseros tostões a salvar seres humanos que se afundam no Mediterrâneo.
Ninguém é ilegal!
Abaixo a Europa Fortaleza!
Salvemos o Alan Kurdi!