O colonialismo, a pobreza e o racismo a que são jogados milhões de seres humanos, particularmente aqueles que vivem à margem do centro capitalista, potencia as tragédias como a ocorrida em Moçambique, neste mês de Março.
Se, por um lado, é evidente que assistimos a uma alteração das condições climáticas do planeta, por outro, é igualmente percetível que muitas das suas consequências poderiam ser facilmente minoradas. As dificuldades que os países africanos têm em combater as consequências de tragédias do género residem hoje, não apenas na corrupção desenfreada dos seus governos nacionais, mas também na posição que ocupam no sistema capitalista mundial. O caso de Moçambique é paradigmático. Subjugado, durante séculos, pelo colonialismo português, continua, após a “independência”, a sofrer das novas regras do imperialismo, particularmente do neocolonialismo.
Apesar da extorsão, humilhação e violação imposta por 500 anos de colonialismo – e da miséria e escravatura associados –, Moçambique continua dependente e subjugado. É-lhe exigido o pagamento integral de uma dívida “pública” que, no final de 2018, já representava mais de 100% do PIB. Alguns meses antes da tragédia, a agência financeira Fitch calculava que a dívida chegaria a 119% já em 2022. Depois do ciclone Idai, as perspetivas são piores ainda.
A corrupção, dependência e colonização do continente africano pelos países imperialistas, empurra os seus povos para a pobreza e miséria totais. Sem direito a Saúde, Educação, Transportes ou Habitação de qualidade, estes povos continuam a viver na miséria, de uma agricultura de subsistência. Sim, Portugal tem responsabilidade direta na tragédia de Moçambique.
Note-se ainda que as alterações climáticas são especialmente “patrocinadas” pelos países ricos e industrializados. De acordo com os dados mais recentes, em média, um norte-americano “tem um impacto climático equivalente a 55 moçambicanos”. ([1])
Isso não significa, no entanto, que a responsabilidade pela crise climática recaia sobre o trabalhador comum norte-americano ou europeu. Pelo contrário, deve-se ter sempre em conta que o capitalismo é um modo de produção (internacional) e não um modo de consumo (individual). A classe dominante não aceita a mínima regulação. Ela deve ser obrigada, pela mobilização, a indemnizar as vítimas da crise climática, neste caso, o povo moçambicano, e a pagar a transição energética. O primeiro passo dessa transição será a expropriação dos sectores estratégicos nas mãos das elites cujos lucros dependem, direta ou indiretamente, da exploração petrolífera.
Esta é uma exigência direta ao Governo português mas que é extensível ao nível da UE e a nível mundial. Costa tem estado empenhado na exploração petrolífera, incentivando a prospeção da nossa costa e território por empresas petrolíferas nacionais e estrangeiras. O lugar dos fósseis é no subsolo. Aquilo que precisamos é da renacionalização de todos os setores estratégicos, entre os quais se inclui o energético, como forma de investir na imediata e total transição energética.
Ao compasso das mobilizações, ganham corpo programas concretos de transição energética, assentes na criação de milhares de empregos. Para que o planeta não se transforme na grande tragédia de Moçambique, precisamos da transição energética já.
Nota
(1) Alexandre Costa, «O nome não é “Ajuda Humanitária”. É Dívida Climática!», https://esquerdaonline.com.br/2019/03/25/o-nome-nao-e-ajuda-humanitaria-e-divida-climatica/