O resultado das eleições que ocorreram neste domingo (02) para o parlamento da Andaluzia, em Espanha, surpreendeu todos que conhecem a política da região por dois motivos: ao mesmo tempo que a esquerda, em seus mais variados partidos, sofreu uma forte derrota, num estado com forte tradição progressista, um novo partido de extrema direita – VOX – entra com relativa importância no parlamento andaluz.
O PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol), que governa o estado há 36 anos, sofreu a maior derrota eleitoral desde então.
Apesar de ter ficado em primeiro lugar, com 28% dos votos, perdeu quase 12% em relação à eleição passada, ocorrida em 2015. Portanto, obteve apenas 33 cadeiras de um total de 109, 14 a menos do que possuíam anteriormente.
Uma queda na votação do PSOE, contudo, era esperada devido a impopularidade de Susana Diaz, ala direita dos socialistas e presidente do Governo Regional da Andaluzia.
Em segundo lugar ficou o conservador PP (Partido Popular), do ex-primeiro ministro Mariano Rajoy, com 20,8% dos votos. Ainda que tenha ficado com a vice-liderança, o PP perdeu 5,9% em relação às eleições de 2015, ficando com apenas 26 cadeiras.
Em terceiro ficou o liberal Ciudadanos (Cs), confirmando sua forte ascensão no cenário eleitoral espanhol, com 18,3%. Esta votação representou um crescimento de 9%, que rende ao partido o total de 21 cadeiras.
Já a aliança eleitoral “Adelante Andalucia” (AA), formada pelo PODEMOS e Esquerda Unida (IU), Esquerda Andaluz e Primavera Andaluz, fez 16,2%, dos votos, 5,5% a menos que em 2015, que corresponde a 17 cadeiras parlamentares.
A contra face da queda dos partidos de esquerda, por sua vez, é a ascensão do partido de extrema direita neofranquista, o VOX, que fez 10,9% dos votos e obteve 12 representações. Ele capitaliza pela direita o desgaste tanto do PSOE, quanto do PP.
Quem é o VOX?
Esta é a primeira vez que o VOX foi eleito para um cargo legislativo desde que foi lançado, em 2014. Também, foi a primeira vez desde a saída do reacionário Blas Piñar da Câmara dos Deputados, em 1982, que a extrema direita retorna ao parlamento espanhol.
O VOX, que significa “voz”, foi fundado por dissidentes do Partido Popular (PP), em dezembro de 2014, e possuí programa marcado pelo caráter altamente nacionalista, conservador e reacionário.
Por um lado, tem semelhanças com o discurso da extrema direita brasileira, que “vê” uma conspiração internacional levada a cabo pelo “marxismo cultural”, associado por eles ao debate sobre opressões de gênero e raça.
São, portanto, contra o feminismo, a discussão de gênero nas escolas, o casamento homossexual, o aborto, e restantes palavras de ordem democráticas historicamente defendidas pela esquerda.
Por outro lado, defendem a repressão total do movimento independentista Catalão e a centralização política, administrativa e orçamentária no governo federal. Esta característica, em particular, remete diretamente à história do fascismo espanhol.
A Espanha é um país fraturado pelo conflito entre seus estados, unificado artificialmente e através de brutal violência pela ditadura de Francisco Franco (1939-1977). Em função deste histórico, por vezes, movimentos locais reivindicam independência, como é hoje o caso da Catalunha e, anteriormente, do país Basco.
Por último, o programa do VOX é também marcado por forte discurso anti-imigração e islamofóbico, associando a fé muçulmana com o terrorismo radical.
Não por coincidência, onde há extrema direita e islamofobia há também Steve Bannon, ex-estrategista chefe do governo Trump e articulador político internacional de partidos nacionalistas e conservadores.
No dia 10 de abril deste ano, Rafael Bardají, ideólogo do VOX, encontrou-se com Bannon em Washington, capital dos Estados Unidos.
Apesar de o conteúdo da sua reunião não ter sido divulgado, o norte-americano comentou às vésperas da eleição andaluz sobre a “necessidade” de um partido nacionalista e identitário cristão na Espanha[1].
Mobilização e protesto
No entanto, nesta segunda (03), um dia depois das eleições, cerca de 10 mil pessoas protestaram nas principais cidades do estado contra a presença do VOX no parlamento. Milhares saíram às ruas em Sevilla, Málaga e Granada.
Assim, apesar do golpe sofrido pela ascensão da extrema-direita, os andaluzes reagiram de imediato mostrando que estão dispostos a barrar o avanço da extrema direita.
Ontem, terça-feira (4), os protestos se espalharam para as 8 províncias de Andaluzia e já ocorrem concentrações de pessoas para grande manifestação marcada para hoje (5).
Para consolidar esta luta, é urgente a construção de uma frente antifascista e, ao mesmo tempo, garantir a unidade das forças de esquerda e socialistas de maneira independente do PSOE
Artigo de Victor Amal publicado originalmente no Esquerda Online
[1] https://www.elmundo.es/opinion/2018/10/20/5bc9cbbe468aeb8e128b4601.html