9, 4, 2. Nove anos, quatro meses e dois dias: é o tempo integral de serviço que os professores viram suspenso, que deixou de contar para progressão na carreira e, portanto, para atualização salarial. O actual Governo, apoiado por BE, PCP e PEV, assumiu funções com a promessa de “devolver rendimentos”. Porém, a proposta do Governo é restituir pouco mais de dois anos de tempo de serviço. Perante a firmeza dos sindicatos e a crescente greve às avaliações, Tiago Brandão Rodrigues, Ministro da Educação, chegou a ameaçar que, ou os sindicatos aceitavam a proposta do Governo, ou não haveria restituição alguma!
A luta dos professores pela restituição integral do seu tempo de serviço começou há quase um ano: uma forte greve a 15 de Novembro de 2017 colocou a questão em cima da mesa. Na altura, Governo e os principais sindicatos, incluindo a FENPROF, chegaram a acordo para negociar o assunto em inícios de 2018. O Governo ganhou tempo, a FENPROF adiou a luta e os professores não ganharam nada. Desde o início de 2018, o Governo foi mantendo uma posição intransigente. A paciência dos professores esgotava-se e a FENPROF não teve alternativa senão convocar novas lutas. Ainda que de forma deslocalizada e divididas, as greves de Março foram um sucesso. A manifestação nacional de 16 de Maio, convocada pela FNE, colocou mais de 10 mil professores na rua. A FENPROF, na verdade, desde o fim de 2017, que acreditou na via das negociações com o Governo. Foi a intransigência do Governo e a pressão da base docente que foram obrigando Mário Nogueira e a Federação a convocar novas mobilizações.
Mantendo esse registo, a FENPROF convocou uma greve às reuniões de avaliação, porém apenas para depois de 18 de Junho. Assim, as reuniões mais importantes, relativas aos anos em que os alunos fazem exames, iriam acontecer com normalidade, pois seriam entre 4 e 14 de Junho. Mais uma vez o Governo seria poupado. Foi o recém-criado Sindicato de Todos os Professores (S.TO.P) que convocou a greve para as primeiras semanas de reuniões de avaliação. Esta greve cresceu espontaneamente e foi organizada, na base – escola a escola, reunião a reunião – pelos professores. O Governo e os directores de escola atacaram esta greve com tudo, espalhando desinformação no sentido de que seria ilegal e que os grevistas seriam punidos. Infelizmente, num primeiro momento, a FENPROF e os seus sindicatos fizeram coro com o Governo. Sem meios financeiros ou máquina sindical por trás, a Greve atingiu nas primeiras duas semanas, cerca de 45% das escolas e agrupamentos do país. O impacto foi tal, que o Governo teve de lançar mão de um expediente ilegal: autorizar todos os alunos sem nota lançada a irem a exame, tentando assim anular os efeitos da greve. Foi em vão: a segunda fase da greve, já com o apoio dos restantes sindicatos, tem tido uma adesão na ordem dos 90%.
Os professores podem vencer!
O Governo parece irredutível. No Parlamento o debate foi áspero. António Costa resumiu-se ao chavão “não há dinheiro”, fazendo lembrar o ex-Ministro das Finanças, Vítor Gaspar. O Governo que injectou mais de €10 mil milhões na banca nega-se agora a devolver direitos com os quais já se comprometeu. Também os professores se mostram firmes e a sua luta tem crescido. A luta dos professores pode crescer e fazer o Governo ceder.
Uma oportunidade para confrontar o Governo é a Iniciativa Legislativa Cidadã, que propõe a restituição integral do tempo de serviço dos professores, imediatamente. Trata-se de uma proposta mais avançada do que aquela que a FENPROF tem vindo a defender com a concordância de BE e PCP: a diluição da devolução no tempo, até 2023. A ILC, lançada em Abril, atingiu por estes dias as 20 mil assinaturas necessárias para ser debatida e votada em Parlamento. As 20 mil assinaturas foram atingidas no calor da Greve às reuniões de avaliação e a ILC, mais que uma iniciativa de um grupo de professores, tornou-se uma aríete de milhares de professores contra Costa e Tiago Rodrigues. Até agora, só o novo sindicato S.TO.P apoiou esta iniciativa. Os sindicatos maioritários, com a FENPROF à cabeça, como de costume, vêm mais esta iniciativa como uma “concorrente” do que como uma aliada. Parece-nos um erro.
Não por acaso, o PCP já veio opor-se à ILC. Parece bizarro, mas é verdade. O PCP não quer ver votada no Parlamento a restituição dos direitos dos professores. Os seus argumentos são vários mas errados e até falsos. Segundo o PCP, esse compromisso já constava no Orçamento do Estado de 2018, pelo que não fazia sentido votar-se de novo. Supostamente, ao colocar o assunto à votação, estar-se-ia a dar uma oportunidade ao Governo para negar esse compromisso. O que o PCP parece ignorar é que o Governo há seis meses que vem a negar esse compromisso! Não se trata de dar a oportunidade ao Governo de fugir ao compromisso, mas precisamente de confrontá-lo com o compromisso a que tem fugido!
A negativa do PCP em que os anos de serviço dos professores sejam discutidos na AR, essa sim, ajuda o Governo a dar o dito por não dito. Na sua posição oficial, o PCP tenta ainda desqualificar a ILC levantando “dúvidas quanto à sua origem e autores “ e afirma que estes “pretende[m] utilizar o descongelamento da progressão na carreira como pretexto para abrir um processo de revisão do Estatuto da Carreira Docente” , o que é absolutamente falso, não havendo no texto da mesma qualquer referência ao ECD. Na verdade, o PCP parece não querer ver ameaçado o protagonismo da FENPROF, Federação que vê como “sua”. Tão pouco quer esticar demasiado a corda com o Governo, no momento de votação do OE – não vá Costa usar o pretexto para gerar uma crise política, responsabilizando o PCP.
O Bloco de Esquerda também se tem mostrado circunspecto face à oportunidade da ILC. Num momento em que o PS se mostra cada vez mais à direita – veja-se o acordo saído da Concertação Social – os seus “parceiros” de esquerda continuam a facilitar-lhe a vida. Parece-nos um erro grave. O MAS apoia a 100% a luta dos professores em todas as suas componentes, inclusive a ILC. O Governo deve ser confrontado nas escolas e nas ruas, mas não pode ser poupado no Parlamento!
A greve às avaliações, em curso, é da maior importância. Ela pode ganhar corpo e ter mais força para fazer o Governo ceder, se for acompanhada de outras iniciativas. Além de apoiar a ILC, é necessário voltar às ruas, às centenas, aos milhares ou às dezenas de milhar. É possível fazê-lo já, ao calor da Greve às avaliações: trazer a luta dos professores de volta para as ruas.
Acreditamos que a luta dos professores ainda agora começou e que terá novos desenvolvimentos. Outros sectores têm lutado. Na saúde, técnicos, enfermeiros e médicos têm feito numerosas greves. No dia 15, uma greve nacional paralisou a Saúde Pública. Outros sectores, como a CP, as Infraestruturas de Portugal, os estivadores, a PETROGAL têm feito greves. Todos querem os seus direitos de volta. Todos exigem que o PS cumpra o que prometeu: virar a página da austeridade. A reposição integral das carreiras, as 35 horas para todos, o fim da municipalização dos serviços públicos, o fim da caducidade dos contratos colectivos, combate à precariedade e aumento de salários. É possível e necessário unir todas estas lutas para confrontar o Governo, com um Verão e um Outono de luta, unidade e exigência.
Os professores ao lutar, estão também a ensinar. É hora de aprender a lição: ao lado do PS não se conquistam direitos. É preciso sair à rua e unir as lutas para termos os nossos direitos de volta!