Ontem, iniciou-se uma greve docente de um dia por cada região, a começar pela grande Lisboa e Madeira. Ao todo, serão quatro dias sucessivos de greve, alternadamente, em cada uma das regiões do país.
A que se deve esta greve dos professores? A classe docente entrou em negociações com o Governo PS, já há alguns meses, para que os nove anos de congelamento das suas carreiras, sejam totalmente descongelados e voltem a ser reconhecidos. A reivindicação dos professores em nada obstrui os direitos que o Governo PS, com o apoio de BE e PCP, prometeu reconhecer no seu Programa de Governo, aprovado em 2015. Afinal, o mote de tal programa foi o de “virar a página da austeridade”, o que inclui o descongelamento das carreiras da função pública, em todos os seus diferentes setores.
Ainda assim e apesar das promessas, o Governo PS tem demonstrado resistência ao descongelamento total das carreiras docentes. O que não só é estranho ao seu próprio programa como é estranho face ao correto descongelamento de outras carreiras na função pública já em execução.
O Governo PS está determinado em contrariar assim o seu próprio programa de “virar a página da austeridade”, discriminando a classe docente, através da proposta de descongelamento de apenas dois anos dos nove congelados. Ou seja, propõe descongelar apenas 22% da carreira docente. Uma proposta inaceitável, de ridícula, discriminatória e ofensiva que é.
Como se pode exigir que os professores, desempenhando a sua função, preenchendo todos os requisitos legais e respeitando todas as normas, aceitem agora que a tutela recuse a sua própria proposta de descongelamento da totalidade do tempo de serviço efetivamente prestado? O argumento das avultadas verbas envolvidas no restabelecimento da legalidade invocado pela tutela de modo nenhum pode ser aceite. Se, quando se trata de resgatar bancos, os governos avançam com milhares de milhões de euros, como aceitar que neste caso, os legítimos e legais direitos de quem serviu eficientemente a sociedade sejam postos de lado?
Conhecemos os constrangimentos orçamentais impostos pelo colete de forças de Bruxelas e a intenção de reduzir o défice. Conhecemos ainda a forma como o Governo PS se associa àqueles interesses. Esse é precisamente parte do problema, pelo que nunca a classe docente pode concordar com o facto de ter cumprido com os seus deveres e o Governo se recusar a reconhecê-los. O país atravessa um dos maiores períodos de crescimento da última década e nada disso reverterá para os professores? O Governo irá participar na nova injeção de capital do Novo Banco e deixar os professores com as suas carreiras congeladas?
A frente sindical liderada pela FENPROF decidiu dividir a greve por quatro dias em que cada região faz greve em cada um dos dias, sem sobreposição. Não nos parece que uma greve por turnos seja o método mais eficaz. A unidade faz a força. Há dias, quando os dirigentes sindicais foram confrontados com o facto de alguns docentes considerarem a greve de um dia, como uma acção débil face à intransigência do governo, responderam que, quem quisesse podia fazer greve durante os 4 dias. Numa altura em que importaria reforçar a unidade e coesão da classe docente, não parece que a organização desta greve, por turnos, durante 4 dias, seja a posição mais acertada. É evidente que a unidade e coesão têm de ser melhor trabalhadas, com antecedência. Os professores devem ser ouvidos, as greves devem ser preparadas com eles. É necessário perceber a sua disposição de luta e daí partir para as ações que melhor possam assegurar a vitória das suas reivindicações. Neste sentido, parece que ainda há muito a fazer.
Com um Governo determinado em romper com as suas próprias promessas e, por outro lado, sindicatos pouco determinados em alcançar vitórias, pode prever-se que o impasse se mantenha e tudo acabe canalizado para as negociações à porta fechada. Basta! Os professores não vão concordar com o roubo do tempo de serviço, sendo certo que este problema é apenas um dos muitos que opõem os profissionais do ensino à tutela e que vão desde os concursos lesivos, o amianto nas escolas, a gestão autocrática, as turmas superlotadas e a municipalização forçada, entre outros.
Este impasse não poderá manter-se por muito tempo, nem poderá ser completamente resolvido à mesa das negociações, sem um recuo do Governo. Parece ser cada vez mais claro que o desafio da classe docente é, neste momento decisivo, começar a decidir democraticamente as suas lutas e assim poder avançar com formas de luta diferentes das que temos tido, claramente insuficientes para a dimensão dos ataques à Escola Pública. Só assim poderemos desfazer este impasse a favor de quem trabalha na Escola Pública.
José Oliveira