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A divisão sexual do trabalho

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“As condições em que vivem homens e mulheres não são produtos de um destino biológico, mas são antes de tudo construções sociais. Homens e mulheres não são uma coleção – ou duas coleções – de indivíduos biologicamente distintos. Eles formam dois grupos sociais que estão engajados em uma relação social específica: as relações sociais de sexo. Estas, como todas as relações sociais, têm uma base material, no caso o trabalho, e se exprimem através da divisão social do trabalho entre os sexos, chamada, de maneira concisa: divisão sexual do trabalho.”

– Danièle Kergoat

A divisão sexual do trabalho pode, muito resumidamente, ser definida como a divisão de atribuições, tarefas e lugares sociais para mulheres e homens, decorrentes das relações sociais de sexo. Tem por característica a destinação prioritária dos homens a atividades produtivas (atividades visíveis e de forte valor social, trabalho remunerado) e a mulheres à esfera reprodutiva (atividades relacionadas a cuidados e afazeres domésticos, trabalho invisível, não remunerado, sendo como que a paga pelo seu sustento).

Foi nessa dicotomia entre o público e o privado que se consubstanciou a divisão sexual do trabalho (homens provedores/mulheres cuidadoras). Aos homens eram atribuídas as funções da força e da razão, às mulheres as da “natureza” e “sensibilidade”. Assim, as atribuições sociais, ao mesmo tempo que limitavam as mulheres a permanecerem no espaço privado, delegavam aos homens, como “destino natural”, o espaço público.

Com as transformações históricas, socioeconómicas, culturais e a força do movimento feminista do séc. XX, as mulheres começaram a ocupar o espaço público surgindo novas configurações que fragilizaram a dicotomia público e privado, mulher cuidadora e homem provedor.

Apesar da entrada da mulher na esfera pública a divisão sexual do trabalho continua a existir e é uma das bases da opressão sobre a mulher. A mulher, embora esteja presente na esfera pública, continua a ser a protagonista do espaço privado, originando a chamada “dupla jornada de trabalho”. Ela trabalha dentro e fora de casa, continuando a ser vista como a “natural” cuidadora, recaindo novamente sobre ela a responsabilidade dos afazeres domésticos e cuidado do lar. Um estudo da ONU revela que as mulheres fazem diariamente 302 minutos de trabalho doméstico e assistência a dependentes, os homens chegam aos 77 minutos.

Esta atribuição de diferentes papéis, para além de ser a responsável pela dupla jornada de trabalho, faz com que os trabalhos atribuídos às mulheres sejam menos valorizados e remunerados, e sendo delas o papel de cuidadoras, faz com que tenham empregos mais precários, menos hipótese de progressão na carreira e de acesso a cargos de chefia, pois sendo delas a “natural” responsabilidade dos filhos e do lar, quem emprega prefere empregar homens e não mulheres, o que torna a mulher menos independente financeiramente, ficando mais exposta à violência e a relacionamentos abusivos. Esta questão também faz com que muitas mulheres, que querem ter filhos, desistam de os ter pois são “obrigadas” a escolher entre ser mãe ou ter uma profissão, pois sabem que na prática e no atual sistema um implica no outro.

A pergunta que se impõe é: como é que com as transformações ocorridas na sociedade e a entrada da mulher no espaço público, dentro de casa, ou seja, na esfera privada, continua a ser ela a maior responsável pelo trabalho doméstico continuando ainda a ser vista como a “natural” cuidadora e responsável do lar?

A resposta está no capitalismo! O sistema em que vivemos alimenta esta visão e interpretação do conceito homem/mulher com a sua diferenciação de papéis, hierarquização e a dominação de um sobre o outro, contribuindo para o não questionamento deste modelo e da sua real mudança. E porquê? Porque lucra com isso!

Quanto menos se pagar em salários mais lucra o patrão, portanto quanto mais explorada for a mulher, mais lucra o capitalismo.

Outra questão, o trabalho de cuidadoras domésticas ocupa o espaço que deveria ser ocupado pelo estado social. É atribuído às mulheres o que deveria ser responsabilidade do estado, e quem é que ganha com isso? Novamente o sistema, ou seja, o capitalismo.

A criação de uma rede de creches públicas, casas de repouso para idosos, lavandarias, cantinas, deveria ser responsabilidade do estado, não da mulher. Ao capitalismo dá jeito o papel de cuidadora dado à mulher, pois coloca nela a “responsabilidade” de realizar essas tarefas, fazendo ela as vezes do estado que lucra com esse trabalho que é trabalho e é não remunerado.

Segundo dados da ONU, o trabalho não remunerado de cozinhar, limpar a casa, cuidar de crianças e idosos, representa de 10% a 39% do Produto Interno Bruto (PIB) dos países.

Para se terminar com a divisão sexual do trabalho e sua consequente dupla jornada de trabalho, que faz parte da própria estrutura do sistema capitalista, temos de exigir ao Governo uma rede de creches públicas, casas de repouso para idosos, cantinas públicas, lavandarias públicas e para que essa mudança aconteça nas mentes, um ensino que leve a questão de género às salas de aula com a consequente abolição de diferenciação de papéis.

Temos de exigir ao PS, BE e PCP, que se dizem socialistas, políticas realmente dignas desse nome, e enquanto isso não acontece, temos de sair todas e todos à rua para denunciar e exigir essa mudança! A nossa voz tem de chegar a todas as mulheres, principalmente às mais desprotegidas e oprimidas por este sistema, para que todas tomem a consciência de que a divisão sexual do trabalho não é “normal”, e nessa divisão que a sociedade nos faz acreditar ser “natural” e que é parte estruturante do sistema capitalista em que vivemos, está toda uma opressão sobre a mulher que vai desde, menos valorização, empregos pior remunerados, mais precariedade (o que origina uma maior dependência económica e uma posição de fragilidade face a relacionamentos abusivos) e à dupla jornada de trabalho que é trabalho não remunerado.

Temos de chegar a todas para que saibam que não estão sozinhas, é uma luta de todas e todos e só unidas conseguiremos. Por mim, por ti, por todas, a solidariedade é a nossa arma!

Por isso este 8 de Março todas e todos na rua para que possamos tornar vivas as palavras de Rosa Luxemburgo “por um mundo onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres.”

Teresa Alho

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