O Brexit e as suas ondas de choque, de alguma forma, trouxeram à tona a discussão sobre um referendo em Portugal sobre a União Europeia e o euro.
A verdadeira novela das “sanções” com que a Comissão Europeia, o Ecofin e o ministro alemão Schauble ameaçam Portugal, veio tornar mais evidente a necessidade de enfrentar o directório europeu.
Em Portugal, por diversos motivos, as bandeiras da ruptura com o euro e a União Europeia e o Euro, não estão nas mãos da extrema-direita. Tão pouco os principais partidos de esquerda tem sido consequentes nestas matérias. Mas a crise europeia continua e, a cada um dos seus estertores, fica evidente a necessidade de passar à ofensiva contra a União Europeia e o euro. Se estes assuntos não forem tomados pela esquerda não podemos excluir que forças abertamente de extrema-direita ou fenómenos como o 5 Estrelas de Beppe Grillo possam surgir.
Uma falsa discórdia entre BE e PCP
A maior responsabilidade cabe a BE e PCP. Porém nas últimas semanas estes partidos envolveram-se numa “polémica” inútil precisamente sobre este tema. “Referendo sobre a Europa abre guerra entre PCP e Bloco”, notícia o DN1. O que está por trás deste desentendimento, precisamente no tema em que mais podiam convergir estes partidos?
Na X Convenção Nacional do BE, Catarina Martins sugeriu a possibilidade de um referendo sobre a União Europeia, caso se verificassem sanções a Portugal. Dias depois Francisco Louçã escreve que o referendo passará de “impossível a inevitável” e responde a alguns deputados do PCP que criticaram a proposta de Catarina Martins.
Já o PCP veio a terreiro, por António Filipe, criticando a proposta do BE por ser “inconstitucional” e dando a entender que o BE procurava apenas atenção mediática.
É uma polémica que não faz sentido. A verdade é que até há pouco tempo, tanto BE como PCP tinham defendido propostas de referendo ao euro ou à UE. Catarina Martins veio reafirma-lo agora. Porém não chegam a acordo e, na prática, nenhum está na luta para que seja feito um referendo.
Os argumentos de BE e PCP não convencem. O PCP diz que o referendo seria inconstitucional, mas não é assim. O facto de não estar previsto na Constituição, não significa que seja “inconstitucional”. Nada, a não ser a falta de vontade política, impede o governo de realizar o referendo e de se comprometer com o seu resultado. Jerónimo de Sousa disse taxativamente ser contra um referendo, mas que Portugal deve estar “preparado para sair do euro”, mas que isso não é um “acto súbito”, mas um processo. Só não disse como e quando iniciar esse “processo”.
Já o BE parece defender o referendo, mas de facto não o faz. Catarina Martins faz um eventual referendo depender de eventuais sanções e Francisco Louçã escreve que o referendo é “inevitável”… num futuro incerto.
Ou seja, por trás de um aparente desacordo, BE e PCP tem um grande acordo: nada fazer de imediato para lutar pela realização de um referendo, muito menos pela saída de Portugal do euro e da UE. Tememos que o motivo de fundo pelo qual BE e PCP não querem avançar nesta matéria é porque sabem que isso os levaria a entrar em choque com o PS. Uma luta consequente por um referendo para sair do euro implica derrotar o PS, coisa que BE e PCP não querem. Por isso adiam a luta por uma solução para a “submissão” e “chantagem” a que a UE sujeito Portugal, que estes partidos tanto denunciam.
A esquerda não pode esperar mais
Este impasse da esquerda, embora possa parecer prudente, envolve um grande perigo. Por um lado, a Europa parece caminhar para uma nova crise e Portugal encontra-se mais débil para a enfrentar, como menos soberania, menos produção e apoios sociais. Quem vai pagar a factura mais uma vez, serão os trabalhadores. Para evitar isso são necessárias medidas que passem a factura aos ricos e aos “mercados”: 1) uma moratória e uma auditoria ao serviço da dívida; 2) a nacionalização da banca (toda ela salva com dinheiro público e entregue a privados), com controlo e contas públicas; 3) a reversão das privatizações de Passos e Portas, e fim das PPP’s; 4) o confisco dos bens e contas dos grandes banqueiros que afundaram o país. Estas medidas permitiriam devolver todos os direitos que a direita roubou, subir o salário mínimo e lançar um plano de criação de empregos de qualidade.
Por isso o MAS luta há vários anos para que realize um referendo para Portugal sair do Euro. Após o Brexit lançamos o desafio a BE e PCP para encabeçarem uma plataforma que lute por esta causa. Se como diz Jerónimo de Sousa, “é um processo”, e como escreve Louçã, “será inevitável”, por quê adiar esta luta? Porquê esperar até que mais uma crise e mais austeridade se abata sobre o povo e os trabalhadores?
É preciso juntar forças, sair à rua, esclarecer, convencer a maioria dos trabalhadores e do povo de que o euro afunda o país e de que um referendo é possível e necessário. A actual atitude de falsa polémica e passividade de BE e PCP só ajudam a direita e os defensores da austeridade a manter a ofensiva. Renovamos o chamado a bloquistas e comunistas que reflectiam e passem das palavras aos actos.
1 http://www.dn.pt/portugal/interior/referendo-sobre-europa-abre-guerra-entre-pcp-e-bloco-5255461.html