Editorial do jornal Ruptura nº141, Julho/Agosto 2015
O povo grego mostrou, no referendo e nas ruas, que está disposto a enfrentar a vergonhosa política de rapina e chantagem que a UE, o BCE e o FMI (troika) querem continuar a aplicar aos povos da Europa.
A brutal campanha de chantagem feita pelos governantes da UE, pela imprensa internacional e apoiada, na Grécia, por todos os canais de TV privados para que os gregos votassem sim e aceitassem as “regras” da UE e do Euro não surtiu o efeito que esperavam e a esmagadora vitória do Oxi (Não), com 61,3%, expressou um massivo repúdio popular à política de Merkel e aos governantes da UE.
O povo grego expressou nas urnas, pela segunda vez este ano, que quer a política de austeridade enterrada, que quer acabar com o empobrecimento e a miséria, que quer reactivar a economia para recuperar os empregos e os salários destruídos pela troika, que quer ter serviço público para a saúde e para o ensino.
Este novo mandato dado ao governo do Syriza coloca-lhe a responsabilidade de mudar o rumo às políticas que têm sido aplicadas e enfrentar de vez Merkel e os donos da Europa. É este o momento porque a UE e o Euro estão enfraquecidos pela estucada dada pela decisão do povo grego.
Os impasses, as cedências negociais do Governo de Tsipras e a permanente tentativa de conciliar o inconciliável conduziram a esta situação difícil e confusa para o povo grego. Aceitar qualquer acordo que dê continuidade a uma política de austeridade é incompatível com as necessidades do povo grego de recuperar a economia e a vida que foi destruída pela troika.
O não pagamento dos 1,6 mil milhões de euros que eram “devidos” ao FMI a 30 de Junho passado provou ser útil à mobilização do povo grego e deve ser tomado como exemplo do caminho a seguir com toda essa “dívida” ilegítima.
A dívida, herdada dos anteriores governos e das suas políticas a mando da elite capitalista e dos grandes armadores, estrangula o país, a economia e os gregos. Perante tal cenário, impunha-se, desde o início do actual Governo, que se decretasse uma suspensão do seu pagamento para existir investimento desse dinheiro na economia real, na recuperação de empregos e na concretização da anunciada proposta de aumento do salário mínimo.
É claro que, paralelamente a essa suspensão, teriam de ser tomadas medidas de controlo público da Banca para evitar a fuga de capitais que já aconteceu (30 mil milhões de euros nos últimos 5 meses) e nem seria necessário a drástica (e impopular) medida que agora teve de ser tomada de encerrar os bancos por tanto tempo.
A troika mantém a guerra contra os povos da Europa para continuar a sugar-nos e à nossa custa repor, nos cofres dos Estados e das empresas, o dinheiro que os governantes corruptos e os capitalistas roubaram ao longo dos últimos anos. Para a Grécia, continuam a não ceder nessa política, apesar de já terem colocado a maioria do povo grego na miséria, destruído muitos dos equipamentos e serviços públicos e atirado milhões para o desemprego.
As chamadas “dívidas públicas” são uma fraude impagável e um meio de manter mais um canal de exploração permanente dos povos mediante o pagamento trimestral dos juros aos “credores”, que, na sua maioria, são os próprios donos dos bancos e instituições financeiras. A imposição das medidas que o BCE exige para manter o Euro são incompatíveis com os direitos e a vontade popular e, por isso, quer Portugal, quer a Grécia têm de dizer basta a esta chantagem e exploração permanente. É preciso romper com estes “credores” e com as leis que esta oligarquia impõe aos povos.
Rodear de solidariedade o povo grego, seguir o exemplo e enfrentar a UE
A solidariedade internacional com a luta do povo grego é fundamental para enfrentarmos e rompermos com os políticos da troika, com a austeridade e a exploração, com os políticos e corruptos que vendem o país.
Os governos da alternância dos partidos do arco da corrupção, PSD, PS e CDS-PP, têm afundado o país. Aliás, o processo político em países como a Grécia e Espanha também teve uma semelhança histórica com governos que se alternaram entre a direita tradicional e os PS locais (PASOK e PSOE, respectivamente) e que também, como em Portugal, levaram os países para o abismo da dívida impagável, do desemprego e dos cortes nos salários e pensões.
A diferença relativamente à situação actual portuguesa é que, na Grécia, esse vira o disco do “centro” foi quebrado com o desempenho do Syriza como alternativa governativa, e, em Espanha, com o Podemos e os movimentos de cidadãos, que também estão posicionados para romper com essa alternância que parecia não ter fim.
Para enfrentarmos a Merkel e a UE, para retomarmos a soberania do país, investir na produção, recuperar as centenas de milhares de empregos destruídos e devolver ao país o sector público e os salários e pensões que nos foram roubados é preciso também, em Portugal, construir uma plataforma política de unidade para se assumir verdadeiramente como uma alternativa aos partidos que nos têm governado desde o 25 de Abril.