Ordem dos Advogados

Ordem dos Advogados: “Em vez de democratização, temos elitização”

“Isabel” (nome fictício), jovem Mestre em Direito Penal, falou com o MAS sobre as dificuldades de acesso à Ordem dos Advogados por parte dos novos candidatos e sobre como tal afecta a aplicação da Justiça em Portugal.

MAS: Qual é a tua actual situação?

“Isabel”: A minha situação relativamente ao estágio na Ordem dos Advogados, tal como a de todos os outros estagiários, é dramática. No estágio, que dura dois anos, estão incluídos exames e provas intermédias que fazem depender a nossa progressão no estágio, o que viola a nova lei das organizações profissionais. Trata-se de um cerceamento ilegal, que viola leis, regulamentos e a Constituição. São pedidos valores insuportáveis, como 500€ de entrada, ao que se seguem somas semelhantes caso passemos nas provas de aferição. Estes valores afastam muitos que não têm possibilidades económicas e mais de 80% dos que conseguem pagar chumbam. A Ordem sabota os exames impondo cargas pesadíssimas e enunciados com perguntas para as quais não é suposto termos materiais para responder. O objectivo da liderança da Ordem é chumbar o mais número possível de estagiários para salvaguardar a quota de mercado dos advogados mais velhos.

MAS: Marinho e Pinto, actualmente líder do PDR, foi o anterior Bastonário da Ordem dos Advogados. Achas que teve algum papel nesta problemática?

“Isabel”: Tenho a certeza. Marinho e Pinto continua a ter influência na Ordem, dado que a actual Bastonária é sua herdeira directa. As medidas que ela está a adotar são as mesmas que Marinho adotaria. Marinho e Pinto fez tudo isto para ganhar a simpatia dos advogados mais antigos que já têm direito de voto na Ordem. O sistema eleitoral interno não o concede aos estagiários, portanto o candidato a Bastonário só tem de se preocupar com os que já estão na Ordem e que temem uma nova geração de juristas mais qualificados. Marinho e Pinto é um demagogo. Enquanto defendia a democratização da advocacia, impunha aos candidatos emolumentos elevadíssimos. Em vez de democratização, temos elitização.

MAS: Que impacto é que tudo isto tem no acesso dos cidadãos à Justiça?

“Isabel”: Marinho e Pinto retirou aos estagiários a possibilidade de defenderem oficiosamente. Isto torna a situação de muitos arguidos dramática. Antes os estagiários pegavam nestes casos e empenhavam-se em levá-los adiante, pois tinham de dar prova do seu talento jurídico. Agora os casos são apenas entregues a advogados que têm muitos outros casos e que não conseguem dar vazão a todos. Um advogado já inscrito não está tão preocupado em dar prova do seu talento jurídico num caso em que arguido não lhe vai pagar.

MAS: A JSD veio defender o fim dos exames de acesso às ordens profissionais. Achas uma medida positiva?

“Isabel”: Não me reconheço no programa da JSD ou do PSD, mas há que reconhecer que seria positivo se as restrições e os estágios de acesso às ordens profissionais fossem eliminados. A partir do momento em que alguém obtém um título académico, deve-lhe ser dado livre acesso à profissão.

MAS: O que mais pode ser feito?

“Isabel”: Estas questões devem ser colocadas perante o Tribunal Constitucional, já que a Ordem dos Advogados viola a Constituição e a lei das organizações profissionais. A Ordem devia interditar os advogados reformados de exercerem, abrindo espaço para novos profissionais. A Ordem argumenta que há muitos formados em Direito, mas a solução não está em impedir o acesso à profissão. As cadeiras que a Ordem impõe no estágio já foram frequentadas pelos estagiários durante a licenciatura e o mestrado, por isso não tem legitimidade para impor avaliações de conhecimentos em nenhuma nestas áreas.

Anterior

O que escondem as Presidenciais

Próximo

Podemos travar a austeridade?