Por toda a Europa, o Syriza virou o tema central de debate dos poderosos e uma luz ao fundo do túnel para aqueles que se afundam há anos em desemprego, miséria e baixos salários. A vitória do Syriza nas eleições gregas foi o terramoto que fez repensar a União Europeia (UE). A verdade é que, também em Portugal, nas fábricas, nas escolas, nos call-centers, os trabalhadores perguntam: vai o vistoso Varoufakis vencer a Merkel? E vai Alexis Tsipras conseguir baixar o desemprego? É possível fazer o mesmo em Portugal?
Entre todas as interrogações e dúvidas, há uma pergunta central que atravessa o debate: porque não há um Syriza em Portugal? As opiniões sobre o Syriza variam. Alguns acham que as aspirações a negociar melhores condições com a UE são ideias de crianças, como é o caso de Passos Coelho, que assim justifica a sua cobardia vil de vender o país. Já o PS, hipocritamente, prepara-se para impor a receita de Merkel e ajoelhar-se à austeridade, mas, até lá, conta ganhar votos surfando a onda grega. Outros, como o BE, dizem “ámen” a tudo o que o Syriza faça, com esperança de ganhar mais votos por isso. Nós, do MAS, estamos ao lado do povo grego e contra a austeridade e os seus partidos, aqui e na Grécia, e por isso exigimos que Tsipras e o Syriza vão até ao fim para se libertarem da austeridade, que rompam a coligação com a direita xenófoba e que formem um governo “dos de baixo”, apoiado na luta das ruas gregas. Mas, sobretudo, reivindicamos o que de mais positivo as eleições gregas trouxeram: a prova que podemos correr com os que afundaram e venderam os nossos países, de que a vontade dos povos pode abalar a Europa. E queremos repetir isso em Portugal. Como? Esse é o debate que queremos fazer.
A esquerda portuguesa está em profunda mutação. Mais lento ou mais rápido, os partidos tradicionais perdem espaço para novos movimentos e novas formações partidárias, todos eles. Isso acontece porque a esquerda tradicional falhou. O PS governa o país há 40 anos alternando com a direita no poder, mas sem nada alternar nas políticas. O PCP e o BE mantêm-se divididos há anos, abrindo o caminho ao PS. Preferem ver a austeridade a ser implementada, desde que ganhem votos e não tenham de assumir responsabilidades.
Mas novos movimentos vieram abanar este cenário, representam trabalhadores e activistas que querem ir mais longe, não apenas contestar os partidos da austeridade, mas derrubá-los. Contudo, alguns novos partidos e movimentos parecem querer imitar os defeitos dos velhos. Para começar, nem todos demonstram querer substituir no poder quem nos trouxe até aqui, ou seja, a direita e o PS. O Tempo de Avançar, de Ana Drago e Daniel Oliveira, que integra o LIVRE de Rui Tavares, não só não nega alianças com o PS como se propõe a fazê-las. Já o PDR de Marinho e Pinto vai pelo mesmo caminho. Mas, felizmente, novos movimentos como o Juntos Podemos deixam claro que não querem alianças com os partidos do chamado “arco da governação”, tal como outros menos novos. Porém, muitos dos novos e velhos pequenos partidos imitam o BE e o PCP numa coisa: pensam que se bastam a si mesmos e a sua única estratégia é juntar votos, eleição a eleição, para poder ter um deputado. Perguntamos, será um deputado do PAN, do MRPP ou até do MAS que vai assustar o poder?
O MAS pensa diferente
Há muito para discutir, muito para esclarecer, muitas lutas para organizar. É preciso juntar numa grande Assembleia a nova geração de movimentos e partidos que se opõem à austeridade. É necessário juntar forças de tantos académicos, artistas e sindicalistas independentes a quem falta um espaço para trazer as suas ideias à prática, para fazer colectivas as suas vozes críticas.
Faz falta um Congresso das Alternativas que junte os de baixo, os novos movimentos e personalidades contra a austeridade, que abra portas a todo o povo que está no sofá a ver o Syriza e o Podemos a fazer tremer a Europa. Que junte os pequenos partidos, mas também os movimentos que têm marcado a agenda como “Não TAP os Olhos”, “Que se Lixe a Troika” ou a “Plataforma contra o TTIP”, tal como os sindicatos que pensam politicamente. Faz falta um grande espaço que faça um último desafio ao BE e ao PCP para juntarem forças, que diga ao país que os de baixo podem governar, que não estamos condenados à alternância dos aprendizes da Merkel, a direita e o PS. E que avance para eleições para reproduzir cá o terramoto Grego.
O Syriza tivera 4,4% nas eleições de 2009. O Podemos há um ano acabara de surgir. Hoje ameaçam os governos da austeridade. A mesma dinâmica cresce em Portugal, mas passa por dentro de diversos partidos e movimentos. Faz falta uma plataforma que junte forças e inicie essa dinâmica em Portugal, para que, nas próximas legislativas e presidenciais, o terramoto grego se sinta por cá. Sim, podemos!
Gil Garcia