O ministro Paulo Portas, à semelhança do resto do Governo, exulta com o estado do país. Diz que “a recessão foi embora, o crescimento voltou, o desemprego está a recuar”, as exportações “subiram” e o turismo “teve o melhor ano de sempre em 2013.” (Jornal de Negócios, 28/junho). E conclui, satisfeitíssimo: “O país viveu três anos sob o ciclo da troika. Esse tempo terminou.” (idem).
A realidade é bem outra. Nem a recessão acabou, nem há retoma económica, nem a troika deixou de interferir na política do país.
Desceu o desemprego?
O desemprego está a recuar, gaba-se Portas, e é um facto que, de acordo com números divulgados recentemente, desceu 2,6% em maio, estando atualmente nos 14,6% (o que é ainda uma taxa elevadíssima). Os dirigentes sindicais da CGTP e da UGT explicaram a que se deve esta descida: à emigração, ao desencorajamento de muitos desempregados de longa duração que deixaram de se inscrever nos centros de emprego (declarações de Arménio Carlos à Antena 1, 1/julho), ao emprego sazonal e à colocação de desempregados em formação profissional (Carlos Silva, no mesmo dia). Este último colocou mesmo o dedo na ferida ao lembrar: “E a taxa de emprego? O problema é que não há investimento nem criação de emprego.” (idem)
Apesar destas denúncias (corretas) nem a CGTP nem a UGT têm implementado formas de organização para agrupar os desempregados e mobilizá-los em torno de verdadeiras reivindicações de combate ao desemprego, como por exemplo: a divisão das horas de trabalho (sem redução de salário) para que todos tenham emprego, e o fim imediato dos despedimentos.
Porque não há crescimento nem criação de emprego?
O facto de todos falarem de crescimento e criação de emprego (inclusive dirigentes sindicais) e afinal ser tão difícil que tal se verifique, parece um mistério… Mas não é, se compreendermos como funciona o sistema capitalista hoje.
Políticos e economistas de todos os matizes insistem que, agora que a troika se foi (o que ainda falta provar) é hora de investir, pôr a banca a financiar as empresas, etc.. Mas “esquecem” que cada vez menos o capitalismo é capaz de investir na produção. Não que ele não tenha capacidade de produzir o suficiente – pelo contrário, a economia mundial seria hoje capaz de suprir as necessidades básicas de toda a humanidade. O problema é que, quando os capitalistas já não conseguem retirar um lucro satisfatório da venda de mercadorias, entram numa situação de crise, e por isso param a produção, fecham empresas e despedem trabalhadores, dando origem a “uma enorme sangria económica e social para retomarem a produção e os seus lucros a partir dum patamar de maior exploração” (excertos do programa fundador do MAS, março/2012).
O que há é mais exploração e economia de casino!
Outra forma de os capitalistas contornarem a crise é aplicando os seus capitais, não na produção (onde o retorno dos lucros é mais alongado no tempo) mas sim na especulação, onde os ganhos são quase imediatos (e colossais). Os apelos piedosos para que os capitalistas promovam o crescimento económico e os banqueiros financiem o investimento produtivo não passam disso mesmo – apelos sem consequências. O empresário e o banqueiro farão aquilo que for melhor para garantir os seus lucros, e não para satisfazer as necessidades do povo português ou para relançar a economia produtiva do país. Para uma verdadeira recuperação desta seria necessário, em primeiro lugar, “renacionalizar a banca, com uma nova moeda nacional” (in Ruptura nº 135).
Esta imensa tarefa, que toca profundamente nos interesses de quem nos explora e domina, só a luta e a organização da classe trabalhadora a pode conseguir.
E quanto à dívida? E quanto à troika?
Ninguém fala dela ultimamente, mas o garrote duma dívida que já representa 130% do PIB não desapareceu como que por magia, bem pelo contrário. “A fatura dos juros cresceu de forma impressionante”, diz o DN (15/junho): mais 15,5% nos primeiros 5 meses do ano, comparando com o mesmo período de 2013. E é a isto que Portas chama de fim de ciclo!… Enquanto houver dívida deste calibre não há economia que aguente, e a recessão não só se torna inevitável como permanente.
Quanto à troika, já é público que ela “não largará Portugal (…) enquanto os cortes definitivos nos salários e nas pensões não forem aprovados e aplicados” (DN, 18/Abril). A diretora do FMI é taxativa: “Continua a ser necessária uma monitorização reforçada da implementação orçamental” (idem). Ou seja, por mais que Portas se ponha em bicos de pés a dizer que não, a troika é quem manda aqui. Essa é que é a verdade, e não as tiradas propagandísticas de Paulo Portas.
Ana Paula Amaral