Nos finais do ano passado, os casos de violação sexual tão frequentemente ocorridos na Índia receberam a atenção da comunicação social mundial. A temática despertou a partir do estupro e assassinato duma jovem de 23 anos em Nova Deli, que foi violada no autocarro por passageiros e, posteriormente, atirada à rua com ele ainda em movimento.
Entretanto, desta vez o fator diferencial e que foi responsável pela tónica dada a este problema não foi apenas o caso de abuso sexual que apesar de extremamente bárbaro representaria mais um – entre os quase 600 ocorridos nesta cidade desde 2012 – se não tivesse provocado uma forte revolta das mulheres contra anos de violência sexual e descaso dos governantes perante o respectivo problema. É prática comum dos polícias incentivarem a vítima a não prestar queixa, bem como a tentativa de casar a mulher agredida com o agressor para desresponsabilizá-lo criminalmente.
Pela primeira vez viu-se na Índia uma onda de protestos a pedir pena de morte aos violadores. As mobilizações que começaram a partir das iniciativas das jovens em Nova Deli, alastram-se por todo o país e levaram milhares de pessoas às ruas, entre mulheres e homens, com uma série de bandeiras contra a violência sexual, entre elas, o julgamento rápido em acusação de violação, a expulsão dos políticos criminosos, o reconhecimento da violação conjugal, etc. A resposta inicial da polícia foi uma dura repressão aos manifestantes, tendo deixado cerca de 60 pessoas feridas numa manifestação realizada na capital do país.
Tudo isto levou ao acirramento da revolta e ao crescimento dos protestos, bem como a indignação de todo o mundo perante a situação das mulheres indianas, as quais para além da alarmante violência sexual, possuem grandes dificuldades em ingressar no mercado de trabalho, estando assim renegadas a uma situação de completa miséria e dependência económica dos maridos, o que as deixa ainda mais vulneráveis. As fortes mobilizações chegaram mesmo a provocar certa instabilidade no governo da Índia, obrigando o Primeiro Ministro Manmohan Singh a pronunciar-se a favor das reivindicações, comprometendo-se com a aprovação da pena de prisão perpétua aos agressores, maior patrulhamento policial nas ruas, bem como uma legislação mais rígida de proteção às mulheres.
Considerando-se tratar duma sociedade baseada numa milenar e institucionalizada opressão da mulher, tais acontecimentos representam uma importante vitória. E mais, atestam o quão fundamental é a unidade mulheres e homens trabalhadores no combate ao machismo que apenas divide e fragiliza a classe. O avanço e a concretização destas vitórias depende agora da continuidade da luta, da realização duma permanente mobilização que permita promover o salto na consciência pelo combate à violência contra mulher, de modo a fortalecer cada vez mais os laços entre a classe trabalhadora.
Elisa Alves
Membro da Comissão de mulheres do MAS