O Estado social não é nenhum favor da classe dominante aos “pobrezinhos”, mas sim um sistema de serviços totalmente financiado pela classe trabalhadora.
No passado dia 30 de outubro o ministro Paulo Portas anunciou, com pompa e circunstância, o chamado “guião” para a reforma do Estado.
Trata-se de um documento de 112 páginas que, em síntese, tem como único objetivo aprofundar a destruição do Estado social, pela via do desmantelamento e privatização das funções sociais do Estado.
Outra coisa não seria de esperar deste governo…
O que é o Estado social
O que se convencionou chamar de Estado social é o conjunto de direitos – saúde, educação e segurança social – materializados em serviços públicos – hospitais, escolas, centros de saúde, serviços de finanças, etc. – que asseguram necessidades básicas da população em todo o território nacional. O financiamento destes serviços é garantido, sob a forma de impostos entregues ao Estado, em parte pelo salário dos trabalhadores (chama-se a esta parte salário diferido ou indireto) e, noutra parte, por uma fatia retirada aos lucros dos patrões. Como os lucros do patronato advêm, eles também, da exploração da força de trabalho humana, resulta daqui que o Estado social não é afinal nenhuma benesse do estado burguês, nenhum favor da classe dominante aos “pobrezinhos”, mas sim um sistema de serviços totalmente financiado pela classe trabalhadora, que inclusive beneficia os ricos e os seus filhos.
A troika só trouxe encerramentos e privatizações
Desde que a troika entrou em Portugal e os partidos do centrão amarraram o país a um memorando que ninguém sufragou, tem-se visto uma mudança quase radical no processo de desmantelamento do Estado social. Respaldado pelo FMI e pela UE, o governo PSD-CDS avança a passos largos na destruição da rede nacional de serviços públicos. Desde que iniciou a legislatura em 2011, já foram encerrados quase dois mil serviços: 536 escolas primárias, 205 lojas dos CTT, 15 centros de saúde, duas urgências, 49 tribunais, 18 governos civis, 1165 juntas de freguesia (números do DN de 4/junho/13, citados pelo Jornal de Negócios). Estas medidas levaram ao despedimento de, entre outros, 30 mil professores e 23 mil trabalhadores autárquicos.
Ao fecho de serviços seguem-se as privatizações, inclusive porque há regiões inteiras que estão a ficar desprovidas de serviços e os abutres do privado lá surgem como solução “natural”… Não é o que está a acontecer nos CTT? Primeiro fecharam-se 205 lojas, em seguida – privatiza-se a empresa.
Resgatar os trabalhadores e pensionistas e não os banqueiros e patrões
O plano para a reforma do Estado anunciado por Portas não faz mais do que consagrar no papel a política que o governo já está a implementar no terreno. Ele prevê, por exemplo, a fusão e consequente fecho de mais tribunais, inspeções-gerais, etc., a concessão de escolas, hospitais e transportes públicos a privados, a agregação de municípios, etc.. E, last but not least, põe na calha a privatização da água! (ver Diário de Notícias de 31/outubro, página 4).
A derrota deste plano catastrófico exige a mobilização de todos, trabalhadores e populações locais, pela preservação e defesa de cada um dos serviços em risco de fecho/privatização. Mas também a mobilização nacional pela demissão imediata deste governo, como primeiro passo para um governo dos trabalhadores, que comece por devolver, aos trabalhadores e pensionistas, aquilo que é nosso e está a ser-nos roubado : o salário, a pensão, os serviços públicos.
Nenhum governo burguês defende os serviços públicos
Em Portugal este sistema de direitos foi maioritariamente conquistado no processo revolucionário do 25 de Abril, juntamente com os direitos de liberdade e organização, a contratação coletiva, etc.. Foi a luta de massas que exigiu do Estado (que não deixou de ser burguês por isso) as garantias de saúde, educação e segurança social para todos. Inclusive inscrevendo esses direitos ao mais alto nível jurídico, na Constituição.
É claro que, à medida que a relação de forças foi sendo mais favorável à burguesia, esta nunca deixou de tentar recuperar o que fora obrigada a ceder no período da Revolução, quer transformando serviços públicos em negócios privados, quer pura e simplesmente eliminando serviços, isto é, fechando escolas, hospitais, etc..
Torna-se cada vez mais evidente que nenhuma conquista do Estado social terá vida longa enquanto deixarmos a burguesia permanecer no poder!
Ana Paula Amaral (professora)