O atual governo esteve à beira de cair, foi evidente, até demais. O interessante é analisar porque não caiu mesmo. Em outros artigos deste jornal esta temática será abordada. Neste artigo queremos polemizar fraternalmente, quer com o Bloco de Esquerda quer com o PCP, sobre outro tema a montante deste, dado que muito do que explica porque a grande maioria da população não saiu à rua para dar um empurrãozinho (nas últimas semanas) para a queda do Passos e Portas se relaciona com a falta clara de alternativas ao governo atual da direita. E porquê?
Porque a proposta quer do Bloco quer do PCP é a de … um governo de esquerda. Como slogan para outdoors é muito “eficaz”. Quem da esquerda não quer um governo de esquerda? Perante um governo de direita a governar a favor dos credores internacionais, dos agiotas da dívida, dos especuladores e dos reis da austeridade, claro que todos queremos um … governo de esquerda. O problema é: quem vai compor esse governo de esquerda?
O povo é bastante prático e lá no seu íntimo já percebeu que a proposta quer do PCP quer do BE de governo de esquerda (inócuo) sem nomear com quem, traz implícita uma proposta que não é uma verdadeira alternativa aos governos da direita. A proposta do BE e do PCP, a que não revelam nos outdoors e nos discursos para a TV, é a de um … governo de esquerda com o PS. E esta é uma das razões porque o povo não se mobilizou para empurrar para fora da governação o atual moribundo governo de Portas e Passos (antes era de Passos e Portas).
Todo o país já experimentou vários governos de “esquerda” destes, do PS, vários governos “socialistas”, vários secretários-gerais do PS e todos, todos sem exceção, quando chegam ao governo governam à direita e de acordo com as mesmas políticas da direita. É até ridículo o Bloco e o PC tentarem vender-nos um governo de esquerda com o PS ou com a suposta “ala esquerda” do PS (que nunca aparece verdadeiramente à esquerda e em rutura com a austeridade e a troika), mas no final das contas o que fica mesmo é o apoio ou a colaboração mais aberta ou mais encapotada (abstenções em propostas de Orçamento Geral do Estado, por exemplo) a um futuro governo de “esquerda” do PS.
Se, na verdade, não fosse esta a proposta do BE (e do PCP) porque raio é que quando fomos (o autor destas linhas e o MAS) parte do Bloco e apresentámos vezes sem conta a proposta (concreta e não uma abstrata como a que o BE tem em cartazes) de o BE lutar por um governo de esquerda de rutura com a austeridade e com o sistema e que esse governo deveria ser do PCP com o BE apoiado no movimento sindical, porque motivo sempre foi recusada tal proposta e porque se empenharam (aqui sim empenharam-se) em nos empurrar para fora da vida interna do BE?
Mais rapidamente o BE “junta forças” com o PS ou alas do PS do que com os que junto a si são verdadeiramente por um governo de esquerda de rutura com o sistema, pois é isso que faz falta ao país. Um governo que, ao tomar posse, coloque em referendo ao país se quer continuar ou não na moeda única ou continuar a pagar uma dívida que tudo destrói na economia e no emprego de milhões de trabalhadores, só pode ser um governo que não conte com o PS. Ora, um governo para este empreendimento tinha que assentar, como já dissemos, no BE e no PCP e sem o PS. É esta a nossa exigência à esquerda atual, incluindo os socialistas que não concordam com programas de austeridade.
O BE e o PCP que se deixem de rodeios, que deixem de ser mera oposição parlamentar. Em conclusão, o BE e PCP querem continuar a “cuspir” para o lado face ao governo e simplesmente capitalizar votos e deputados como oposição de retórica. O que faz falta é uma “esquerda a valer”. É nesta tarefa que está empenhado o MAS, e convidamos-vos estimados leitores a acompanhar-nos.
Gil Garcia em “De Olhos Bem Abertos”, Jornal Ruptura nº131, Julho 2013