No dia em que escrevo este texto ainda não sabemos os resultados das eleições na Grécia de 17 de Junho. Sabe-se que a coligação Syriza, considerada (pela imprensa) de “esquerda radical” e próxima das posições do Bloco de Esquerda (BE) em Portugal, pode disputar a vitória, o que só por si é uma excelente notícia. Apesar de não ser perfeita (nenhuma formação política o é) nem imune à crítica, apesar das graves limitações políticas do seu programa, a sua vitória representará a opção do povo grego para romper com a austeridade e a troika e abrirá uma nova situação de radicalização da luta naquele país.
O destino da Grécia terá uma grande influência em Portugal e por toda a Europa. Aliás, a possibilidade de vitória desta coligação de várias formações políticas gregas (a maioritária que dirige a Syriza – o Synaspismo – advém de uma rutura do PC grego) é desde logo uma “ressonância” eleitoral de anos e anos de resistência à brutalidade com que o povo grego tem vindo a ser tratado pela primeira troika a atuar em suposta “ajuda” aos estados mais débeis da Europa mediterrânica. Mas também da orientação política que esta nova força política imprimiu no discurso pré-eleitoral nos últimos meses.
Com efeito, face a duas magnas questões, a dívida grega e a divisão da esquerda grega, a Syriza posicionou-se várias vezes pela unidade e convergência com outras forças da esquerda, em particular com o KKE (o PC grego), e igualmente pela suspensão do pagamento dos juros da dívida do Estado grego, para além da óbvia oposição ao memorando e à austeridade, impostos pela troika ao povo helénico. Estes são os méritos desta coligação de esquerda na Grécia. E nesta matéria, apesar de várias personalidades do BE (e provavelmente toda a direção do BE) terem subscrito um manifesto de apoio à Syriza, a sua prática política em nada se aproxima dos desígnios desta parte da esquerda grega.
Em Portugal não só impera a divisão no seio da esquerda como as suas duas principais forças (o BE e o PCP), apesar de ambas se oporem ao memorando de entendimento com a troika, até hoje não avançaram um passo no sentido de alguma unidade efetiva que erguesse uma nova alternativa aos sucessivos governos quer do PS quer do PSD (ou de coligação PSD/CDS).
É muito bonito defender-se a Syriza quando esta força se destaca a favor da unidade de esquerda na Grécia e depois, em Portugal, praticar-se uma divisão cativa. No BE até se marginalizou e se separou uma sensibilidade (o atual MAS) por, no no seu interior, como ala esquerda impulsionada pelo Ruptura/FER, ter defendido durante três convenções sucessivas (em 2007, 2009 e 2011) a mesma orientação que a Syriza nos últimos meses levantou na Grécia.
Ou será que o BE simpatiza com a Syriza mais pelos seus deméritos do que pelas suas virtudes? Será que é pela defesa do euro ou da renegociação da dívida (que também defendem) ou pelas ilusões de que se possa romper com as políticas de austeridade sem romper com os ditames germânicos?
Em Portugal, cabe ao PCP e ao BE procurarem o caminho de uma unidade ampla que faça o país romper com a troika, que prepare um governo de esquerda em alternativa ao PS e à direita. E, se insistem em manter a divisão no seio da esquerda, então serão responsáveis pela manutenção da direita no poder ou pelas permanentes “alterações” de governo de mais do mesmo, ora governos PS de austeridade, ora governos PSD de austeridade. Foi por estas razões e pela urgência de uma nova esquerda que lute por um novo 25 de Abril em Portugal que construímos o MAS. E é por estas razões que, mesmo divergindo de várias posições da Syriza, não podemos mais do que desejar que triunfem nas eleições com que estão confrontados. Ainda que saibamos que vai ser preciso muito mais do que um triunfo eleitoral para alterar a favor dos trabalhadores gregos e europeus o curso da história.
Gil Garcia