Menos de um ano após a aprovação do pacote de austeridade imposto pela troika FMI- PS- PSD em maio de 2011, estão à vista os resultados do generoso “empréstimo” de € 78 mil milhões que vinha salvar o país da bancarrota:
– a dívida pública portuguesa passou de 92% do PIB nessa altura, para 110% do PIB no final de 2011;
– o desemprego disparou para mais de 14% da população; só o desemprego jovem subiu, em apenas 9 meses, oito pontos percentuais (de 27% para 35% – há hoje 156 mil jovens desempregados);
– sucedem-se as falências de pequenas e médias empresas, enquanto as grandes saem do país e se instalam em paraísos fiscais ou países europeus com regimes altamente benevolentes para os capitalistas (Holanda, Luxemburgo, etc.)
Em resumo, não só não se verifica nenhum aumento da produção interna como cresceu o peso da dívida no PIB. O paradigma austeridade = recessão = menos riqueza produzida (menor PIB) = menos impostos cobrados = menos direitos sociais, não só está a conduzir o nosso povo à ruína, como não se apresenta como solução para o pagamento da dívida ou do crescimento económico, mesmo do ponto de vista puramente capitalista.
A ilusão do keynesianismo
Para responder às crises cíclicas do capitalismo a burguesia tem que encontrar algumas respostas imediatas. Daí surgirem habitualmente as mais diversas “receitas” e teorias dos seus ideólogos. Por exemplo o keynesianismo – hoje muito em voga no nosso país nos círculos de debate de política económica, inclusive em setores da esquerda – defende que, face às crises, os estados intervenham para aumentar o poder de compra dos trabalhadores e da classe média (política de consumo), para incitar os empresários capitalistas a investir (política da redução da taxa de juro) e, por fim, para eles próprios aumentarem o investimento público (política de obras públicas). Este programa intervencionista foi aplicado nos EUA pelo presidente Roosevelt após a crise de 1929, e ficou registado para a história como o New Deal.
Ora, numa altura em que Portugal está sob resgate internacional e é de fato governado pela troika e pelo governo federal alemão, foram estes que ditaram as regras: os milhões de euros emprestados ao país não são para nenhum relançamento da produção e do consumo, são sim, obrigatoriamente, destinados à satisfação dos compromissos com os credores (a banca nacional e internacional), ou seja, para pagar os juros leoninos e fazer rolar o mercado da dívida (a compra e venda de títulos da dívida são elas próprias uma forma de acumulação de capital). Não há margem para aumentar o poder de compra dos trabalhadores através duma política de consumo instigada pelo Estado capitalista. É o contrário que se verifica: devido à redução dos salários e pensões e ao aumento de impostos provocados pela austeridade, o poder de compra da maioria do povo está a baixar drasticamente.
Assim, mesmo que o Estado implemente medidas de redução da taxa de juro (a taxa de juro do BCE é de 1% e as taxas Euribor até estão a baixar) para estimular o crédito e o investimento, não há como fazer com que os capitalistas invistam nos setores produtivos, porque eles sabem que não encontrarão consumidores suficientes para escoarem as suas mercadorias a uma taxa de lucro compensatória. Eis porque preferem recuperar rapidamente o capital investido através de aplicações financeiras e jogos especulativos, em vez de na produção de bens.
Investimento público sem suspensão do pagamento da dívida?
Resta, para os defensores do keynesianismo, o terceiro pilar do modelo: o investimento estatal em obras públicas. Acreditamos que seria ótimo para os trabalhadores e para a melhoria dos serviços públicos, mas… como fazê-lo se os recursos públicos estão a ser delapidados pelo contínuo pagamento dos juros da dívida? Para haver dinheiro que permita aumentar o nível de emprego e desenvolver o sistema de saúde e a escola pública, não se pode permitir que a riqueza gerada no país seja absorvida pela banca nacional e estrangeira!
É isto que PCP e BE parecem não entender quando propõem a “reestruturação” da dívida (de forma a poder pagá-la…): embora ambos defendam publicamente políticas de investimento público e de relançamento do aparelho produtivo, na prática opõem-se-lhes, visto que essas políticas são contraditórias com o pagamento da dívida.
Há uma saída para a crise no quadro do capitalismo?
Há cerca de 4 anos rebentou a crise do subprime. O terramoto provocado pelas falências em bancos americanos importantes quase levou ao colapso mundial. Imediatamente os estados capitalistas acordaram entre si injetarem milhões de dinheiros públicos no setor financeiro. Ora, estes pacotes oferecidos à banca não foram usados para abrir linhas de crédito para o setor produtivo, mas sim para aumentar ainda mais a especulação financeira. Simultaneamente fizeram disparar o recurso ao endividamento público, e com este veio a crise das dívidas soberanas.
Esta é, hoje em dia, a saída do capital para as suas crises cíclicas e cada vez mais profundas: a aposta na especulação e no endividamento, com a possibilidade constante de criação de bolhas especulativas semelhantes à de 2008. As mesmas medidas que provocaram essa crise estão presentes hoje e desencadearão novas crises, tão ou mais violentas para quem trabalha ou trabalhou.
Só com um plano de medidas claramente anticapitalistas, a começar pela nacionalização da banca e dos setores estratégicos da economia, será possível o relançamento da produção, o investimento em obras públicas e a criação de emprego. É o que propõe o MAS, novo partido em construção.
Ana Paula Amaral e J. A. Dias