O forte aparato policial que invadiu o prédio da reitoria da Universidade de São Paulo (USP), Brasil, nas primeiras horas da manhã do dia 8 de novembro pôs fim à sua ocupação, com a saída pacífica dos manifestantes que ali estavam há vários dias. Mas, nem de longe, encerrou a batalha aberta na universidade, sobre o convénio entre a reitoria e a Polícia Militar (PM), que permite a presença dos policiais no campus. Ao contrário, a presença de dezenas de veículos, de bombas de gás e do efetivo de 400 policiais desencadeou a revolta na comunidade universitária.
Imediatamente após a operação militar, grupos de estudantes se formaram em frente à reitoria, formados por alunos que chegavam para as aulas, ativistas que não foram presos ou que não estavam participando da ocupação, professores, funcionários e sindicalistas. Os manifestantes que chegavam deparavam com o forte cordão policial, que permaneceu montado durante todo o dia, com dezenas de policiais do Batalhão de Choque e da Força Tática, e veículos sendo usados para impedir a passagem até a frente do prédio da reitoria.
A esse grupos de estudantes somaram-se também moradores do CRUSP, a moradia estudantil, que foram acordados, por volta das 5h, com a operação policial. “Nós acordamos com o som dos helicópteros sobrevoando a USP e as sirenes. Logo depois, lançaram bombas de gás lacrimogéneo para que a gente não deixasse o prédio e fosse até a reitoria. Ao menos três bombas foram jogadas”, denuncia uma moradora, que não quis se identificar.
No meio da manhã, os manifestantes fizeram uma reunião e decidiram formar vários grupos, para percorrer a universidade, paralisar as aulas e conversar com os alunos, denunciando o ocorrido. Na Faculdade de Letras, os estudantes fizeram uma assembleia e decidiram parar as aulas, aderindo à mobilização. Também resolveram adiar a eleição do Centro Académico e publicaram uma nota pública contra a PM no Campus.
No final da manhã, cerca de 200 estudantes de vários cursos, como Letras e Arquitetura, foram em passeata até a 91ª Delegacia Policial, para onde os 73 estudantes presos haviam sido levados em autocarros. “Caminhamos cerca de uma hora até a delegacia, cantando palavras de ordem pela liberdade aos presos”, conta o estudante Paulo Henrique “Bahia”, estudante da Letras e militante do PSTU, que chegou na USP às 6h50, deparando com a invasão.
Até o final da tarde, 70 estudantes permaneciam detidos, muitos dentro de autocarros em frente à delegacia. Eles divulgaram uma carta na qual denunciavam: “Obrigaram-nos a entrar em salas escuras e agrediram estudantes. Homens com farda e sem identificação”. Com a queixa feita contra os estudantes pela reitoria, foi fixada uma fiança de 1.050 reais para cada um dos detidos. Durante a tarde, sindicatos e entidades, como a CSP-Conlutas, mobilizaram-se para entrar com um pedido de habeas corpus e arrecadar a quantia necessária para a libertação do grupo.
De volta da delegacia, os estudantes somaram-se aos que realizavam um ato perto da reitoria, somando cerca de 300 pessoas. Ali, de frente para os policiais, protestaram contra o ataque, com palavras de ordem, discursos e aulas-públicas de professores da USP, que também lançaram um manifesto e abaixo-assinado online contra a invasão.
O ato concentrou forças e, com as aulas paradas, aglutinou os que estão ainda perplexos e revoltados com a ação da reitoria. No início da tarde, um grupo de estudantes do IME (Instituto de Matemática e Engenharia) veio em delegação apoiar o protesto. Eles carregavam um cartaz, com os dizeres: “Se até o IME está aqui, quer dizer que a coisa tá feia”, ironizando a baixa participação e adesão a protestos dos alunos do instituto.
Unidade
No início da noite, os alunos começaram reuniões nos cursos e, às 20h, iniciariam uma assembleia central, para decidir os próximos passos. “Sem liberdade, não tem universidade. Esse ataque derrubou a máscara do reitor, que já vem aplicando a militarização da USP, com a presença da PM e com processos contra alunos e funcionários”, afirmou Dirceu Travesso, da CSP-Conlutas, que permanecia no local. “O que está em jogo é a defesa da universidade e das liberdades. É necessário uma grande unidade contra esse ataque.”
Greve
Em assembleia geral que reuniu mais de 2 mil pessoas na noite dessa terça-feira, os estudantes decidiram decretar greve geral. Eles exigem o fim do convénio entre a reitoria e a PM e o arquivamento de todos os processos contra os estudantes detidos.
Última hora
De acordo com informação do jornal O Estado de São Paulo online, foram necessários 39.240 reais para pagar a fiança dos estudantes, de um salário mínimo (545 reais) cada uma. O dinheiro foi arrecadado por sindicatos filiados à central CSP-Conlutas, à qual pertence o Sintusp, entidade que representa os trabalhadores da USP.
Artigo escrito por Diego Cruz, da redação do Opinião Socialista, com acréscimos locais.