Há já cinco meses que o movimento estudantil chileno sai diariamente às ruas de várias cidades, exigindo o alargamento dos benefícios sociais para os estudantes, mais investimento no ensino, mas sobretudo uma educação gratuita e de qualidade.
Os protestos tiveram origem nas universidades, tendo-se alargado posteriormente ao ensino secundário, um pouco como aconteceu em manifestações ocorridas em Itália.
Ao longo da evolução deste processo, rapidamente se colocou a habitual questão: como lidar com as pressões do governo no sentido de travar a mobilização, designadamente com a pressão em torno das negociações com os organismos que representam os estudantes.
Tentativas de desmobilização e traição
Em 27 e 28 de Agosto, a Confederação dos estudantes do Chile (CONFECH) aceitou sentar-se à mesa das negociações com o presidente Sebastian Piñera, sem que para isso tivesse consultado as bases. Esta atitude valeu o protesto por parte de sectores de base mais radicalizados, e o movimento não desmobilizou, antes pelo contrário.
A 15 de Setembro, nova ronda de negociações fracassa, sendo rejeitadas as propostas do governo e tendo sido decidida a continuação das manifestações. Grandes mobilizações ocorreram principalmente em 22 e 29 de setembro, com crescente violência policial, ameaças por parte do governo e tentativa de descredibilização por parte da imprensa.
No início de outubro o governo anuncia um aumento de 7,2% do orçamento para a educação e bolsas para 40% dos estudantes. Sectores mais moderados ligados à burocracia não conseguem fazer vingar a sua posição, tendo alguns dos seus dirigentes abandonado as negociações com as autoridades. Os sectores mais radicalizados não cederam perante as pressões do governo, exigindo o alargamento das bolsas e medidas mais concretas.
Na manifestação de 7 de outubro, a polícia deteve mais de 250 estudantes e o governo anunciou medidas severas de punição aos “desordeiros”, que incluem penas de prisão até três anos. Esta medida causou o protesto da Associação de Magistrados e de vários outros sectores ligados ao movimento social. A manifestação convocada para 8 de outubro não foi autorizada.
Poder às bases
Um pouco como aconteceu no processo de luta contra as propinas em Portugal nos anos 90, é preciso denunciar as constantes tentativas dos dirigentes estudantis, que estando ligados aos aparelhos dos partidos tradicionais, tudo fazem para não dialogar com a base. Tentam sempre entrar no caminho da negociação sem consultar nunca as bases, apelam à paragem das mobilizações enquanto negoceiam e, como se não bastasse, traem as posições do movimento durante as próprias negociações, acabando por aceitar o essencial das pretensões do governo.
Tal como em Portugal esta linha de traição foi seguida pela JCP, JS e JSD. No Chile é preciso denunciar os dirigentes ligados ao Partido Comunista Chileno e à Consertación (coligação entre socialistas e democracia cristã) por prosseguirem estas políticas.
Todo o poder deve ser dado às bases no sentido de os seus representantes executarem aquilo que for decidido e votado pelo movimento. Que sejam mantidas todas as reivindicações no sentido da educação gratuita e de qualidade rumo a uma vitória, que a existir servirá como um grande exemplo que que é esta a linha certa para se conseguir melhorar a vida dos estudantes, trabalhadores e camadas populares e derrotar as políticas da burguesia.
Nuno Santos