Mais de 200 mil pessoas manifestam-se contra o Pacto do Euro, os cortes sociais e a corrupção nas principais cidades do país, com destaque para Madrid, Barcelona e Valência. Em Portugal, o movimento Democracia Verdadeira Já realiza marchas em Lisboa e Porto.
O dia 19 de Junho mal amanhecera quando milhares de moradores de Madrid e cidades vizinhas tomaram as ruas em direcção à Praça Neptuno, no centro da cidade, onde fica o Parlamento. Convocada pelo 15-M, movimento surgido nas gigantescas mobilizações de 15 de Maio e cujo lema é “Democracia Real Ya”, e apoiada por assembleias em bairros e cidades da Grande Madrid, a nova manifestação de protesto reuniu dezenas de milhares de pessoas.
Nas seis marchas que confluíram para a Praça Neptuno os manifestantes, de todas as idades, levavam pancartas, feitas por eles mesmos, contra o desemprego, a precariedade laboral, os políticos e banqueiros. Uma delas dizia: “No hay nada más peligroso que un hombre sin nada que perde”. Entre as palavras de ordem gritadas ouvia-se: “Que no, que no, que no nos representan”, “Vuestra crisis, no la pagamos”, “Lo llaman democracia y no lo es”, “El pueblo unido, jamás será vencido”. O ambiente era festivo e organizado, contrastando com o grande dispositivo policial montado em torno da praça.
Em Lisboa e no Porto, apesar do número bem menor de manifestantes – cerca de 500 em Lisboa, segundo indicação da imprensa –, as marchas foram bastante animadas. Em Lisboa, foram gritadas palavras de ordem contra a troika e o FMI, acompanhadas pelo rufar de tambores. Esta manifestação é a segunda organizada pelos jovens que acamparam no Rossio e tem uma importância muito grande no sentido de alertar a população contra as medidas da troika, que o novo governo da direita pretende ainda piorar.
Pacto do Euro
Em Madrid e Barcelona, os manifestantes pediram a convocação de uma greve geral e, na capital catalã, exigiram ainda a demissão do conselheiro do Interior Felip Puig. O conselheiro do Interior foi quem ordenou o desmantelamento do acampamento de manifestantes na Praça da Catalunha, em finais de Maio, causando 120 feridos. Os catalães reivindicaram também o levantamento do processo movido contra vários manifestantes que se encontram presos desde 15 de Junho, acusados de, nesta data, terem agredido deputados que iriam discutir novos cortes orçamentais a áreas sociais.
Um dos alvos dos manifestantes foi o Pacto do Euro, um acordo impulsionado por Alemanha e França, aprovado em Março pelos governos europeus, que prevê cortes profundos nos direitos sociais. Os eixos do pacto são: aumento da idade da reforma, vinculação dos salários à produtividade, flexibilização do mercado de trabalho, reforma do sistema de pensões e de protecção social.
“Sobram razões para sair às ruas”, comenta Corriente Roja, partido de esquerda do estado espanhol. “Os governos e poderes públicos, longe de solucionarem o drama do desemprego massivo, dos salários de miséria, dos despejos das casas, da falta de futuro para os jovens, continuam com os despedimentos em massa”. E também a piorar as condições de trabalho, a facilitar o rebaixamento dos salários e a ampliar a desregulação e a flexibilidade laboral nas empresas, permitindo aos patrões aumentar a jornada, os horários e a mobilidade funcional.
Origem do 15-M
O 15-M teve origem numa jornada de protestos a 15 de Maio que levou dezenas de milhares de espanhóis às ruas. A partir de uma convocação difundida pelas redes sociais da Internet, um grupo de jovens acampou na praça Puerta del Sol, centro de Madrid, e, em poucos dias, foi seguido por outros milhares de jovens, assim como trabalhadores e desempregados.
O número de “indignados”, como são chamados pela imprensa, passou dos 50 no dia 15 para algo como 25 mil pessoas na noite de sexta-feira dia 20. A população apoiou de forma massiva as manifestações e ajudou, entre outras coisas, na alimentação dos acampados.
Espanha é o país europeu que mais sofre com o desemprego, que atinge mais de 20% da população e mais de 40% dos jovens. O 15-M, além de repudiar os ataques do governo espanhol aos direitos sociais, rechaça os partidos tradicionais do país, os sindicatos e as centrais atrelados ao Estado, como a CCOO e a UGT.
Uma nova greve geral
Apesar da política traidora das duas maiores centrais sindicais espanholas e dos partidos ditos de esquerda com representação parlamentar, como o próprio PSOE e a Esquerda Unida, os trabalhadores e jovens não dão trégua ao governo e aos patrões. As manifestações sucedem-se a 15 de Maio, 15 de Junho e 19 de Junho. E agora é preparar a greve geral nos locais de trabalho e nos bairros, contra um governo completamente desgastado.
Nas eleições municipais de 15 de Maio, o PSOE perdeu mais de 1,5 milhões de votos. À direita, representada pelo Partido Popular (o PSD lá do sítio), bastou, como em Portugal nas últimas legislativas, uma campanha que colocou a crise económica no centro de sua denúncia, mas se calou sobre a sua própria política de apoio às medidas de austeridade, para capitalizar uma parte do descontentamento social.