O resultado das eleições legislativas em Portugal espelhou aquilo que vemos em toda a Europa: quem estiver no poder é derrotado. Depois dos Trabalhistas, na Inglaterra, do PSOE, em Espanha, de Merckel, na Alemanha, e de Berlusconi, na Itália, chegou a vez do governo do Partido Socialista pagar pelas medidas de austeridade draconianas impostas ao povo português.
Após massacrar o sistema nacional de saúde, a educação (castigando muitíssimo os professores) e os pensionistas, e depois dos cortes na Função Pública e nos apoios sociais e do aumento do desemprego, era óbvio que o desgaste do governo de José Sócrates teria de traduzir-se nas urnas.
Desta forma, foi menos por convicção do que para castigar o PS que uma grande parcela dos eleitores votou PSD nessas eleições. Votar no PSD e eleger Pedro Passos Coelho foi a maneira que o povo encontrou para correr do poder com o PS de Sócrates. Tanto é assim que, apesar de uma grande vitória, o PSD não obteve a maioria absoluta. Para isso, deverá unir-se ao CDS (que cresceu um ponto percentual, menos portanto do que indicavam as sondagens e do que Paulo Portas pretendia) para fazer cumprir os planos de ataque à classe trabalhadora que a troika exige e a burguesia portuguesa aplaude.
O resultado da esquerda
Na esquerda, a CDU praticamente manteve a votação: desceu ligeiramente em número de votos, mas subiu, também ligeiramente, em percentagem, ganhando mais um deputado. Já o Bloco de Esquerda registou uma severa derrota. Caiu de 9,82% (16 deputados), em 2009, para 5,18% (8 deputados). Um resultado ainda pior do que o de 2005, quando obteve 6,35% dos votos e os mesmos 8 deputados.
Os fracos resultados da esquerda – e muito especialmente o desastre do Bloco – explicam-se por variadas razões: em primeiro lugar, ao apresentarem-se separados, Bloco e PCP não criaram uma alternativa forte e credível que conseguisse dar confiança aos seus possíveis e ou tradicionais eleitores de que haveria outra forma de mandar embora o governo PS/Sócrates que não fosse votando no PSD. Ou de que haveria outra saída para a crise que não fosse aceitar a troika e o seu plano de austeridade, como repetiam à exaustão a burguesia, os seus partidos e os seus meios de comunicação.
No caso do Bloco, o apoio a Manuel Alegre, o mesmo candidato de Sócrates às presidenciais deste ano, foi a causa mais profunda para explicar porque muitos dos seus eleitores desistiram de votar no seu partido. Em alguns casos, perderam a confiança no Bloco, noutras desmoralizaram ou buscaram outras alternativas. Por isso, não é inadmissível supor que muitos eleitores que poderiam ter votado Bloco de Esquerda acabaram por abster-se, votar PS ou até PSD.
Um terceiro elemento que ajuda a explicar o facto de a esquerda não ter conseguido impor-se como uma alternativa credível à crise e a austeridade tem a ver com a trégua social que acabou por se impor após o 12 de Março, com a gigantesca manifestação da Geração à Rasca. Ao não dar continuidade e impulsionar a luta dos trabalhadores e da juventude, cujos marcos no último período foram a greve geral de 24 de Novembro último e o movimento da Geração a Rasca, PCP, CGTP e Bloco de Esquerda, falharam redondamente. O ânimo e a vontade de lutar contra os PECs de Sócrates acabaram, em grande parte, por desviar-se para o projecto eleitoral ou foram neutralizados pela desmoralização trazida pela falta de alternativa.
O resultado eleitoral do Bloco de Esquerda comprova que a sua direcção fez opções erradas e deve reconhecê-lo convocando uma convenção extraordinária, onde os seus militantes possam debater as razões da derrota e aprovar um plano de lutas contra a troika e o novo governo de direita.
Uma vitória triste
Assim, os grandes vencedores acabaram por ser o PSD e o CDS que deixaram Sócrates cozer em lume brando, fazendo-o cair a tempo de tomarem o poder. A burguesia actuou no tempo certo: após a grande manifestação da Geração à Rasca, que mostrou que Sócrates não conseguiria apliar os planos da troika sem grande contestação social, deu luz verde aos seus partidos para fazerem cair o governo, canalizando o descontentamento para as eleições.
Os grandes derrotados dessas eleições foram Sócrates e o su PS, que, à imagem de Zapatero e Merckel, acabaram por ser vítimas da vontade de mudar do povo, e o BE, que viu a sua política de aproximação ao PS fortemente castigada.
Mas o grande derrotado da noite foi o povo português, que votou no seu próximo carrasco. Foi um voto triste, em que só comemoraram os “laranjas” de cartão. O que espera os trabalhadores portugueses é dramático e pode alterar as suas condições de vida para níveis terríveis, com salários de miséria, desemprego crónico, reformas tardias e um Estado Social inexistente.
E de quem é a culpa? Do povo, que votou à direita? Não, certamente que não. O povo, os trabalhadores e a juventude querem mudar de vida, como mostrou a Greve Geral de Novembro, como mostrou a manifestação de 12 Março, como mostram os ferroviários, como mostra a juventude que acampou no Rossio por uma “Democracia Verdadeira, Já”. A culpa é das suas direcções que não se mostraram à altura dos acontecimentos e não apresentaram uma alternativa.
Tragicamente, no dia 5 de Junho, não se vislumbrou no boletim de voto um quadrado em que meter a cruz fizesse realmente acreditar que as coisas iam mudar. Esta política voltou a ter um resultado desastroso, permitindo aos partidos que assinaram o memorando com a troika disputarem o poder sem uma alternativa viável no outro lado.
A saída é não baixar os braços e seguir o exemplo dos gregos que lutam sem parar contra os planos de austeridade do FMI. A saída é continuar a luta e sairmos às ruas no 19 de Junho, atendendo ao chamado do movimento “Democracia Verdadeira, Já”.
A vida, as políticas e o poder não se decidem apenas nas urnas, mas na luta social. Foi nas ruas que se derrotou Sócrates, foi nas ruas que se fizeram as revoluções que mudaram, verdadeiramente, as vidas das pessoas. Através das lutas populares, das greves, da ocupação de praças, da firmeza contra os planos de austeridade é possível derrotar as políticas de direita, sejam elas rosa, laranja ou amarelas, tenham elas maioria absoluta ou não.
Apelamos à organização democrática da classe trabalhadora em torno das suas lutas, para dizer não aos cortes nos salários e nas pensões, aos cortes na saúde e na educação! Apelamos à união de todos os sectores da classe trabalhadora com a juventude desempregada e precarizada para derrotar as políticas do FMI, agora vestidas de laranja amarelado! Exijamos um referendo, como na Islândia, para que seja o povo a decidir se devemos ou não pagar a dívida externa! Exijamos a suspensão do pagamento de uma dívida que não fomos nós que criamos e cujo pagamento só traz recessão e miséria para a maioria da população! Lutemos para expulsar de Portugal a troika e a sua política de austeridade que arruína o país.
Abaixo o plano da troika de fome e miséria!
FMI e troika fora daqui!
Suspensão do pagamento da dívida externa!
Por um referendo como na Islândia!