A manifestação da “Democracia Verdadeira Já”, no dia 28 de Maio, começou em frente ao Cinema S. Jorge, na Avenida da Liberdade, em Lisboa, e seguiu em direcção ao Rossio. Uma das principais palavras de ordem foi: “Fora daqui, a fome, a miséria e o FMI”.
Centenas de pessoas, em sua maioria jovens, estão a concentrar-se desde o dia 20 de Maio, no Rossio, em Lisboa. O movimento surge em solidariedade ao protesto iniciado a 15 de Maio (15-M) no Estado Espanhol, que levou à ocupação da praça Puerta del Sol, em Madrid, e de várias outras nas principais cidades do país. Os milhares de manifestantes exigem “democracia real”, criticando a farsa política que mantém o rotativismo PSOE (socialista) e PP (direita) e levou o país ao fundo do poço, com um índice de desemprego que supera os 21%.
Uma situação muito semelhante à existente em Portugal, onde PS e PSD se revezam no poder há mais de 35 anos, sendo, portanto, os responsáveis pela actual crise económica. À insatisfação com a nossa “democracia”, o desemprego, a precariedade e a falta de perspectiva da juventude e dos menos jovens juntou-se, nas últimas semanas, a certeza de que toda essa situação vai piorar ainda mais com a intervenção da troika FMI/Comissão Europeia/Banco Central Europeu. A Acampada do Rossio é um levantamento contra tudo isso que está aí – contra as políticas de direita, FMI, União Europeia, banca e capitalistas -, mas também a expressão da busca de uma alternativa por parte de um grande sector da juventude e da classe trabalhadora que não se revê nos partidos, sindicatos e movimentos existentes.
A Acampada de Lisboa é a actual expressão – ainda que, pelo menos por enquanto, em menor escala – do mesmo fenómeno representado pelo 12 de Março, com a Geração à Rasca: a revolta da juventude contra o beco sem saída social legado por um regime falhado, cujas instituições não sabem ou não querem representá-la, nem à maioria da população. Bem mais do que um apartidarismo generalizado, o que existe é uma profunda rejeição aos partidos do regime (PS e PSD) e um grande descontentamento com o sindicalismo existente, que deixa de fora a maioria dos jovens, que são trabalhadores precários, e se recusa a praticar uma verdadeira democracia pela base.
A Acampada de Lisboa, assim como as “acampadas” em Coimbra, no Porto e nas cidades do Estado Espanhol, subverte a rotina eleitoral, o período em que a burguesia e os seus políticos querem decidir no voto quem os irá representar. Um período em que, algumas vezes, mesmo os partidos de esquerda e os sindicatos evitam convocar mobilizações, além das previstas no calendário eleitoral, reforçando, desta forma, o clima de falsa “paz social”.
Se votar na esquerda deve ser a opção dos trabalhadores e da juventude, não será no processo eleitoral que conseguiremos derrotar os planos da troika e expulsar o FMI/Comissão Europeia de Portugal. Por tudo isso, a Acampada de Lisboa, como também as do Porto e de Coimbra, devem ter o apoio de todos os jovens, dos trabalhadores e da esquerda portuguesa. Por isso, devemos participar das assembleias populares realizadas diariamente no Rossio, um exemplo de democracia real pela qual lutamos, integrar os grupos de trabalho que mantêm e desenvolvem o movimento e, também, a Manifestação marcada para 28 de Maio.
Todos com a Acampada de Lisboa, do Porto e de Coimbra!
A seguir, reproduzimos o Manifesto aprovado numa das assembleias populares do Rossio:
1º Manifesto do Rossio
Os manifestantes, reunidos na Praça do Rossio, conscientes de que esta é uma acção em marcha e de resistência, acordaram declarar o seguinte:
Nós, cidadãos e cidadãs, mulheres e homens, trabalhadores, trabalhadoras, migrantes, estudantes, pessoas desempregadas, reformadas, unidas pela indignação perante a situação política e social sufocante que nos recusamos a aceitar como inevitável, ocupámos as nossas ruas. Juntamo-nos assim àqueles que pelo mundo fora lutam hoje pelos seus direitos frente à opressão constante do sistema económico-financeiro vigente.
De Reiquiavique ao Cairo, de Wisconsin a Madrid, uma onda popular varre o mundo. Sobre ela, o silêncio e a desinformação da comunicação social, que não questiona as injustiças permanentes em todos os países, mas apenas proclama serem inevitáveis a austeridade, o fim dos direitos, o funeral da democracia.
A democracia real não existirá enquanto o mundo for gerido por uma ditadura financeira. O resgate assinado nas nossas costas com o FMI e UE sequestrou a democracia e as nossas vidas. Nos países em que intervém por todo o mundo, o FMI leva a quedas brutais da esperança média de vida. O FMI mata! Só podemos rejeitá-lo. Rejeitamos que nos cortem salários, pensões e apoios, enquanto os culpados desta crise são poupados e recapitalizados. Porque é que temos de escolher viver entre desemprego e precariedade? Porque é que nos querem tirar os serviços públicos, roubando-nos, através de privatizações, aquilo que pagámos a vida toda? Respondemos que não. Defendemos a retirada do plano da troika. A exemplo de outros países pelo mundo fora, como a Islândia, não aceitaremos hipotecar o presente e o futuro por uma dívida que não é nossa.
Recusamos aceitar o roubo de horizontes para o nosso futuro. Pretendemos assumir o controlo das nossas vidas e intervir efectivamente em todos os processos da vida política, social e económica. Estamos a fazê-lo, hoje, nas assembleias populares reunidas. Apelamos a todas as pessoas que se juntem, nas ruas, nas praças, em cada esquina, sob a sombra de cada estátua, para que, unidas e unidos, possamos mudar de vez as regras viciadas deste jogo.
Isto é só o início. As ruas são nossas.