Unidade de esquerda contra o FMI

Só um Governo das Esquerdas contra os planos do Fundo Europeu e FMI pode tirar o país da actual crise e da subsequente guerra de austeridade que pesa sobre a larga maioria da população que trabalha.

 

1. O rebaixamento do rating da dívida portuguesa e da própria Banca pelas agências de notação na última semana precipitou o já previsível pedido de intervenção do FEEF (Fundo Europeu de Estabilização Financeira) e FMI pelo governo. Depois de dizer que não o faria, Sócrates acabou por ceder à pressão da banca, que se viu praticamente impedida de prosseguir o seu actual sistema de financiamento via Banco Central Europeu (BCE). Esta decisão trará pesados custos aos trabalhadores e à maioria do povo português, porque, em troca de empréstimos, FEEF e FMI exigirão um novo plano de austeridade, como tem vindo a acontecer na Grécia e Irlanda, os primeiros países a accionarem esse mecanismo.

2. A intervenção do FEEF/FMI, já está provado também nesses países, não serve nem para fazer descer os juros exigidos pelo mercado pela compra dos títulos da dívida – mecanismo responsável pelo descomunal aumento da dívida pública portuguesa a partir de 2008/2009 – nem, portanto, para reduzir essa mesma dívida. Pelo contrário, a intervenção do Fundo Europeu e do FMI acabará por afundar ainda mais a economia do país, tornando-a mais dependente dos recursos externos, destruindo o que resta de tecido produtivo e provocando uma profunda recessão. Ganham com o FEEF e o FMI em Portugal justamente os que defenderam o accionar desse mecanismo: a Banca portuguesa e estrangeira, especialmente a alemã e a francesa, detentoras da maior parte dos títulos da dívida do sector público e privado de Portugal, Grécia, Irlanda e Espanha, os países que enfrentam agora a chamada “crise da dívida”. O FEEF e FMI servem também – e este objectivo é o mais estratégico para a burguesa europeia – para impor de forma radical a destruição do que resta de Estado Social nesses países.

3. Diante do pedido de intervenção do FEEF/FMI feito pelo governo Sócrates, a população fica entre duas grandes mentiras: a primeira é a de que este pedido de intervenção (chamado eufemisticamente de “ajuda”) foi inevitável, que foi feito pelo bem de Portugal, que se teria afundado sem ele. Esta é a mentira dita por jornalistas, politólogos, economistas e pelo PSD e CDS-PP. Do lado do PS/Sócrates há uma segunda versão mentirosa para justificar o pedido de intervenção, ao dizer que a aprovação do PEC 4 teria evitado essa alternativa, o que não aconteceu devido ao chumbo do PSD. A verdade é que todos esses concordavam com a vinda do FEEF/FMI, mas o PS não quer carregar com o ónus dessa iniciativa – cujos efeitos dramáticos na vida do povo serão sentidos rapidamente, o que terá consequências eleitorais – e tenta responsabilizar o PSD por isso. O PSD, por sua vez, argumenta que a responsabilidade deve ser apontada à governação PS. No final das contas são ambos os partidos (PS e PSD), os responsáveis por termos chegado a este estado de coisas, pois governam Portugal, alternadamente, há mais de 30 anos.

4. BE e PCP criticam o pedido de intervenção, apontam correctamente os efeitos negativos que trará para salários, pensões, emprego e economia portuguesa de uma forma geral, mas não têm uma política de enfrentar essa decisão. Do ponto de vista da política, não chamam, lamentavelmente, a uma grande mobilização contra o FEEF/FMI. Pelo contrário, direccionam a insatisfação e o receio dos portugueses quase que exclusivamente para o voto nas próximas eleições legislativas. Do ponto de vista programático, ambos também não pedem a suspensão do pagamento da dívida pública, mas sim, no caso do BE, a realização de uma auditoria à dívida total (pública e privada), e, no caso do PCP, a renegociação da dívida pública. Auditar, como propõe o BE, está correcto, mas, como em medicina, é urgente suspender a sangria para, aí sim, fazer o diagnóstico. A inversão de procedimento poderá levar à morte do doente, no caso, a economia portuguesa.

5. Mas há um facto novo na realidade, extremamente positivo para os trabalhadores e a maioria do povo português: BE e PCB, após tantos anos de costas viradas, por fim se abriram ao diálogo. Saudámos essa iniciativa até porque fomos dos poucos que há mais de cinco anos, internamente no BE e no país, insistíamos que era a única saída para romper com a alternância de mais do mesmo, de governos PS ou PSD que têm governado o país. Até aqui não era esta a trajectória do BE: erroneamente, e com a nossa total oposição, apoiou Manuel Alegre, o mesmo candidato do primeiro-ministro José Sócrates, à presidência da República nas últimas eleições. Quanto ao PCP, nem queria ouvir falar em alianças com o Bloco. Só por essa razão, pela divisão instalada na esquerda, José Sócrates, como bem advertimos na altura, pôde ganhar as eleições legislativas de 2009, ainda que sem maioria. No entanto, apesar de agora ser positivo que BE e PCP, finalmente, iniciem um percurso de unidade, tememos que nos seus objectivos não esteja a unidade que tanto todo o país à esquerda precisa. Tememos, não sem a razão da experiência do que se passou nos últimos anos, que estes partidos pretendam mais tirar dividendos eleitorais do imenso prestígio que resulta dos anseios de uma unidade ampla à esquerda do que a concretizar de facto. Por que dizemos isto? Porque, da reunião de 8 de Abril, não saiu uma proposta para avançar com a unidade, no sentido de concretizar, desde já, para as próximas eleições de 5 de Junho de 2011, um programa e um governo alternativo que trave a guerra social que um próximo governo de direita ou do PS, ou mesmo de PSD e PS juntos com o CDS, vai levar a cabo contra o país trabalhador.

6. Nesse sentido, o encontro entre BE e PCP foi uma grande decepção para todos os que julgam necessária a convergência dessas duas forças políticas numa plataforma que apresente uma proposta de governo de esquerda ao país. Nas declarações que deram à imprensa no final do encontro, Francisco Louçã e Jerónimo de Sousa não apontaram nenhuma iniciativa concreta no sentido da continuidade do entendimento entre os dois partidos, além de vagas reuniões a acontecerem nos próximos meses. Se ambos, como afirmaram, julgam necessário um governo de esquerda no país para derrotar as políticas de direita do PS, PSD e CDS, porque então não deram nenhum passo para isso? Em nossa opinião, e gostaríamos muito de estar errados, não há disposição de nenhuma das partes em quebrar a rotina dos acordos parlamentares e os interesses específicos de cada máquina partidária e ousar uma saída unitária, com base num programa de esquerda. E isso é uma verdadeira tragédia para o país e para a classe trabalhadora. Mantemos a nossa proposta de realização de um Congresso das Esquerdas, para aprovar um programa que retire o país da crise, combata o desemprego e a recessão e melhore a vida de quem trabalha. Esse programa deveria ser apresentado ao país já nas próximas eleições pelo BE e PCP. Só uma proposta de governo alternativo das esquerdas (BE, PCP, socialistas e outros independentes que não se revêem em planos de austeridade e cortes salariais), ancorada na luta popular contra PECs e FEEF/FMI, conseguiria dar uma esperança de mudança real à população e permitiria quebrar o eterno rotativismo PS/PSD. Só um Governo das Esquerdas contra os planos do FMI pode tirar o país da actual crise e da subsequente guerra de austeridade que pesa sobre a larga maioria da população que trabalha.

7. Para revogar o pedido de intervenção do FEEF/FMI e todos os efeitos perversos que provocará na vida dos trabalhadores portugueses; para revogar os PECs; para acabar com as Parcerias Público-Privadas (PPP), começando por renegociar uma por uma a favor do erário público; para exigir a suspensão do pagamento da dívida externa, seguida de auditoria da mesma; para impor ao sistema financeiro o pagamento de impostos; para acabar com o trabalho precário e os falsos recibos verdes; para reduzir as horas de trabalho para criar postos de trabalho e melhorar as condições de vida da população; para aumentar o salário mínimo e as pensões mais baixas; para nacionalizar os sectores essenciais da economia, como a Galp, e permitir, assim, a redução do preço dos combustíveis; para, enfim, levar à prática um programa de esquerda que retire o país da recessão e proporcione melhores condições de vida para todas as “gerações à rasca” é preciso um Governo das Esquerdas. Não é possível, com o FMI e o FEEF já instalados em Portugal, protelar mais esta decisão.

Fora FMI e Fundo Europeu de Portugal!
Pela suspensão do pagamento da dívida externa!
Por um Governo das Esquerdas!
CE do Ruptura/FER
8 de Abril de 2011

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