Manif da Geração à Rasca: o início de um novo 25 de Abril?

As manifestações da “Geração à Rasca” ocorridas em vários pontos do país reuniram, segundo a imprensa, entre 180 a 280 mil pessoas, em sua maioria jovens. Foi a maior manifestação popular desde o 25 de Abril, de cuja organização ficaram de fora partidos e sindicatos, o que determinou o seu carácter mais irreverente e democrático. Todos podiam manifestar-se sem qualquer restrição, ao contrário do que às vezes acontece.

 

A impressionante adesão a este protesto deve ser atribuída à imensa frustração de uma geração – ou melhor, e como se comprovou pela presença nas manifs, gerações – afastada de empregos dignos, salários decentes e oportunidades de realização pessoal. Dessa frustração compartilha não só a juventude licenciada, mas também a juventude dos bairros de periferia de Lisboa, Porto, Coimbra e Braga, filhos de famílias pobres cujos pais, ex-operários, viram-se despedidos por conta do fecho das fábricas; filhos de ex-agricultores, que abandonaram os campos com a quase-destruição da agricultura portuguesa; filhos ou netos de imigrantes, vítimas também, no caso dos negros, do racismo e da violência policial.

A adesão ao protesto deve-se, também, à enorme revolta contra o governo Sócrates, que tudo tem feito para piorar ainda mais a situação da maioria dos portugueses, em especial da juventude. Os PECs só têm aumentado o desemprego, a precariedade e destruído as conquistas ainda preservadas do 25 de Abril, como a saúde e a educação públicas e a Segurança Social, enquanto preservam os lucros da banca e dos grandes empresários. Por isso, os milhares de manifestantes gritaram palavras de ordem contra o governo – e, já agora, também contra o PSD, o aliado do governo na aprovação dos PECs – e carregaram faixas (como a que dizia “Esta é a nossa Moção de Censura”) e cartazes a exigir os seus direitos, entre os quais o direito a uma vida feliz.

Mas há também uma outra razão do sucesso da manifestação de 12 de Março, talvez a determinante para explicar a sua combatividade, alegria e irreverência – características presentes nas manifestações ocorridas na revolução que se seguiu ao 25 de Abril: ela foi uma manifestação profundamente democrática, no sentido de que não foi controlada, como dito anteriormente, por qualquer organização, fosse partido ou sindicato. Aí reside a sua força, mas daí pode vir também a sua fraqueza. Isso porque organização não significa, necessariamente, burocratização. Organizar significa planear a revolta de forma a potenciar a sua eficácia. Significa ter objectivos concretos e reivindicações claras contra o desemprego e a precariedade.

Reivindicações como fim do trabalho precário! Fim dos recibos verdes e passagem a efectivo de todos os trabalhadores! Fim dos estágios não remunerados! Taxem a banca, não cortem nas verbas do ensino! Suspensão do pagamento de uma dívida que afoga todo o país e não pára de aumentar o número de desempregados! Nacionalização da Galp para reduzir o preço dos combustíveis!

Se não houver organização, o protesto da “Geração à rasca” corre o risco de morrer na praia, o que representaria o desperdício de uma grande oportunidade de mudar a realidade. É preciso organizar os jovens precários nos call-centers, escolas e empresas onde trabalham; é preciso que o movimento crie coordenações regionais e nacional, amplas e democráticas, nas quais se planeiem novas acções e formas de ampliar ainda mais o movimento.

É preciso organizar esse protesto, de forma democrática, para que possa prosseguir com mais trabalhadores e jovens. As razões que levaram a juventude à rua atingem o conjunto da sociedade portuguesa. Isso significa que é possível ter mais pessoas, jovens e menos jovens, na rua; e significa também que é possível combinar várias formas de protesto: uma greve geral com manifestação popular como a deste 12 de Março.

Todos que participaram das manifs em Lisboa, Porto, Braga ou Faro, e em outras cidades do país, sentiram que alguma coisa começou a mudar. Em todas essas manifs havia alegria contagiante, vontade de não mais parar de marchar pela cidade a gritar palavras de ordem e a sugestão de que tudo isso lembrava o 25 de Abril e o actual levante dos povos árabes. No dia 12 de Março ganhámos a convicção de que é possível mudar de políticas para o país; que é possível mudar de governo; que é possível, aos jovens, trabalhadores e estudantes, agarrar o destino em suas mãos.

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