Uma revolução sacode o Magrebe e o mundo árabe, com o centro na Tunísia, onde o povo conseguiu uma primeira grande vitória ao derrubar, no dia 14 de Janeiro, o presidente Ben Ali, o ditador que há 23 anos se mantinha no poder. Durante mais de um mês, a população tunisina, em especial a juventude, vítima de um índice de desemprego de mais de 30%, mobilizou-se nas ruas de Tunes contra o aumento de preço dos alimentos, a corrupção e a falta de liberdade no país. As manifestações, a exigir também a renúncia do presidente – “Ben Ali para a rua” ou “Ben Ali assassino”, eram algumas das palavras de ordem gritadas pelos manifestantes -, foram reprimidas com extrema violência pelo exército e pela polícia, provocando mais de 70 mortes.
O desespero e a falta de perspectiva que tomavam conta do país ficaram evidentes quando um jovem imolou-se na cidade de Sidi Bouzidi, em meados de Dezembro passado, um trágico exemplo seguido por outros. Fora a gota de água. A partir daí, a juventude resolveu ir para às ruas e enfrentar a violência policial, no que foi acompanhada e apoiada pela maioria da população: não tinham nada a perder. O mesmo pensou o povo da vizinha Argélia, acossado por problemas idênticos – o desemprego crónico, o elevado preço dos alimentos e a falta de liberdade.
Às manifestações que rebentaram no país, o governo argelino respondeu com a tradicional força bruta, fazendo vários mortos e dezenas de feridos, mas ensaiou um recuo, baixando o preço de alguns produtos, a indiciar a sua preocupação com a revolta popular. Mas esta não diminuiu: em Argel e muitas outras cidades, os populares saqueiam edifícios do governo e agências bancárias e carros são queimados.
Burguesia e militares tentam ganhar tempo
Na Tunísia, o bando que controla o país está a tentar manobrar para manter-se no poder. Foi este o sentido do pronunciamento do primeiro-ministro Mohammed Ghanouchi, que tentou assumir a Presidência após o afastamento de Ben Ali (no que foi contrariado pelo Conselho Constitucional, que designou o presidente do Parlamento para esta função), prometendo eleições para dentro de 6 meses, ao mesmo tempo que mantinha o recolher obrigatório e o estado de emergência.
Por outro lado, o ministro dos Negócios Estrangeiros tunisino, Kamel Morjane, possivelmente com o aval do imperialismo francês (a França é o quarto maior investidor estrangeiro na Tunísia) e norte-americano (satisfeito com a cooperação do governo tunisino no combate ao “terrorismo”), que sempre apoiaram Ben Ali e só passaram a criticá-lo nas vésperas da sua queda, propõe a formação de um governo de unidade nacional.
Acontece que o primeiro-ministro Mohammed Ghanouchi, assim como todos os governantes e sectores beneficiados durante os 23 anos da ditadura de Ben Ali, não são neutros, pelo contrário, fizeram toda a sua carreira política à sombra do ditador e não querem renunciar ao poder e aos seus privilégios.
A tentativa da burguesia e dos militares agora, com o apoio do imperialismo, é ganhar tempo para derrotar a revolta popular e fazer com que tudo volte ao mesmo. Por um lado, apontando para longínquas eleições, ao mesmo tempo que, com a desculpa de impedir a acção dos saqueadores, reprime e impede novas mobilizações nas ruas.
Mas – e isso é o que mais teme a burguesia árabe e o imperialismo – a revolução tunisina pode ser o início de uma revolução ainda maior: a revolução do povo árabe, farto de governantes corruptos, ditatoriais e fantoches do imperialismo.