A greve geral iniciada à meia-noite de hoje, 24 de Novembro, está a parar o país (foto Paulete Matos /Bloco de Esquerda). O quadro inicial da greve, contabilizado por volta das 8 horas da manhã, demonstra uma grande adesão ao protesto, superior a 80% e a atingir os sectores-chave da economia. Desta forma, fica comprovada a grande revolta dos trabalhadores e da maioria da população portuguesa contra as medidas de austeridade adoptadas pelo governo do PS do primeiro-ministro José Sócrates e a sua vontade de lutar contra elas.
Desta forma, os trabalhadores mostram que não se deixaram enganar pela gigantesca máquina de propaganda montada pelo governo, pela burguesia e os seus meios de comunicação para fazê-los acreditar que os cortes salariais, o congelamento das pensões, a retirada do abono de família, o fim do apoio escolar, o aumento do IVA e do IRS, o aumento do preço dos transportes e medicamentos, a privatização de empresas públicas, o desinvestimento na saúde e na educação e outras medidas contra os trabalhadores e o povo pobre incluídas no Orçamento de Estado para 2011 são inevitáveis.
De acordo com informações das centrais sindicais, CGTP e UGT, o quadro está a ser o seguinte: trabalhadores portuários, pilotos de barra e controladores de tráfego marítimo paralisam todos os portos do país; no sector dos transportes de passageiros a adesão à greve é também muito grande (cerca de 85%), atingindo a CP (comboios), metro de Lisboa (100%) e Porto (90%), transportes fluviais (Soflusa e Transtejo com mais de 80%), Carris (transporte público de Lisboa), empresas privadas, etc.; a paralisação é de quase 100% em todos os aeroportos do país, com adesão do pessoal de terra, ar e controladores de tráfego aéreo; a recolha de lixo não se realizou em dezenas de municípios, em alguns com 100% de adesão; a Autoeuropa, o maior parque industrial português, está parada, com os seu 3.600 trabalhadores a aderir à greve; na saúde, a adesão também é grande, com destaque para os centros de saúde e hospitais, como os da Universidade de Coimbra, Garcia da Horta, em Almada, Santa Maria (92%), em Lisboa, entre outros, a assegurar apenas os serviços mínimos obrigatórios; nos CTT (Correios), os trabalhadores de Cabo Ruivo (carteiros) fizeram piquete para impedir a passagem dos camiões privados que tentavam furar a greve e foram reprimidos pelo corpo de intervenção da PSP, mas garantiram que não haverá distribuição de cartas em todo o território nacional; as escolas estão paradas, com a adesão de professores e funcionários.
Com o FMI à porta
Motivos para fazer a greve geral – a primeira desde Maio de 2007 e a segunda a ser convocada de forma conjunta pelas duas centrais sindicais, CGTP e UGT, é que não faltam. Só este ano, o povo português foi bombardeado com três planos de austeridade (os PECs, Programa de Estabilidade e Crescimento), entre os quais o último foi o Orçamento de Estado para 2011, similares aos aplicados na Grécia, Espanha, Grã-Bretanha e Irlanda, em que a conta da crise lhe foi apresentada.
Todas essas medidas só agravam o cenário recessivo e aumentam o desemprego, a precariedade e a pobreza no país. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), nunca houve tantos desempregados em Portugal: no terceiro trimestre deste ano, a taxa oficial de desemprego foi de 10,9%, o que significa 609.400 pessoas sem emprego. A taxa de desemprego entre os jovens subiu 23,4%, o que significa 99 mil trabalhadores com menos de 25 anos sem trabalho.
O governo justifica os seus PECs pela necessidade de baixar o défice público de 9,3% do PIB em 2009 para 7,3% este ano e 4,6% em 2011, conforme imposição da Comissão Europeia. Na verdade, o objectivo da burguesia portuguesa e europeia ao aplicar os seus planos de austeridade é descarregar a crise económica nas costas dos trabalhadores (salvando desta forma a grande burguesia e a banca) e retirar-lhes os direitos conquistados depois da Segunda Guerra Mundial. Destruir o chamado Estado Social e, desta forma, transformar a União Europeia numa economia mais competitiva do ponto de vista capitalista que possa disputar em melhores condições o mercado mundial.
Todos esses PECs, como está cada vez mais claro, não impedirão a vinda do FMI a Portugal ou o pedido de ajuda do governo português ao Fundo Europeu de Estabilidade. Os juros da dívida portuguesa continuaram a subir mesmo depois de aprovado o PEC 3 (Orçamento de Estado para 2011), superando a barreira dos 7% e colocando Portugal no caminho da Grécia e, mais recentemente Irlanda. Os governos desses dois países, para salvar a sua banca extremamente endividada e em risco de colapso (ou directamente em colapso, como é o caso da Irlanda), mas, e principalmente, para não comprometer os capitais alemães e franceses (no caso da Grécia) e ingleses (no caso da Irlanda) ali empatados, aceitaram recorrer a essas duas entidades.
Essas “ajudas” não são para os trabalhadores e o povo, pelo contrário, tanto no caso grego quanto no irlandês, servem para salvar a banca, especialmente a dos grandes países imperialistas europeus, nomeadamente a França, a Alemanha e a Grã-Bretanha. Em troca da salvação da banca, aprovam medidas ainda mais duras contra os trabalhadores e o povo, mentindo-lhes a dizer que estas medidas são inevitáveis, que sem elas o país entrará em bancarrota, pintando, enfim, um cenário catastrófico que na verdade já existe para milhões de família cada vez mais pobres, com trabalhadores desempregados ou a receber um salário miserável e forçadas a emigrar ou a depender da cada vez mais escassa ajuda do Estado .
Este é o prognóstico para Portugal, e também Espanha, caso os trabalhadores não mantenham a sua luta total contra o governo PS, e o seu aliado PSD. Representantes do grande capital, esses dois partidos, em comum acordo, querem arrasar o país para salvar os seus “chefes”, a banca portuguesa – cuja divida ao Banco Central Europeu corresponde a cerca de 30% do PIB, ou seja perto de 50 000 milhões de euros – o imperialismo europeu e o euro da bancarrota.
A greve geral é uma resposta a este projecto, numa luta que não deve parar hoje. A luta dos trabalhadores portugueses para que não sejam eles a pagar pela crise da banca e dos ricos é muito dura e não pode se limitar a um dia no calendário nem circunscrever-se a Portugal. O plano da burguesia é europeu, e é no âmbito da Europa que esta luta deve ter também a sua continuidade. Uma greve geral europeia deve começar a ser organizada, assim como implementado um plano de lutas que não dê trégua à burguesia e ao governo Sócrates. Deste plano de lutas deve constar uma nova greve geral, desta vez com manifestação de rua, o que dará ainda mais visibilidade e força à luta.