Vários artigos foram publicados na imprensa portuguesa esta semana sobre o apoio do Bloco de Esquerda à candidatura presidencial de Manuel Alegre, a partir da divulgação do texto “Presidenciais: estas escolhas não são escolha”, assinado por vários militantes de esquerda, em sua maioria do próprio BE. Reproduzimos, a seguir, cinco artigos, com os respectivos links.
“Esquerda combativa está órfã de candidatos a Belém”Por Hugo Beleza, com Catarina Pereira
Publicado em 24 de Agosto de 2010, no tvi24
Grupo de descontentes ligados ao BE critica opção do partido em apoiar Alegre e não vislumbra alternativas
O apoio da direcção do Bloco de Esquerda a Manuel Alegre nas presidenciais acentuou a discordância de algumas vozes dentro do partido. Tudo porque vêem nesta aliança uma porta aberta a novas aproximações entre o aparelho bloquista e um Governo que dizem «de direita». Na Internet, circula já um documento assinado por vários elementos ligados ao BE, onde o descontentamento é evidente logo no título do texto: «Presidenciais: Estas escolhas não são escolha».
O descontentamento de alguns sectores do BE não é novo. Já há um ano, na VI Convenção, tinha ficado evidente, quando se antevia a possibilidade do apoio do PS a um Alegre mais próximo dos socialistas do que o Alegre de há quatro anos – que se antagonizou com a direcção de Sócrates, ao correr a Belém contra Mário Soares.
Gil Garcia, membro da mesa nacional do BE e subscritor da moção C da convenção de Fevereiro de 2009, explicou esta terça-feira ao tvi24.pt que o manifesto surge de «um sector dentro do BE descontente com decisão do Bloco apoiar Alegre».
Para o ex-dirigente da Frente da Esquerda Revolucionária, o histórico socialista surge como «um candidato do Governo do PS». «É diferente do candidato de há quatro anos, quando era um candidato em ruptura com o Governo de Sócrates».
Gil Garcia diz que essa aproximação de Alegre ao PS ficou evidente na campanha do ano passado, em Coimbra, quando o ex-deputado se juntou a José Sócrates no comício realizado no pavilhão da Académica. Desde essa altura, argumenta, «Alegre tem vindo a colar-se cada vez mais ao Governo».
No manifesto – assinado também por pessoas não ligadas ao partido, entre elas António Louçã, irmão de Francisco Louçã -, as críticas à direcção bloquista são claras. «O BE enfraqueceu a sua posição de combate ao Governo de Sócrates quando se precipitou a apoiar um candidato que agora se desdobra em louvores a esse mesmo Governo», lê-se.
Para os descontentes, a primeira opção para as presidenciais seria o BE apresentar-se com um candidato próprio. A alternativa seria «discutir uma candidatura com o PCP». Mas esta opção é inviável, devido às divergências entre os dois partidos.
“Contra natura”
Descrevendo a candidatura de Fernando Nobre como mergulhada na incerteza de se tratar de uma iniciativa própria do médico ou «empurrada por um Soares ressabiado pelo que lhe fez Alegre há quatro anos», Garcia não vê solução à esquerda para Belém, até porque sobre a do PCP interroga-se sobre se «irá a votos ou não».
A emergência de um candidato que congregasse quem não pretende ver no poder «este PS» materializar-se-ia, por exemplo, com José Mário Branco ou Carvalho da Silva. «Mas estas candidaturas não surgiram», acentuou.
Apesar do descontentamento, o bloquista diz que o objectivo não é a ruptura. Nesta altura, as vozes que se levantam olham já para além das presidenciais, não acreditando que haja um recuo no apoio a Alegre, que surge, agora, como uma espécie de pivô de ligação entre o PS e um BE magnetizado pela esfera do poder. Pelo menos, é este o receio dos descontentes.
«Não queremos que esta aproximação do PS dê lugar a novas aproximações ao PS», alerta Gil Garcia, que vê no desenho de alianças das próximas presidenciais uma «antecâmara da aproximação do BE ao poder». Esse é um cenário que descreve como longe da ideia fundacional do partido. «O BE foi construído como alternativa aos diversos Governos socialistas desde o tempo de Guterres. Isto é contra natura à ideia original».
Sem quem lidere «uma candidatura da esquerda de resistência em relação ao Governo», para Gil Garcia uma coisa é clara nestas presidenciais: «A esquerda combativa, que não se revê nas medidas de austeridade, não tem candidatos nestas eleições presidenciais, está órfã de candidatos»
http://www.tvi24.iol.pt/politica/be-presidenciais-alegre-tvi24-gil-garcia/1186866-4072.html
O Bloco na clandestinidade
Por Ana Sá Lopes
Publicado em 25 de Agosto de 2010, no i
O PCP tem, finalmente, o seu candidato presidencial. Francisco Lopes, um quadro todo-poderoso do partido, desconhecido até agora da maioria dos portugueses, tem uma tarefa partidária mais fácil do que parecia: o Bloco de Esquerda – arqui-inimigo e concorrente no mesmo espaço político – vai passar à clandestinidade política. Durante uma campanha presidencial inteirinha, Francisco Louçã e restantes dirigentes vão engolir em seco, e provavelmente em respeitoso silêncio, à medida que Manuel Alegre for desfiando as qualidades de José Sócrates, as magnificências dos discursos de Sócrates, do Estado social de Sócrates e a genuína via de esquerda de Sócrates. É natural que Alegre o faça: afinal, ainda é Sócrates, por muito estranho que pareça, o maior activo eleitoral do PS. E se Alegre tem a garantia de um significativo contra-vapor de algum PS, é óbvio que para ter o melhor resultado possível nas eleições não pode em nenhum momento hostilizar o chefe do partido. É aí que o papel do Bloco não poderá ir além dos tais “procedimentos ambíguos” de que falava Jerónimo de Sousa: assobiar para o ar enquanto Alegre presta homenagens a Sócrates, fazer uma campanha paralela contra o governo em clara contradição com Alegre ou passar à clandestinidade política entre Dezembro e Janeiro. O que parecia uma boa ideia – apoiar o candidato da “nova esquerda” saída da “cidadania” (um nicho de mercado que Alegre explorou brilhantemente em 2006, para inveja do próprio Bloco) transformou-se num monstro. Agora, o Bloco apoia o candidato do PS e do governo e nem tem uma esperança de vitória para repartir.
http://www.ionline.pt/conteudo/75242-o-bloco-na-clandestinidade
Bloquistas que contestam apoio a Alegre preparam lista alternativa a Louçã
Por Maria José Oliveira
Publicado em 26 de Agosto de 2010, no Público
Francisco Louçã andou meses a apelar a uma “convergência à esquerda” – começou na VI Convenção do Bloco de Esquerda (BE), em Fevereiro do ano passado, insistiu no período eleitoral, e só terminou quando os bloquistas anunciaram o apoio formal à candidatura presidencial de Manuel Alegre (antecipando-se ao PS) -, mas não conseguiu travar as divergências dentro do partido. Mantendo a posição defendida na convenção, os membros do movimento Ruptura/FER (ala interna do BE) não desistem de contestar a decisão de apoiar Alegre e estão já a tentar mobilizar os militantes descontentes com esta escolha para apresentar uma moção e uma lista alternativa na próxima reunião magna dos bloquistas, prevista para o primeiro trimestre de 2011.
Depois de gorada a iniciativa de realizar uma convenção extraordinária para debater o apoio ao socialista, o Ruptura/FER avançou com um manifesto que sublinha uma das eventuais consequências da candidatura conjunta: “O BE enfraqueceu a sua posição de combate ao Governo.” Entre os subscritores do documento encontram-se quatro membros da mesa nacional (Gil Garcia, Isabel Faria, João Delgado e João Pascoal), militantes e simpatizantes.
Notando que Alegre não representa qualquer alternativa às políticas da “coabitação cúmplice Sócrates/Cavaco”, os signatários desvalorizam ainda os conflitos do candidato com o Governo e com a bancada parlamentar do PS. “Ele ausentou-se do hemiciclo em votações que não lhe convinham ou manifestou oposição, nomeadamente ao Código do Trabalho, quando o seu voto não fazia falta para garantir a maioria”, lê-se. E mais adiante antecipam a campanha de Alegre, dizendo que ela representa a “demagogia nacionalista, a nostalgia colonial, a exaltação da disciplina militar, a subserviência aos governos – tudo envolvido em pose marialva e declamado num tom solene e pomposo”. Fernando Nobre é designado no manifesto como um “imitador” de Alegre, disputando com o socialista “a palma em matéria de grandiloquência chauvinista”.
“Experiência histórica”
Quanto à candidatura do PCP, os autores encaram-na com “prudência”, atendendo à “experiência histórica” das desistências a favor dos candidatos socialistas (1980 e 1996). No entanto, alguns bloquistas ligados ao Ruptura/FER estão também divididos quanto à escolha dos comunistas, Francisco Lopes: há quem admita votar no dirigente do PCP; e há quem o veja como um “candidato do aparelho”, como Gil Garcia. Ao PÚBLICO, este bloquista reiterou que a escolha preferencial do Ruptura/FER era Francisco Louçã.
“A candidatura de Louçã fazia mais sentido agora do que fez há quatro anos”, disse. Mas existia já um plano alternativo – apoiar Carvalho da Silva, líder da CGTP, numa candidatura conjunta com os comunistas. Frustradas as duas hipótese e perante os candidatos da esquerda, o colectivo pondera não apoiar qualquer candidatura.
Alegre é pedra no sapato do Bloco de Esquerda
por Liliana Valente
Publicado em 27 de Agosto de 2010, no i
Direcção acredita que BE não sai prejudicado no debate por PCP ter candidato próprio. Oposição interna discorda
A dúvida voltou a pairar sobre o Bloco de Esquerda: como aparecer no debate das eleições presidenciais? Depois da apresentação de um candidato próprio do PCP, Louçã conheceu esta semana críticas internas de oposição contra a escolha para candidato presidencial.
O Movimento Ruptura/FER, de militantes do BE, apresentou uma declaração – assinada por cerca de 300 pessoas – que recusa o apoio a Manuel Alegre nas presidenciais: “Ao criticar Cavaco pelo carácter supostamente conflitual das suas intervenções, Alegre sinaliza também que pretende exercer uma presidência ainda mais alinhada com o governo.”
Os holofotes durante a campanha podem andar longe dos bloquistas, mas apesar das críticas internas, a posição de Francisco Louçã mantém-se. Quando questionado pelo i sobre se o BE não estaria limitado na campanha, o líder bloquista admitiu apenas que “o Bloco mantém a posição que assumiu”. Ou seja, a de apoiar Manuel Alegre, uma candidatura suprapartidária.
A defesa da candidatura do histórico socialista é ainda protagonizada pelo deputado José Gusmão: “Não nos preocupa que o BE não tenha um candidato de afirmação partidária”. O facto de Alegre ser apoiado pelo PS não será um problema, refere. “O descolar do PS foi feito pelo próprio Alegre que criticou aspectos fundamentais da governação de Sócrates”, sintetiza.
A posição assumida pelo partido é a de apoiar “o único candidato com hipóteses de derrotar Cavaco Silva”, explica ao i Jorge Costa, dirigente do Bloco designado para fazer parte da estrutura de campanha de Alegre. “O Manuel Alegre é um candidato suprapartidário. Não é o somatório dos partidos. A oposição do Bloco ao governo não levanta dúvidas a ninguém”, explica.
Divergências
A oposição interna – liderada por Gil Garcia, membro da Mesa do BE – discorda e acredita que o “BE enfraqueceu a sua posição de combate ao governo de José Sócrates” ao precipitar-se a “apoiar um candidato que agora se desdobra em louvores a esse mesmo governo”. A posição destes militantes já tinha sido apresentada em Fevereiro na convenção do partido. “Não apoiaremos Manuel Alegre se também for o candidato do governo Sócrates, ou seja, se passar a ser o Mário Soares do governo Sócrates. Até porque toda a gente sabe que ele tanto dá uma no cravo como uma na ferradura”, sublinhou Gil Garcia, o primeiro subscritor da Moção C – anti-Louçã – actualmente membro da mesa do partido. Apesar de estar a ser preparada uma alternativa à direcção de Louçã, até agora não foi possível reunir o número de assinaturas necessárias para obrigar a uma convenção extraordinária.
PCP não influencia
Rui Tavares, eurodeputado eleito pelas listas do Bloco, acredita que as presidenciais vão ser cruciais para o debate político: “É nas presidenciais que se vai poder discutir o que foi e o que não foi feito. A oposição entre Cavaco e Alegre é muito mais clara do que entre Sócrates e Passos Coelho.” E onde fica o Bloco de Esquerda nesse debate? “O PCP é que está a ler mal as presidenciais, não o Bloco. O PCP acha que são eleições partidarizadas, mas são apenas os militantes do PC que votam neles. A sociedade em geral não.”
O eurodeputado apela a Alegre para ter “um discurso claro contra o conformismo, diferente do discurso dominante”. E acrescenta: “Se o BE e o PS não gostarem desse discurso, é indiferente.” A estrutura de campanha de Alegre vai reunir-se já em Setembro para definir o plano de campanha, antes mesmo da apresentação da decisão de Cavaco Silva. Para já, o Bloco centra-se na reabertura do ano político, em Braga, com debates sobre a crise, o desemprego, o serviço nacional de saúde, o ambiente, a cultura e a educação.
http://www.ionline.pt/conteudo/75564-alegre-e-pedra-no-sapato-do-bloco-esquerda
Alegre une críticos de Louçã no BE
por Hugo Filipe Coelho
Publicado em 27 de Agosto de 2010, no Diário de Notícias
Contestatários aliam-se e ameaçam com lista alternativana Convenção Nacional do BE no início de 2011
O empenho de Francisco Louçã em unir a esquerda nas presidenciais está a tero efeito perverso de dividir o Bloco. Críticos internos, que contestam o apoiodo partido a Manuel Alegre, prometem agora aliar-se numa lista alternativa aapresentar na Convenção Nacional, no início de 2011.
A tensão interna estava em crescendo desde que, em Janeiro, a Mesa Nacionalaprovou, com dois votos contra, o apoio ao histórico socialista na corrida aBelém. O movimento Ruptura/FER, uma tendência interna, patrocinou umabaixo-assinado a pedir uma convenção extraordinária para reconsiderar aestratégia. Só que a petição não passou na Comissão Política. E o verniz doBloco estalou.
“Dado que a direcção decidiu rejeitar o nosso apelo, não nos restaalternativa se não apresentar uma lista na convenção extraordinária”,disse ao DN, Gil Garcia, membro da mesa nacional e um dos rostos daRuptura/FER.
Na curta história do Bloco de Esquerda o surgimento de listas em ruptura coma direcção não é inédito. Mas Gil Garcia promete que a base de contestação serámais alargada do que nunca.
Além da Ruptura/FER, o bloquista garante que essa frente de oposição internavai juntar membros da UDP e do PSR, dois grupos que têm sido “fiéis”a Louçã.
O manifesto dos críticos, divulgado há dias, é assinado por 15 militantes,quatro dos quais são membros da Mesa Nacional (além de Gil Garcia, IsabelFaria, João Delgado e João Pascoal). António Louçã, irmão do líder Francisco, éoutro dos signatários.
O DN não conseguiu obter uma reacção do líder do BE. Há meses, FranciscoLouçã considerou “normal” que existam opiniões diferentes no partido,mas defendeu a independência de Alegre e as suas lutas em comum com o BE.
Gil Garcia acredita que se tivesse ido a votos no partido, o apoio ao poetanão iria além dos 60%. E atira: “Alegre não é o mesmo de há quatro anos.Está submisso ao PS. Eles não quiseram correr o risco de ter uma largapercentagem de contestação.”
Embora as presidenciais tenham sido o pretexto da oposição, o ponto comum detodas as críticas é a “aproximação ao PS”. “O apoio a Alegre étáctico. Vem no seguimento de outros acordos com o PS”, denuncia Garcia,que lembra a coligação com António Costa para a autarquia de Lisboa.
“O que nós propomos é o regresso à ideia original do Bloco: umaesquerda de poder que não subscreve pactos de austeridade. Queremos impedir queo Bloco ande de braço dado com o PS.”
http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1649243