Nas ruas, no dia 15, iniciar a resposta ao novo roubo dos salários

O governo Passos Coelho fez aquilo que a troika e a burguesia portuguesa mandaram: manter os cortes salariais no setor público e cortar nos privados. A burguesia, pelo contrário, foi presenteada com uma redução de 5% na Taxa Social Única. Essas medidas confirmam que Portugal está a seguir o caminho da Grécia: redução nos salários e benefícios sociais acompanhada de um brutal aumento de impostos, numa espiral que faz crescer o desemprego e a pobreza, mas também o défice e a dívida. É preciso que, como na Grécia e na Espanha, os trabalhadores deem uma resposta à altura.

As novas medidas

Nas últimas semanas tornou-se evidente aquilo que já todos sabíamos. As chamadas medidas de austeridade adotadas pelo governo no ano passado, com os cortes dos subsídios de férias e de Natal dos funcionários públicos, a redução dos investimentos em saúde, educação e solidariedade social, os aumentos dos impostos (IVA e IRS), das tarifas públicas e dos transportes, agravaram violentamente a crise económica e social, com milhares de empresas a fechar as portas e o desemprego real a atingir 1,3 milhões de portugueses. Só entre os professores, 40 mil ficaram de fora das salas de aula este ano, com o ministro Crato a esfregar as mãos de contentamento. O resultado foi a redução drástica do consumo, e a consequente queda na arrecadação fiscal e do IVA a jogar por terra a meta de redução do défice orçamental acertada entre o governo e a troika. Em vez dos 4,5% para este ano, só no primeiro semestre o défice já estava em 6,9%.

Diante desse fracasso, e com a troika em sua visita periódica ao país para fiscalizar o cumprimento do memorando, Passos Coelho fez aquilo que sabe e gosta: anunciou um aumento de 60% no desconto dos trabalhadores para a Segurança Social (de 11% passa para 18%, o que significa que quem ganha 1000 euros e contribui com 110, passará a contribuir com 180) e a manutenção do corte de um dos subsídios dos funcionários públicos e dos dois subsídios dos reformados e pensionistas. Feitas as contas, isso significa que os funcionários públicos continuarão com menos dois salários anuais (isso na melhor das hipóteses, porque o aumento na contribuição à Segurança Social poderá representar, por si só, a perda de até dois salários no ano); os trabalhadores do setor privado ficarão com menos um (também na melhor das hipóteses, por razões idênticas); e os reformados e pensionistas continuarão sem os dois subsídios, o de férias e o de Natal. Isso quer dizer que, a depender do governo, serão os trabalhadores a continuar a pagar a crise e as consequências do seu agravamento por conta das políticas até agora implementadas.

Com o cinismo habitual, Passos Coelho falou também em equidade e afirmou que o capital será tributado, mas sem mencionar qualquer corte nas rendas das PPPs (Parcerias Público-Privadas) ou nos benefícios fiscais das grandes empresas. Pelo contrário, anunciou, de acordo com a feliz expressão do jornalista da SIC José Gomes Ferreira, um jackpot para as empresas, com a redução da TSU de 23,75% para 18%. Os jornalistas económicos – que não pecam por esquerdistas – reconhecem que essa medida, ao contrário do que disse Passos Coelho, não terá o efeito de criar emprego. Segundo eles, o dinheiro poupado no pagamento da Segurança Social dos empregados será encaixado pelas grandes empresas e bancos, como estão a sê-lo as gigantescas deduções fiscais que continuam a beneficiá-los; no caso das pequenas empresas, esses recursos são insuficientes para estimular a contratação, já que a procura interna continua a diminuir devido à recessão e o acesso ao financiamento bancário permanece bloqueado.

Em palavras do mesmo jornalista da SIC, trata-se de mais uma – e gigantesca – transferência de capital das famílias portuguesas para as empresas. Já teria havido um acordo entre a troika e o governo no sentido de ser aceite um aumento do défice este ano de 4,5 para 5,3%, mas mantendo a meta dos 3% para 2013. As novas medidas apresentadas, e que entrarão no orçamento do próximo ano, foram criadas para que esta meta seja alcançada. Mas, como tudo indica, os seus efeitos serão os mesmos até agora apresentados: mais recessão, mais desemprego e mais pobreza. Enquanto os grandes patrões e a banca mantêm os seus lucros e retiram direitos históricos da classe trabalhadora.

Reação às medidas

O CDS-PP, já “amansado” por um acordo prévio com o seu parceiro de coligação, reagiu às medidas anunciadas por Passos Coelho a querer tapar o sol com a peneira. “Não há aumento de impostos”, afirmou, candidamente, Nuno Magalhães, líder da bancada parlamentar do CDS. O problema é que o CDS andou a divulgar, inclusive através do seu líder, Paulo Portas, que não queria mais impostos. Fazia isso para não ficar mal diante dos eleitores e, principalmente, para pressionar o PSD a voltar atrás no seu projeto de revisão da lei autárquica. Ao prever executivos camarários homogéneos, esta lei deixaria sem pelouros – e sem tachos – os vereadores do CDS. Resolvida a desavença, com o recuo do PSD em apresentar o projeto, tudo voltou às boas, e o CDS, para não reconhecer que tinha mentido e  branquear as medidas do governo, diz que não houve um novo imposto e, sim, um “esforço de equidade”.

Do lado do PS, não há até agora uma declaração do seu secretário-geral, mas sim do presidente do grupo parlamentar, Carlos Zorrinho: “A espiral recessiva alimenta uma pretensa necessidade de novas medidas que, por sua vez, só alimentam o problema. É tempo de dizer basta”. Se esse “basta” fará o PS votar contra o Orçamento de 2013, onde constarão as novas medidas anunciadas, logo saberemos, mas o certo é que António José Seguro, caso não o faça, ficará bastante mal na fotografia. Em constantes declarações à imprensa, tem dito que “o PS não está para mais austeridade”. Críticas também foram as palavras do presidente da UGT, João Proença, mas ainda não sabemos se suficientes para fazê-lo romper com o Acordo de Concertação Social assinado no início do ano com governo e patrões e promover, junto com a CGTP, entidades representativas dos trabalhadores e da juventude e partidos de esquerda, um calendário de luta contra o governo e as suas medidas.

As reações às novas medidas de austeridade por parte da burguesia indicaram que a sua aprovação está longe de ser unánime. A grande burguesia manifestou o seu agrado através de um comunicado da CIP (Confederação Empresarial de Portugal): “Trata-se de uma medida que há muito temos defendido”. Mas os setores ligados ao comércio e serviços rejeitaram-nas, conforme explicou à imprensa João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal: “Estas medidas vão levar a uma nova contração da procura com consequências na continuação do encerramento de empresas e de crescimento do desemprego, em particular no comércio e serviços. O eventual aumento da competitividade externa, que está por provar, dado o peso dos custos do trabalho nas exportações ser em média de apenas 15 por cento do total, não vai de forma nenhuma compensar a quebra global do mercado interno. O problema central do financiamento à economia, nomeadamente do investimento, não foi considerado, pelo que não se entende como poderá ser relançada a economia e criar condições para baixar o desemprego”.

O que fazer?

Arménio Carlos, secretário-geral da CGTP, declarou que “estamos perante mais uma gravíssima declaração de guerra contra os trabalhadores, desempregados e pensionistas. [Estas medidas] vão levar a um corte de mais de 4000 milhões de euros nos rendimentos dos trabalhadores da administração pública e do sector privado. Esta é a equidade do governo: rouba aos portugueses mais pobres para dar aos portugueses mais ricos”. A mesma interpretação tiveram os partidos da esquerda parlamentar, PCP e Bloco de Esquerda. Diante dessa “declaração de guerra”, qual deve ser a resposta dos trabalhadores e dos seus representantes?

Para ganhar essa guerra, é preciso uma resposta urgente e forte. Construí-la de forma unitária é o grande desafio da esquerda e dos representantes sindicais da classe trabalhadora e da juventude. Não basta denunciar as medidas ou falar da necessidade da unidade no abstrato; não basta chamar a unidade, e acabar por esvaziá-la de um conteúdo de rutura com o governo e a troika; não basta chamar a unidade para não aprovar um programa de reivindicações e um calendário  de luta.

Uma boa demonstração de que somos pela unidade para lutar é estarmos todos presentes na manifestação convocada para 15 de setembro, às 17 horas, na Praça José Fontana, em Lisboa, contra a troika e a austeridade. Neste mesmo dia, os trabalhadores do Estado espanhol farão uma grande mobilização em Madrid contra as medidas de austeridade decretadas pelo primeiro-ministro Mariano Rajoy.

Cristina Portella

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