Francisco Louçã anunciou na sua página do Facebook que é urgente uma “renovação da representação pública do Bloco” e, como tal, “no termo do meu mandato como porta-voz do Bloco, não me recandidatarei a essa função”.
Que era urgente uma renovação pública da liderança do Bloco de Esquerda era algo que toda a militância do partido já tinha concluído em Junho de 2011, quando este, sob a liderança de Louçã, perdeu mais de 200.000 votos e metade do seu grupo parlamentar.
No entanto, quando vários sectores do Bloco, entre os quais o então Ruptura/FER, atual Movimento Alternativa Socialista (MAS), propuseram uma convenção extraordinária para repensar a liderança e, principalmente, a política do partido, Francisco Louçã e toda a direção recusaram-se a fazer esse debate, empurraram a sua ala esquerda para fora e adiaram para mais de um ano depois a realização de uma nova convenção.
Se relembramos esses factos é porque já indiciavam que a Comissão Política do BE não queria e não quer efetivamente a sua renovação. Renovar significa rejuvenescer e/ou mudar alguma coisa essencial. Mas a proposta ventilada de substituição de Louçã pela dupla João Semedo e Catarina Martins não representa nem uma coisa nem outra.
Sair Louçã da representação pública do BE para entrar Semedo, um dirigente ainda mais velho que o coordenador cessante e defensor das mesmas políticas até agora aplicadas pelo partido, inclusive aquela que tão maus resultados provocou – o apoio a Manuel Alegre nas eleições presidenciais do ano passado -, é evidentemente um simulacro de “renovação”. Adicionar a esta fórmula o nome de Catarina Martins, mulher e jovem, é apenas um artifício que só demonstra a incapacidade do BE de construir lideranças jovens capazes, por si só, de representar o partido sem o recurso a fórmulas bicéfalas.
É legítimo concluir que o BE, se optar por esta solução, com ou sem Catarina Martins, não tem capacidade de renovação nenhuma e tal facto tem explicação.
Os aparelhos que controlam toda a vida do BE e que se encarregaram de afastar as vozes mais críticas, mais jovens e de esquerda do seu interior são agora incapazes de encontrar lideranças alternativas e de qualidade para substituir Louçã. A ausência de renovação geracional confirma que o conservadorismo na política e nas orientações vai predominar nesta nova fase que se vai abrir para o Bloco.
Quando propúnhamos, nas últimas convenções do BE, em 2009 e 2011, que o partido deveria sair da órbita do PS e do apoio ao candidato presidencial de Sócrates, Manuel Alegre, e propor, de forma aberta e atempadamente, uma aliança ao PCP e a independentes, fomos sistematicamente ridicularizados e acusados de querer transformar o BE num apêndice do PCP.
Hoje, o BE e Louçã falam em “coligação de esquerda” para derrotar a troika e o governo da direita, numa aparente alteração da sua política e aproximação da defendida pelo MAS. Mas quem propõem para conduzir esta política à frente do partido? João Semedo, justamente um dos integrantes da ala mais favorável a alianças do BE com o PS e um dos defensores do apoio a Alegre.
A todos os bloquistas, que conhecem bem os debates internos no BE e a nossa prática política, é hora, sim, de repensar o BE e de renovar o mapa político da esquerda no país. Somente uma nova força política à esquerda que defenda sinceramente uma unidade de esquerda sem o PS – o partido subscritor do memorando de entendimento com a troika e co-responsável, junto com o governo da direita, pelas políticas de austeridade que castigam o povo português – pode alterar o caminho que o país perfilha há mais de 30 anos, quer com governos do PS, quer com governos da direita coligada.
Para pressionar o BE e o PCP a inverterem as suas políticas divisionistas é forçoso erguer uma nova geração de dirigentes políticos e uma nova força política. Louçã, Semedo e o atual BE poderão e deverão fazer parte dessa futura unidade, mas com esses dirigentes o BE não será capaz de construir um novo caminho independente do PS e oferecer uma alternativa de governo de esquerda que rompa com a troika e as políticas que estão a destruir o país.
Gil Garcia